No último dia do primeiro mandato, depois de ser reeleito para mais cinco anos em Belém, Marcelo deu uma entrevista à SIC. Nos jardins do Palácio de Belém, entre uma e outra resposta, o Chefe de Estado ia levando à boca uma embalagem branca de tampa azul que segurava na mão. “É o seu almoço?”, pergunta-lhe o jornalista. “Por causa das circunstâncias, tenho pouco tempo para comer, um quarto de hora, vinte minutos, dez minutos”, começou por explicar Marcelo. “Então, aproveito e tomo Fortimel e o Fortimel substitui uma refeição.”
O episódio não é totalmente inesperado — Marcelo já tinha protagonizado um momento semelhante em janeiro deste ano, durante a campanha para as presidenciais, quando bebericou o seu suplemento mesmo à porta da Universidade Nova, em Carcavelos, depois de uma conversa com os alunos. Também ali, não houve almoço além daquela pequena garrafa.
Desta vez, porém, o caso assumiu novas proporções depois de o humorista Ricardo Araújo Pereira ter aproveitado excertos da entrevista à SIC para transformar aquele momento num spot publicitário ao produto que o Presidente da República usa para substituir o almoço, de tempos a tempos.
E “substituir”, aqui, é palavra-chave. Marcelo explicou que, devido à falta de tempo, recorre ao Fortimel porque isso “substitui uma refeição”. Logo a seguir, ainda diria que se trata de “um suplemento vitamínico e proteínico que dá para substituir uma refeição”, ainda que isso não deva ser feito “por sistema”. A questão, por isso, é a seguinte: o Presidente da República tem razão quando refere que este suplemento alimentar “substitui” uma refeição?
A resposta é “não”. E as explicações são dadas pelos especialistas da área. Além de médico nos Cuidados Intensivos do Hospital de Santo António, no Porto, Aníbal Marinho é também presidente da Associação Portuguesa de Nutrição Entérica e Parentérica (um tipo de nutrição em regime hospitalar para assegurar as necessidades nutricionais e energéticas dos doentes).
Ao Observador, o médico explica que este suplemento usado (e promovido) por Marcelo — e que é apenas um dos muitos produtos disponíveis no mercado, cada um com um propósito específico — é utilizado “para otimizar a nutrição” daqueles a quem o seu consumo foi prescrito. “É um suplemento calórico para pessoas mal nutridas, associado à [situação de] doença” ou em idosos mal nutridos, em que se verifique alguma perda de hábitos alimentares. Em qualquer caso, “não devia ser utilizado com esse intuito” de substituir uma refeição, refere Aníbal Marinho. São “ótimos para para complementar uma alimentação inadequada”, acrescenta o especialista.
As explicações de Mariana Chaves, nutricionista, estão em linha com as do médico intensivista. “O Fortimel é utilizado em contexto de doença ou em situações agudas, como um pré-operatório ou um pós-operatório, e também em situações específicas de desnutrição associada à doença.” Ao Observador, a nutricionista acrescenta que este suplemento “não pode ser encarado como um substituto de uma refeição” mas, antes, como um “complemento para consumir entre as refeições principais” e que deve ser usado “em situações pontuais em pós-operatório ou em casos específicos de desnutrição”.
“É uma ferramenta para conseguirmos aumentar a ingestão de alguns nutrientes que não estejamos a conseguir através da alimentação”, acrescenta a autora da rubrica “Aprender a Comer” da rádio Observador.
Ambos os especialistas alertam para o facto de não estar em análise se Marcelo devia, ou não, ingerir aquele tipo de produtos. Aníbal Martinho lembra que Marcelo estará sob permanente vigilância clínica, pelas funções que exerce, e a toma do Fortimel não representará um risco no seu caso específico. “Nem sequer me chocou quando o vi tomar o suplemento durante a campanha”, assume o clínico.
Mas também por aí fica claro que a toma destes suplementos — que são de acesso livre no mercado — deve ser feita por recomendação médica. Até porque, em determinados casos, o consumo pode resultar em “complicações” para a saúde. De qualquer forma, conclui Aníbal Marinho, Marcelo “fez-nos um grande favor” por, ainda que de forma involuntária, “trazer à discussão a importância dos suplementos medicinais para suporte nutricional” dos doentes. Ainda que o tenha feito em termos pouco rigorosos.
Conclusão
Suplementos como os que são tomados por Marcelo não são substitutos de refeições — sobretudo, no caso do almoço e do jantar. Os especialistas definem-nos como um “complemento” à alimentação normal, que deve ser consumido entre refeições ou nas próprias refeições. Não é um produto para consumir em vez da refeição.
Segundo a classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
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FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.