Desculpem, leitores! Perdão, curiosos! Cuidado, espíritos sensíveis! Atenção aos que não gostam de números (vou usá-los muito)!

É que hoje vamos a contas. Sim, a contas! Daquelas simples, de matemática básica – das que afligem populistas e políticos no activo e que aterrorizam primeiros-ministros fugidios e ministros das Finanças baralhados. Daquelas que obrigam a uma reflexão, a ponderação e a algum recato, tudo coisas incompatíveis com notícias compactas servidas em 3 segundos nas redes sociais.

A todas e a todos recomendo, portanto, que não leiam ou que, se o fizerem, se preparem para as contra-indicações com um antidepressivo e um antiácido, porque farei questão de deixar aqui registada, para memória futura, a verdade cruel, nua e crua dos factos e dos números, em 7 pontos.

1º – A carga fiscal, em percentagem do PIB, mede a quantidade de riqueza do país que é retirada para si próprio pelo Estado. Em 2018, esta foi 35,4%, a mais alta desde que há registo e mais de 1,1 p.p. acima do nível de 2014 (com Passos Coelho e a troika). E pasme-se: mais de 6 p.p. acima dos 29,3% do distante e saudoso ano de 1995.

2º – O esforço fiscal, um indicador menos conhecido do que o anterior, mede o esforço que os contribuintes fazem para cumprir as suas obrigações fiscais. Obtém-se dividindo a carga fiscal pelo PIB per capita (i.e., pela riqueza que cada cidadão produz). É um indicador que se usa para efeitos de comparação internacional e que nos coloca em 2018 no terceiro lugar do pódio dos que mais se esforçam (com 100), cabendo o inglório primeiro lugar à Grécia (124) e o segundo à Polónia (105). É interessante observar países com cargas fiscais elevadas mas que registam um esforço fiscal comparativamente muito baixo: Irlanda (25), Luxemburgo (32), Suíça (37), Noruega (55), Reino Unido (68) e Alemanha (70). Curiosamente (ou talvez não), estes campeões do baixo esforço pedido aos cidadãos coincidem com os nossos destinos de emigração primordiais — para onde foram primeiro os menos afortunados e para onde hoje correm cada vez mais os médicos, enfermeiros, engenheiros e outros licenciados em busca de emprego e alívio.

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3º – 52.000.000.000,00 de euros. É este o número total que Centeno arrecadou no país em 2018 (contra 44.000.000.000,00 de euros em 2014). 13 mil milhões vêm do IRS (trabalho); 18 mil milhões do IVA (consumo); 9 mil milhões de outros impostos sobre produtos, como os energéticos, e 6 mil milhões de IRC (criação de riqueza).

Chamo especialmente a atenção para o imposto sobre produtos energéticos e petrolíferos, que garante ao nosso gasóleo o título do mais caro da Europa. Interessa manter maus transportes públicos e desinvestir da rede ferroviária para pressionar empresas e famílias a usar o automóvel e a pagar de forma desproporcionadamente elevada.

Pois é: discurso verde, paleio de CO2, Greta “uber alles” e passes para todos, mas a verdade dos números fala mais alto — este Governo quer automóveis e camiões na estrada para cobrar e mais cobrar.

4º – Competitividade fiscal para empresas – em consequência do anteriormente explicado, da burocracia sufocante e da agressividade da máquina fiscal, que são factores avaliados internacionalmente para aferir a competitividade fiscal dos países (International Tax Competitiveness Index 2019), Portugal é um dos países europeus onde a tributação das empresas é menos competitiva, numa lista liderada pela Letónia.

É por isto que fogem de Portugal empresas e empreendedores. Apesar das festas “Web”, o investimento sério vai para onde as condições de atractividade existem – porque há empresas que sabem distinguir champagne de cognac e não há Paddys que convençam gestores sérios e informados.

5º – Competitividade fiscal para famílias – de acordo com o mesmo estudo, a comparação europeia é também desfavorável no que respeita à tributação do rendimento das famílias portuguesas, com a Estónia a surgir em primeiro lugar.

Em Portugal, a estrutura do IRS é composta por 7 escalões, com taxas que vão dos 14.5% aos 48%. Aos escalões intermédios, com rendimentos coletáveis entre 10.700€ e 36.856€, aplicam-se taxas entre 28.5% e 37%, o que ilustra a elevada tributação sobre a classe média em Portugal, reflexo da hiper-progressividade do sistema. Acresce que 78% da receita com este imposto é paga por 30% dos agregados familiares, o que mostra uma estrutura de IRS altamente penalizadora das poupanças da classe média, suportada pelos rendimentos de um pequeno estrato da população. Em contraste, países como a República Checa, a Hungria e a Estónia têm uma taxa única de IRS (15% nos dois primeiros e 20% no último) e outros, como a Irlanda, têm apenas dois escalões de rendimento.

Fica assim claro onde se deve ir para trabalhar, poupar e respirar.

6º – 140 impostos diferentes – o número de tributos que em 2018 existiam em Portugal, entre taxas e mais taxas, disfarces e mais disfarces. Vamos ver para onde se dirige a criatividade glutona do Governo e seus aliados de serviço. Quem e o que irão taxar mais? Podemos esperar o pior.

7º – 1671 – este é o número de empresas e pessoas que orgulhosamente Centeno e o seu secretário de Estado apelidam, com indisfarçável apetite, de “grandes contribuintes”, anunciando com pompa, circunstância e luzidio brilho nos olhos (e correspondente cobertura televisiva) que estes são responsáveis por pagar 50% da totalidade dos impostos em Portugal.

O que podemos esperar para 2020? Mais do mesmo — ou seja: (i) muito, (ii) mau e (iii) mal.

Podemos esperar (i) muitas taxas, (ii) um mau orçamento que não altera a estrutura da carga fiscal e agrava impostos (pelo menos o ISP) e (iii) uma mal disfarçada proposta que irá convencer com maquilhagem.

É tempo de mudar, de apontar novos caminhos e de reformar! É tempo de conhecer os números e de enfrentar os problemas, mas infelizmente, enquanto o torpor durar, continuaremos, brandos e serenos, esperando que 1671 decidam partir, com eles se evaporando metade das nossas receitas.