«Nós não pedimos felicidade, apenas um pouco menos de dor.» (Charles Bukowski)

«A História da Educação, nos tempos que correm, está marcada pela engenhosidade e inventividade política desde 2005, em que as políticas educativas se fundem com as convicções dos governantes e confundem o superior interesse público da “res publica” com acções pessoais autocráticas, de personalização do poder e do líder, autoritário e sem controlo, despótico. Em que impera a ditadura da maioria, de rompimento disruptivo e de forma distópica com a normalidade; de opressão totalitária sobre a legalidade, a regularidade e o consuetudinário.

É a realidade que se passa hoje na Escola Pública e a verdade que atormenta professores e educadores. A escola-arena consubstancia-se em Portugal no início do século XXI, a partir de 2005/2006, facto confirmado pelo próprio Primeiro-Ministro, Dr. António Costa, que em declarações à Sic Notícias, em 2015, afirmou: “os professores foram vítimas de uma guerra injusta decretada num conselho de ministros de que fiz parte em 2006.”» (Carlos Almeida)

Está validada a guerra, em forma de guerrilha institucional permanente com o professorado, tendo como grandes vítimas, além dos docentes, os alunos, a Escola Pública, a qualidade do sistema educativo, da sofrívilidade à mediocridade do ensino-aprendizagem. Ora de forma sub-reptícia, ora de forma explícita, o verdugo e o chicote político fere incessantemente os professores, numa tormenta persecutória que é já “assédio moral laboral”.

Vivemos o estranhamento da negatividade negacionista da centralidade do professor no sistema educativo. Uma descentralidade premeditada e paulatinamente implantada pelo Estado, cujo objectivo político é minar a autoridade do professor, ao disseminar, diluir o poder e arbítrio, controle e mando docente. Foi morrendo o direito legal de decisão e de se fazer obedecer. Acabada está a autoridade do professor. Afirmado está o poder político autocrático de cultura anti-escola, anti-professor e anti-educação.

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Harari valoriza lidar com as mudanças e manter o equilíbrio mental no ignoto. A conjuntura actual é de indignação e revolta dos professores. De libertação da consciência de classe e da “revolução” há muito adiada. “Numa época de mentiras universais, dizer a verdade torna-se um acto revolucionário”. (George Orwell)

Os professores têm entranhado o comportamento Kafkiano do ME e a vivência do desprezo, ostracismo e abandono. Dói! “O poder ilimitado nas mãos de pessoas limitadas sempre leva à crueldade”. (Aleksandr Solzhenitsyn)

Politicamente falando, analisados os factos com visão histórica, concluímos da premeditação, planeamento, consciente má-fé, método e rigor, assertividade cirúrgica e escolhas minuciosas dos ataques às vertentes vitais da profissionalidade docente. Falamos do octograma do mal. No sentido das oito ideias maquiavélicas postas em marcha: desmantelamento do Estatuto da Carreira Docente (ECD); “quadridentis” ataque à carreira, avaliação-progressão, digito-burocracia, administração e gestão escolar; detonar a autoridade e respeitabilidade docente; cianetamento do clima de escola e toxicidade-relações humanas; negação e menosprezo pela proposição, negociação e concertação.

O esvaziamento da essencialidade docente conduziu à menoridade intelectual da figura do professor, agora funcionalizado e cada vez mais proletarizado pelos governos, numa imposição ministerial-tutelar ridículo-farsante do “faz tudo”; menos a sua missão central de pedagogo e intelectual, com autonomia e poder de decisão. Ao invés do panorama “pidesco” de vigilância apertada e “prestação de contas” humilhante, no pensar e no sentir dos professores.

O professor finge o que não sente e representa o que não é. Viola violentamente a sua própria consciência, com a ética deontológica em conflitualidade, e vê a sua axio-profissionalidade conspurcada, numa miríade de tarefeiro-estafeta “burrocrático”. Princípio e insulto destruidor da auto-estima. A profissão não é mais fruição, atracção, valorização e realização pessoal. Para mais, quando é o próprio ministro da Educação, João Costa, a assumir publicamente que apenas 50% dos professores poderiam sonhar alcançar os três últimos escalões da carreira.

Não há motivação porque a escola-arena infantiliza a intelectualidade e maturidade do pensamento docente; é uma escola de diminuta e infinitesimal exigência e do sucesso escolar ficcionado exponenciado, na valência do “faz de conta”. Que choca o professorado na sua proximidade com o facilitismo e aproximação ao grau zero. A massa crítica docente é descrente na “escolinha dos projectos”, endeusada de “inovação” e “felicidade”.

Na escola-arena, a visão política liliputiana do professor-pigmeu faz vingar a importância raquítica da dimensão tecnológica, que não a humana e humano empenhamento dos professores, na miragem invertida e desfocada da sua medida de grandeza, em forma de “circus provocatio absurdum”, rumo a tempos “apocalípticos” na educação. Temos o “mundus educatus” de patas para o ar, “daquele que não é conduzido” – o aluno.

De sobra temos a burocracia estupidificante e embrutecedora “É fartar, vilanagem”. Quanto menos burocracia melhor. O professor não é burocrata. A burocracia é depreciativa do trabalho do professor. O professor é intelectual. Precisa da “ociosidade do tempo livre” para poder pensar e preparar as aulas.

