Irrita-me quando oiço atribuir-se aos adolescentes e aos mais jovens a responsabilidade pela “crise dos valores”. Como se ninguém respeitasse ninguém. Como se os valores da humanidade, da solidariedade, da compaixão ou do altruísmo fizessem parte duma espécie de pré-história do futuro.
Mas é verdade que, também a mim, me preocupa quando oiço muitos destes jovens a dizerem que “só” querem fazer alguma coisa de “diferente”. De “muito bom”. Ou a quererem, sobretudo, ganhar muito dinheiro. Recusando-se a identificar os sonhos que os movem. Ou os caminhos que ambicionam percorrer. Como se o dinheiro prevalecesse sobre o sonho e o desejo. Ou sobre aquilo que tenha a ver com “a cara deles”.
Estava eu perdido nestas cogitações quando a revista “Visão” me pediu uma opinião sobre a geração que estamos a formar para o futuro. E, quando dei por mim, falei de preocupações. Da forma como me preocupava o modo como os adolescentes põem a carreira à frente da vida. Como parecem ser uma geração egocêntrica, que tolera mal os “nãos” e as frustrações. Uma geração demasiado digital, que tem inúmeras fontes de informação mas a quem falta quem a ajude sintetizar esse manancial em pontos de vista e em escolhas esclarecidas. Uma geração com grandes dependências: de jogos ou de álcool, por exemplo. Uma geração impaciente e amiga do consumo. Mas uma geração que, num curto espaço de tempo, viveu a pandemia, a guerra, a crise energética e outras crises que irão reformular os seus valores. E que parece ter um futuro com demasiadas reticências.
Chegados aqui, tremi diante da geração que estaremos a criar para o futuro. Será que tudo isto é uma crise de valores? – pensei eu. De certa forma, sim. O que me inquieta é que os nossos filhos querem ser felizes. Querem sentir-se realizados. Querem ter uma vida. Tal como aconteceu connosco. Mas o seu futuro parece muito “embrulhado” nos valores que lhes transmitimos. A crise dos valores que eles parecem protagonizar é nossa. E é um bocadinho batoteiro alarmarmo-nos com aspectos que lhes faltem sem nos implicarmos nessa responsabilidade. Não era altura de emendarmos erros e omissões e de os trazermos aos valores de que andamos mais ou menos fugidos?