Começou a circular esta quinta-feira um ficheiro, através das redes sociais, com um alegado plano de desconfinamento que teria início já no mês de março, com medidas que se prolongariam até maio — mas esse documento é falso.

O autor do documento diz ao Observador que o ficheiro foi partilhado apenas com um grupo fechado de amigos e que objetivo era ser discutido antes de ser enviado como contributo aos grupos parlamentares, ao Presidente da República e ao primeiro-ministro.

Muito se tem falado nos últimos dias sobre o atraso do Governo em divulgar o plano do próximo desconfinamento — depois de as restrições se terem traduzido numa redução significativa do número de casos e óbitos, mas ainda com elevada pressão nas unidades de cuidados intensivos. Os partidos, ouvidos em Belém esta semana, admitem que Marcelo Rebelo de Sousa está desconfortável com a falta de planeamento. Seria de estranhar, portanto, que uma fuga de informação tivesse permitido colocar a circular um plano de desconfinamento.

Fonte do gabinete do primeiro-ministro garante ao Observador que o ficheiro que está a circular, o alegado plano, é “totalmente falso”. O gabinete de António Costa já fez seguir um comunicado às redações onde fala de “uma adulteração abusiva da tabela de desconfinamento divulgada em abril do ano passado” e acrescenta que a “falsificação será objeto de comunicação ao Ministério Público”.

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“Este documento não tem qualquer veracidade, não é da autoria do Governo, nem se baseia em qualquer trabalho preparatório, pelo que às informações constantes do mesmo não deve ser atribuída qualquer credibilidade. Pela desinformação e falsas expectativas que tal documento pode gerar, com o inerente risco para a saúde pública, esta falsificação será objeto de comunicação ao Ministério Público“, afirma o gabinete do primeiro-ministro na nota enviada.

Mais, o gabinete do primeiro-ministro volta a frisar que “este não é ainda o momento do desconfinamento”. “O Governo considera que é inoportuno proceder nesta fase a qualquer apresentação ou discussão pública sobre o tema”, escreve ainda acrescentando que o Executivo está a “preparar os futuros passos de desconfinamento, que serão dados em devido tempo, em articulação com a estratégia de testagem e o plano de vacinação”.

Através dos detalhes do documento o Observador verificou que o criador do ficheiro foi Carlos Macedo e Cunha. Contactado pelo Observador, Carlos Macedo e Cunha admitiu a autoria do documento, que afirma ter sido partilhado num “grupo fechado de amigos”.

“Alguém se aproveitou indevidamente do facto de termos pegado naquele template”, diz ao Observador Carlos Macedo e Cunha. Questionado sobre o porquê de o ficheiro ser coincidente com o plano de desconfinamento apresentado em abril de 2020, o autor justifica que fez “download de vários planos” da Austrália, Nova Zelândia e usou o plano de desconfinamento do ano passado “enquanto versão pré-draft”. O objetivo era, afirma, fazer uma discussão mais alargada e enviar posteriormente os contributos para os “grupos parlamentares, Presidente da República e primeiro-ministro”.

Do grupo de whatsapp de onde, segundo o autor, acabou por sair o ficheiro fariam parte alguns membros do ThinkTank informal “INFO | Covid-19”, do qual Carlos Macedo e Cunha também faz parte e seria esse ThinkTank a fazer chegar ao Governo um “contributo”, de acordo com o autor do ficheiro.

“Usei o template [do plano de desconfinamento publicado a 30 de abril de 2020 pelo Governo] para começar o trabalho entre nós. Mandei num grupo fechado a um conjunto de amigos”, justifica. Questionado sobre a utilização dos logótipos oficiais do Governo num documento de trabalho (e que motivou a queixa do Executivo ao Ministério Público), Carlos Macedo e Cunha diz que só no ficheiro que acabou partilhado nas redes sociais constava a imagem do governo e que o documento final que seria enviado à Assembleia da República nada teria que ver com o que foi difundido.

Carlos Macedo e Cunha tem, ao longo dos últimos anos, publicado esporadicamente  artigos de opinião em jornais como o Observador e o Público.

Através de uma análise mais atenta à imagem usada para fazer circular a falsa informação, em comparação com o plano de desconfinamento apresentado em 2020 (no final do primeiro lock down), é possível perceber as semelhanças, mas também as diferenças. Desde logo, no tipo de letra utilizado no cabeçalho, ainda que o logótipo da República Portuguesa seja coincidente com o oficial.

Falso plano de desconfinamento que está a circular nas redes sociais

Depois, todo o rodapé surge desformatado, incluindo a imagem “Não paramos Estamos ON”, criada para centralizar as informações relativas à resposta do Executivo à pandemia da Covid-19 no país.

Isso mesmo é possível constatar ao consultar a imagem oficial do plano de desconfinamento apresentado pelo Governo em 2020:

Plano de desconfinamento apresentado pelo Governo em abril de 2020

Há, é verdade, algumas semelhanças entre os dois documentos. Sobretudo, no que diz respeito à calendarização das várias fases do desconfinamento. À imagem do que aconteceu há um ano, o documento falso que agora foi posto a circular apresenta medidas semana a semana, divididas pelos vários setores de atividade comercial, educação, serviços públicos, espetáculos culturais, etc. Mas, como garante fonte do Governo, não corresponde a qualquer documento oficial que esteja a ser preparado.

Conclusão

Não é verdadeira a imagem que está a circular nas redes sociais com um suposto plano para desconfinamento que começaria já a 15 de março. Fonte do gabinete do primeiro-ministro diz ao Observador que a versão difundida nas últimas horas é “totalmente falsa” e a comparação do ficheiro que agora circula com o plano apresentado por António Costa em abril de 2020 permitem ainda encontrar diferenças ao nível da imagem gráfica.

Assim, segundo a classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

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