Circula no Facebook uma publicação que atribui ao presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), António Saraiva, a proposta de “importar milhões de africanos e mestiços brasileiros” para Portugal, com o objetivo de “manter os salários portugueses baixos e competitivos“.

A publicação consiste na imagem de uma suposta notícia do Diário de Notícias com o título “António Saraiva: ‘As pessoas precisam de saber dos benefícios económicos de se tornarem numa minoria na sua própria terra’“, a que se segue a seguinte entrada: “Presidente da Confederação Empresarial de Portugal volta a sublinhar a importância de ‘importar milhões de africanos e mestiços brasileiros, de forma a manter os salários baixos e competitivos’ para que o patronato possa aumentar o lucro.”

A suposta notícia é ainda completada com uma fotografia do presidente da CIP, no campo da assinatura, inclui apenas a data de 15 de janeiro de 2021.

Na publicação consultada pelo Observador (e que no momento da consulta já levava 37 partilhas), a imagem da notícia é acompanhada da legenda: “Um dia este tipo de empresários serão julgados por roubo e traição. Ajude a eleger deputados nacionalistas para começarmos a limpeza.

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Porém, toda a publicação é falsa e a suposta captura de ecrã do Diário de Notícias foi adulterada. O Observador contactou o próprio António Saraiva, que desmentiu o conteúdo da imagem e disse tratar-se de uma montagem. Além disso, o Observador analisou a imagem em questão, identificando vários elementos que comprovam que se trata de uma adulteração.

“A frase que me é atribuída nesta página da internet é totalmente falsa como também é falsa a pretensa publicação editorial referida. É tudo uma reles montagem“, disse António Saraiva, numa nota enviada ao Observador em resposta a um pedido de comentário sobre a publicação.

“Esta vergonhosa mentira pretende ofender Portugal e os portugueses, pretende ofender o Brasil e os brasileiros e pretende ofender o continente africano e os seus povos. Também pretende atacar-me a mim e aos empresários portugueses“, continua Saraiva. “Como é óbvio, não consegue atingir nenhum desses propósitos — apesar de algumas pessoas terem sido apanhadas desprevenidas nesta onda de desinformação e calúnia.”

O chamado “patrão dos patrões” lamentou ainda a proliferação de notícias falsas na internet e apelou ao seu combate.

“A desinformação e a mentira são um vírus que devemos todos combater. Protagonistas do espaço público e cidadãos devem ter sentido de exigência e prudência. A democracia exige a defesa intransigente dos valores humanistas e do respeito pelo homem. Não há portugueses, brasileiros, africanos ou asiáticos de primeira ou de segunda. Não pode haver discriminação alguma pela nacionalidade, etnia, género ou outra característica qualquer“, disse.

“O populismo tem de ser combatido — e as fake news são o seu terreno predileto. Da minha parte, não lhes darei tréguas“, termina o líder da CIP.

Além do desmentido de António Saraiva, um olhar atento sobre a imagem permite perceber que existem vários elementos que não batem certo.

Em primeiro lugar, as frases. O Diário de Notícias é um jornal cujos conteúdos estão indexados no motor de pesquisa Google, o que significa que uma pesquisa por qualquer uma destas frases na íntegra devolveria a ligação para este artigo. Basta introduzir a frase do título no Google para perceber que este artigo não existiu:

Resultado da pesquisa feita pelo Observador às 20h10 do dia 21 de janeiro de 2021

Mas há mais elementos na imagem que colocam em causa a sua veracidade. Por exemplo, olhando para o canto inferior esquerdo, vemos a informação de que a notícia se encontra arquivada em quatro tópicos: “empresários”, “Portugal”, “António Saraiva” e “CIP”. Basta consultar os arquivos desses tópicos na página do Diário de Notícias para perceber que não houve artigos com aquele teor publicados naquela data. A título de exemplo, consultando o tópico “António Saraiva” é possível encontrar um artigo com data de 9 de dezembro de 2020 — sendo que o seguinte já tem data de 2 de março de 2021.

Conclusão

A publicação que tem circulado no Facebook inclui uma imagem falsa. Não é verdade que António Saraiva tenha proferido as afirmações em questão. Por um lado, o próprio António Saraiva desmentiu a informação ao Observador. Por outro lado, vários elementos na imagem mostram como se trata de uma manipulação — ainda que realista — de uma captura de ecrã do site do Diário de Notícias.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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