“O Homem é a medida de todas as coisas”.
Protágoras

A escola pública “Big Data” é a escola massiva dos grandes dados; do estudo, triagem, selecção e optação do conjunto dos grandes dados informáticos em Educação. Com vista a acções imersivas e imersividade aplicada às decisões de política educativa.

A infocracia e a corrente mediática informacional dataísta relevam para um novo paradigma social, numa mundo-visão totalitária, pervertida e perversa, de inculcação de pensamento uno, numa abordagem dialógica digital versus humano, com supremacia da máquina em detrimento do Homem.

O poder político decide com base no acesso à informação dos dados e a própria ideologia tem na base a sacrossanta algoritmização controladora da vida humana, com enfoque axio-sócio-psico-político, em forma de prisão panóptica digital dominante. A escola pública, “caverna digital” dos tempos modernos; o que nos traz à memória o mito da “caverna de Platão”, sem noção de aprisionamento e ilusão de liberdade. Alegoria, metáfora, parábola de Platão no Livro VII da obra A República, diálogo onde é demonstrada a submissão humana à vulgarização alienante do pseudo-conhecimento e perda do pensamento racional. Hoje, contemporaneamente vivemos ensombrados pelo poder dos algoritmos, num ambiente de toxicidade digital intolerante e de irrespirabilidade humana, ao arrepio do desafiante, afirmante e categórico contraditório humanus.

Os governos são governados pelo dataísmo. A dataficação (do inglês datafication), a datificação (de data types) ou a terceira via, que propomos em simbiose – a dataíficação; todas são uma e a mesma coisa e significam a despontante-consequente “Big Data”, mentalidade-filosofia emergente do pensamento actual europeu e mundial, em que a escolha e a tomada de decisão objectiva a praticidade das soluções para os problemas, a exactidão da análise-fundamentação dos dados computacionais, a economia de recursos, de despesa pública e de tempo; num tempo absolutamente crítico para a humanidade e do que entendemos por dominância humana em vias de extinção.

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Vivemos a (im)pessoalidade do estímulo-resposta digital e da automatização do “like”. O poder manipulatório dos meta-dados é comunicante e mumifica o cérebro humano; a projecção algorítmica cria e idealiza “perfis” ao digitalizar a vida humana. Caminhamos no sentido do “self quantifiers; much & many”, rumo ao auto-conhecimento e auto-aperfeiçoamento da divi-deificação algorítmica do robotizado-humano, não dissidente intelectivo, não desviante comportamental e (in)subversivo – a dimensão ideo-política da não divergente “homo” cópia exacta.

A escola pública vive hoje a plataformização da educação e do ensino, e toda uma miríade (do grego myriás) de aplicações; dialogia discursiva de gestão pessoal funcionalizada e de automaticidade organizacional escolar, de resposta algoritmotizada e resultado-padrão dataíficado.

Em Portugal, a propalada educação inclusiva é de facto exclusão educativa. O sucesso escolar de ficção virtual é resultante da “colectivização” gove-decretada do articulado legal, da proletarização intelectual, da amofinação burocrática torturante, e da “nacional-estatização” do lirismo romantizado do sucesso educativo político-ideológico e psicossocial vivência escolar dataísta reinante; em estado de negação da realidade-verdade histórica da escola pública “Big Data”.

A escola pública da digitalização dataíficada e a tempo inteiro, mercadeja o ensino e mercantiliza a Educação, na figuração do produto do sucesso educativo de nivelamento martelejado; enclausura o criticismo da mente, promove a acefalia intelectual anã-anaífica e caos(ifica) a criatividade docente, matando a nuclearidade da intelectualidade do professor, ao impedir a ócio-ocialização pensante do professorado.

O “magister” professor perdeu a figura da centralidade educativa, condutora do educando e do processo educativo, e é agora “vulgaris” personagem secundária da função algorítmica humano-funcionalizada. A escola pública tornou-se o território dos algoritmos matemáticos, da dataíficação e da vassalagem do “homo sapiens sapiens” à “Big Data”.