Impõe-se um pacto social e político a médio-longo prazo, um novo contrato para a Educação, que recentralize a figura e a autoridade do professor na organização escolar.

Há a contingência emergente da tecno-ciência e da acção pedagógica online. A submissão da humana performance docente à ciber-cultura tecno, exponenciada pelas redes sociais, colide numa dialéctica tensional entre elementos contrários.

A mediatização e o espaço público operam a mudança e transição da “intimidade” da sala de aula para a “extimidade” da escola, num determinismo reducionista e solucionismo apressados, de pensamento único imposto, em nome da escola do futuro e das novas gerações digitalmente nativas e incapazes imberbes analógicos.

Comunicacionismo hiper-mediatizado cibernético, em função à máquina, ao computador e ao tablet, contrário e ao arrepio da solidez temporizada das “humanum” ensino-aprendizagens dos professores; ficando a faltar a conexão e a alteridade do Outro, do interlocutor, do primado do humano, agora secundarizado. Donde, a perda da interacção dos sujeitos professor-aluno, com a imediaticidade a troncar o normal processo de socialização.

A virtualidade e “modus operandi” da pedagogia online, na actual Escola Pública em metamorfose, descentra o professor e descentra a proeminência da palavra do professor, “mutatis mutandis”, com descrédito valorativo e nada atractivo para o capital humano e social – subvalorizado e deflaccionado do professor.

Urge acabar com a reduflação do professor e ressignificar o humano na clássica relação da escola de sempre, com os alunos do século XXI, 3º milénio d.C., que já nasceram “conectados” às telas, ecrãs e filtros; viciados e isolados socialmente nos recreios das escolas por treinamento contínuo com os smartphones. Sendo os telemóveis uma extensão da sua própria idiossincrasia, de “olhos em bico” em pequenos monitores, dedando freneticamente.

Estar cara a cara, o respirar e o sentir a cumplicidade professor-aluno, o pulsar de interacção e emocão e o olhar de duas pessoas é muito diferente de qualquer interface e de uma qualquer interactividade.

Ser professor é ser humano; não é ser máquina automática, numa escola “travestida” de digitalizações e Inteligência Artificial (IA), apagante do “homo sapiens”. O sinal e estímulo telemático do paradoxal coercivo tem de acabar já, e o professor, sem demoras, tem de voltar a ocupar a centralidade natural da sua relevância institucional na escola, na comunidade e na sociedade portuguesa.

A escola-arena metamorfoseada, da apologética política digital, do ChatGPT e da IA faz uma ruptura com a ancestral continuidade educativa, algo de absolutamente estranho à emocionalidade, centralidade e significação humana e de valores humanistas do professor; em vivência de subalternidade a uma ciber-cultura invasora e arrasadora de métodos, pedagogias, didácticas, hábitos, valores e cultura de escola. O assalto assumido e a assumpção de uma nova “territorialização” que assusta e intimida. De eficácia fracassada e comprovada.

Vem vencendo o projecto tecnológico e tecnocrático e perdendo o projecto humano e de auto-realização humanista. E o erro, o erro está em pensar que o devir é tecnológico e o passado é antropocentrista, secundarizando e descentrando o papel do professor.

Nada mais errado por parte das “iluminárias das trevas” do ME, deslumbradas com o imediatismo e fascínio de digi-modas que agora cá chegam, mas que no estrangeiro avançado e culto, nomeadamente na Europa do Norte, estão a ser abandonadas. Com a agravante da perda da identidade do professor. Facto é que o poder político legitimou e afirmou o primado do wi-fi e do tecno- ensino-aprendizagem, em detrimento da pessoa humana do professor.

O professor vê-se encurralado, emparedado, perdido num labirinto que o esmaga entre a “obsolescência” de toda uma vida profissional em concreto, e a “insânia” da tutela na insistência de ambiguidades, projectos e contradições dialécticas doentias, ao martelar o “entranhar o estranhamento”, numa atitude provocatória do ME, que tem como resposta a resistência de toda a classe docente. Liderar não é impor. Liderar é despertar no outro a vontade indomável de acreditar e fazer. Não se reforma por Decreto!

O Governo e o Ministério da Educação (ME) estão a precisar de uma operação de catarse em larga escala, para limpeza conceptual e purificação ideológica. “The Great Reset”. Apagar para começar a grande reinicialização.

É que o “delirium tremens” de mirabolantes melhorias e sucesso educativo nas aprendizagens “pandémicas” não passa de uma monumental esquizofrenia e surreal mentira.

A escola-laboratório de projectos falhados, de experiências estrangeiras e influxos “import changes” falhadas, fundamentalista anti-papel por troca com o e-book de formato digital, de ideários fervilhantes, é tempo de voltar à escola intemporal da axiologia humanista, das pessoas e para as pessoas, tendo como Maestro o Professor.

Só as vítimas da dor sentem a dor e a intensidade do sofrimento da dor que tanto dói e destrói. Entender a dor do Outro é pensar, passar e sentir a mesma doída dor.

A espécie de felicidade de que preciso não é tanto fazer o que quero, mas não fazer o que não quero”. (Rousseau)

Disse.