A infocracia e o dataísmo estão na origem e são a base do colapso da escola pública. Problema deveras agravado no caso português.

Vivemos num admirável mundo novo. Primeiro quarto de séc. do 3º milénio d.C. Ano da graça de 2024. Dominado pelo omnipresente, omnisciente e omnipotente “santuário digital”, templo de referência como modelo e padrão paradigmático de convivência na actual sociedade de informação online, ao nanossegundo.

Informação é poder. A infocracia vem substituindo a democracia, ao suplantar o poder do povo pelo poder da informação. Falamos em referência ao condicionamento do pensamento humano, do exercício da cidadania e tomada de decisão individual e colectiva, consciente, inconsciente e de alienação dos comportamentos e opinião pública, axio-psico-politicamente controlados, rumo ao subliminar totalitarismo infocrático de pensamento único incutido às massas.

“Aprender o que pensar” é a opção política que o Poder dominante nos quer impor, ao formatar, padronizar e uni-standardizar; imbecilizar, coisificar no sentido de objectificar o pensante homo sapiens. A assertiva optação a escolher, “aprender como pensar”, tem na origem o humanus e a humanitas, que de modo algum podemos alienar e perder.

A infocracia, em teoria informação, é de facto desinformação, manipulação e imposição dogmática. Formatação algorítmica e emocional por indução: dos juízos, valores, conceitos, ideias, pareceres e ilações na era digital em que vivemos. Donde, o processo cognitivo da infocracia neutraliza o criticismo e a análise, anula a democracia intelectual “per si” e participada, e elimina o pensamento do homo liberum com liberum arbitrium.

O dataísmo vem do latim “data”, que significa dados. Caracteriza-se pela hiper-mega valorização do “fluxo de informação (…) como valor supremo; (…) uma nova forma de religião”. (David Brooks, The New York Times, 2013; Yuval Noah Harari, Homo Deus: Uma Breve História do Amanhã, 2015). É feito o culto, a veneração dos dados, numa visão algoritmotizada e rôbo-humanizada do superlativo absoluto dataísta, o “divinus”, ao invés dos deuses ou do Homem. O algoritmo matemático é visto como sagrado, em plena convergência com as novas tecnologias da informação (informática, telecomunicações e mídias electrónicas), nanotecnologia, biotecnologia e ciências cognitivas. No dataísmo, “o Universo consiste num fluxo de dados e o valor de qualquer fenómeno ou entidade é determinado por sua contribuição ao processamento de dados”. (Harari, 2016, p.370)

O dataísmo é uma ideologia emergente, valor “maximus” e de culto, e podemos interpretá-lo como a “religião dos dados”. Sendo visto como a religião do século XXI, pelos algoritmos detentores do dom da ubiquidade e pelas relações virtuais. Os dados e o estudo dos dados estão no centro das decisões: dataísmo e biopoder. Paradigma conducente a mentes digitais, algorítmicas, da evolução do “homo sapiens” para o “tecno-humanismo”, consumado no super-humano, “homo dei tech”, na fusão de algoritmos bioquímicos com os das máquinas.

As ciber-techs sociedades digitais actuais, em submissão ao capitalismo alfa dominante, para a resolução de problemas em concreto e execução de tarefas específicas pessoais, colectivas e organizacionais, são escravas aprisionadas dos algoritmos. “Algoritmos são procedimentos precisos, não ambíguos, padronizados, eficientes e correctos”. (Dasgupta, Papadimitriou e Vazirani). Em linguagem matemática e ciência da computação, um algoritmo é uma sequência finita de acções e comandos executáveis para a solução direccionada de um determinado tipo de problema; resposta e fórmula determinista, em sequencial equação matemática para alcançar um objectivo final.

A humanidade refém da ditadura digital dos meta-dados, meta-informação, reunida em bancos de dados que reúnem dados sobre outros dados: para organizar, localizar, identificar, categorizar, manipular, recuperar, cruzar e controlar a informação.

Hoje, no mundo actual e futuro, cada vez mais impera a criptografia, codificações e encadeamento de combinações de algoritmos codificados, as “hashes” – transformação dos dados em informações para a tomada de decisão a qualquer nível: político, ensino, económico, financeiro, social, empresarial, segurança social, saúde, justiça, defesa e segurança, educação, etc.

Particularmente na educação e ensino os efeitos têm sido devastadores. Com uma pretensa inclusão que é exclusão e desregulação do(s) sistema(s) educativo(s); de uma (in)justiça de nivelamento por baixo e fracturante com a escola tradicional clássica de exigência e excelência. Decorrente do embuste da massificação, democratização e colectivização do sucesso educacional, em submissão ao dataísmo, a escola pública vive presentemente uma crise de identidade sem precedentes, enquanto organização eminentemente meritocrática e humanista.

As redes sociais têm popularizado e extra dimensionado, valenciado o fascinante mundo dos algoritmos e as respostas politicamente, socialmente e economicamente “correctas” à educação, ao traduzir e transformar os códigos em informações, definidoras de políticas, procedimentos, regras de conduta, controle governamental, resultados escolares e sucesso educativo “had hoc”.

Há assim uma edu-comunicação digital e dataíficação de continuação e acentuação nas escolas. O “deus-tech” do dataísmo e da quantificação-estudo “Big Data” (maior variedade, volume crescente e mais velocidade dos dados, os três – 3 Vs) para a objectividade do conhecimento; numa perspectiva do capitalismo rupto-despersonalizado e assintomático de “humanum” emocionalidade, de gelo analítico relacional-social no espaço-escola, sendo as crianças, os jovens, os estudantes, os professores, a comunidade escolar, “coisificados-objectificados” por dataísmo, na mais absoluta indiferença e negação do “Eu homo”.

A escola pública vive refém da pegada digital relatada pelos dados. Os algoritmos são os decisores digito-políticos das políticas educativas nacionais e internacionais; informam, empoderam e fazem acontecer as decisões políticas públicas, em concreto na organização escolar: a nível macro e micro, na teorização, nos princípios, nas práticas, nos currículos e programas escolares algoritmotizados, nos conteúdos, nas metodologias, na pedagogia e didáctica digito-tecnológica, nos objectivos, na conceptualidade e na ideologia, em função à dominância capitalista sistémica transnacional.

Resulta daqui uma dialéctica tensio de opostos contrários, entre a automatização de meta-dados (marcadores referenciadores de informação sobre conteúdos e fontes) do humano dataíficado e o “schola humana originali”; que é “innaturalis” à natureza humana e à ideia de escola e modelo escolar de que todos somos filhos e mentalmente conectados e formatados de pensamento.  A escola vive a díade dialéctica da inovação algorítmica dataísta ocupante versus a resistência e resiliência defensiva entrincheirada do “homo divina creatura”.

A escola em muta-alomorfia é pensada como algoritmo, programação e “coding”. Para Harari, no seu livro “Homo Deus”, o algoritmo “(…) é o conceito mais importante do nosso mundo”. Os algoritmos são ícones invasores da organização escola e da sociedade, constituídas por pessoas, que mais não são do que algoritmos bioquímicos, processados e dataíficados: indivíduos, grupos, colectividades, ideias, axiologia, comportamentos, organizações, o próprio Estado.

Vivemos o arquétipo escolar do dataísmo, com o cruzamento confluente de algoritmos bioquímicos e algoritmos tecnológicos (Harari); mutagénese que estuda, decifra e influencia decisivamente a escola, a educação, o ensino, os projectos, as políticas públicas educativas e escolares, e os actos de decisão legislativa e executiva dos governos, do Ministério da Educação (ME), do Estado.

Do manancial informacional dataísta e do tratamento dos dados e estatísticas em Educação, resulta o caos da digi-tech-burocracia que torna “demodé” a “velha escola”. A centralidade é agora ocupada pelos dados, para a tomada de decisão política e de gestão e administração escolar; e na tomada de decisões para acções concretas que afectam o dia a dia das escolas, dos alunos e dos professores e de toda a comunidade escolar, numa concepção capitalista de escola-empresa, com o máximo de produtividade e eficácia e o mínimo de desperdício (o não ao chumbo-retenção), com a maximização-rentabilização do investimento público estatal – leia-se sucesso escolar/educativo inclusivo proletarizado-colectivizado, mesmo que martelado e virtual-ficcionado                      “ad nauseam”.

O dataísmo enfatizado é a nova religião-bíblia escolar, a cartilha da “Big Tech School”, que anula a ressignificação e a recentralização centru-centrípeta do professor e da escolarização tradicional, em colapsante colapso existencial.

Estamos vivendo no primeiro quartel do século XXI e é necessário repensar, regressar e reingressar na decisão e tradição professoral-escolar, tecnológica q.b. e curricular-disciplinar humana e humanista revisitada, de pessoas para pessoas e não de máquinas para pessoas; e não mais a escola moderna-contemporânea digital, da ditadura algorítmica e da “algoritmização curricular”. (Roberto da Silva, O avanço da Big Data sobre o ensino e os currículos).

A algoritmização curricular é o resultado de contas, operações e cálculos matemático-informáticos de conexão lógica sequencial finita, linear, metódica e calculada – um fluxograma com instruções de definitude e exactidão precisa e a vários passos, e não de ambiguidades, aplicada aos “schola curriculum”.

Morozov (2018), fala criticamente do avanço progressista do “novo consenso algorítmico”. O autor defende a ruptura com o modelo intelectual da Big Tech; fala em identificar o poder no digital; enfatiza da necessidade de ampliação dos debates sobre a liberdade; e defende a contestação do consenso algorítmico.

“A crítica a esta algoritmização curricular, distanciando-se de uma postura tecno-fóbica, propõe uma crítica política ao modelo da Big Tech (goli-adamo/Golias-Adamastores, gigantes tecnológicos) e a problematização de posicionamentos dataístas, em ampla ascensão na literatura educacional”. (idem)

Em síntese, a tomada de decisão política é resultante, nomeadamente na escola pública actual, do dataísmo, mentalidade e filosofia emergente de Big Data. Os algoritmos computacionais, os dados processados, têm implicações directas nos currículos escolares – a algoritmização curricular da “nova escola”.

Os gurus da hi-tech e dos chips, profetas do dataísmo, querem acabar com o humanismo que enfrenta o desafio existencial do livre arbítrio e escolha. A visão mundista dataísta, confere grandes poderes aos políticos; é o Santo Graal do poder político totalitário e doutrinário de pensamento único imposto, e “insights” doutrinais de pensamento singular dogmático para a resolução dos problemas.

Para o historiador e professor israelita Harari, “(…) Na era da informação, os algoritmos têm a resposta, (…)”. (Yuval Noah Harari, Google, «Big Data e o Fim do Livre Arbítrio», Financial Times, 26 de agosto de 2016).

Em contra-ponto, temos a autoridade humana de pensadores humanistas como Rousseau e do seu Tratado sobre a Educação, “Émile”, 1762, sendo o livre arbítrio humano o mais alto e superlativo valor e farol condutor do “homo sapiens  sapiens”, livre, pensador e máximo decisor pensante; “centrum” e centralina para re-humanizar a escola.

“Anthropos Kentron”; do grego, o “homem no centro”.

O antropocentrismo de   Kant. “Sempre considere todo o homem como um fim em si mesmo, e nunca o use meramente como um meio para seus fins”. (Immanuel Kant)

“A Educação é o ponto em que decidimos se amamos o mundo bastante para assumirmos responsabilidade por ele”. (Hannah Arendt)

Disse.

Nota: professor que escreve de acordo com a antiga ortografia.

CCX.