Estava a conduzir e a ouvir notícias na rádio, como habitualmente faço. Uma das notícias era sobre os pais de crianças e jovens com deficiência que se concentraram em várias cidades do País para pedir mais e melhores apoios para os seus filhos. Dizia um pai, que as terapias eram insuficientes.
Como referi, em artigo recente, a comparticipação financeira que as entidades sem fins lucrativos recebem do Ministério da Educação, precisamente para prestar apoios (terapia da fala, terapia ocupacional, psicologia, fisioterapia e psicomotricidade) a crianças com deficiência, está congelada há 8 anos pelos Governos PS e agora também pelo Governo PSD/CDS. Ou seja, não há mais dinheiro para prestar apoios terapêuticos às crianças a quem já se presta apoio, muito menos para aumentar o número de crianças apoiadas e que ficaram de fora. Acresce que estes trabalhadores, ao contrário dos públicos, não tiveram direito a aumento salarial nestes últimos 8 anos (importa referir que o Patrão é o mesmo, ou seja, uma discriminação violenta). E exigem-lhes 35 a 40h de trabalho directo com os alunos, quando na realidade, deveriam trabalhar em igualdade com os professores, ou seja, no máximo 25h de trabalho directo. E pergunta o leitor, então, mas há crianças que ficam de fora dos apoios terapêuticos? Sim há.
Há uns bons anos, O Governo, por arte mágica, retirou milhares de crianças e jovens com necessidades educativas especiais dos critérios de avaliação para assim não dar apoios terapêuticos, logo poupar dinheiro (presumo que para aumentar salários aos funcionários públicos e para derreter na TAP, EFACEC e noutros sítios).
Depois em 2014, chegou o discurso do Governo de que “todas as crianças este ano lectivo teriam apoios terapêuticos”, ninguém ficaria de fora. Verdade, confirmo. Na altura até comentei que se eu desse um pão por dia a alguém e nada mais, eu poderia dizer que essa pessoa foi alimentada. No entanto, certamente morreria de fome em poucos dias.
O Governo em vez de deixar crianças de fora dos apoios (como aconteceu vários anos; mas atenção não confundir com as que ficaram de fora por força dos novos critérios, escrevo agora das que têm critério para ser apoiadas) decidiu apoiar 30 minutos cada criança. Como o dinheiro é o mesmo e o número de profissionais também, as crianças passaram a ter 30 minutos de terapia, a cada 2 semanas e algumas nem isso.
Muitos pais procuram assim recorrer às diversas Terapias através do subsídio de educação especial atribuído pelo Estado (Segurança Social). Como é bem pago, proliferam gabinetes de técnicos a trabalhar por conta própria e depois não há profissionais para trabalhar nas entidades. Acresce que proliferam clínicas a fazer o mesmo trabalho, cujos trabalhadores até se deslocam às escolas (apenas algumas e consoante as simpatias…) naquele que é um negócio bastante lucrativo. Claro que o é para as clínicas e terapeutas a trabalhar por conta própria, não para as IPSS, pois como referi há 8 anos que estão a “secar”.
O pior é que a maioria destes apoios é realizado no espaço das escolas, em que as empresas poupam custos em instalações e os técnicos ocupam espaços das escolas que depois fazem falta aos técnicos do CRI (Centro de Recursos para a Inclusão – serviços prestados por entidades sem fins lucrativos). É-me indiferente se estes apoios nas escolas são feitos por entidades públicas ou privadas, mas se calhar seria sensato que o País formasse o número de terapeutas suficiente e todas as crianças pudessem ter as terapias que precisam sem este duplo financiamento que só serve alguns. Claro exemplo de desperdício de dinheiros públicos, para que tudo funcione pior.
E já agora, sabia o leitor como se trabalha nalgumas escolas e se prestam estas terapias? Em corredores, vãos de escadas, arrecadações e outras coisas parecidas, alguns em que a limpeza e arrumação deixam muito a desejar. Dizem que é a escola Inclusiva. Desde 2008, que o objetivo seria incluir todas as crianças nas escolas. Mas, durante todos estes anos, teimosamente, Governos (não sei se todos eles acham isso ou por influência de alguns funcionários do Ministério da Educação) insistem que as crianças com deficiência devem estar na escola pública (a tal inclusão) e encerraram as escolas de ensino especial (localizadas nas IPSS). Ou seja, é tudo tratado de forma igual. Fará isto sentido? O que eu sei é que ao longo dos anos me relataram casos de crianças que se auto agridem, agridem professores, técnicos e alunos, passam o tempo na sala de aulas a gritar, professores e auxiliares não sabem como lidar porque não têm formação, não há acessibilidade para cadeiras de rodas, etc… Ou seja, não é para “ninguém”. Nem muitas destas crianças estão no espaço que precisam nem as outras aprendem. Faz sentido a escola inclusiva? Claro que sim, mas cada caso é um caso e estupidamente e por teimosia trata-se toda a gente por igual. Se é verdade que muitas crianças com deficiência devem estar em contexto escolar, já outras não faz qualquer sentido (a menos, claro, que a escola tenha as condições para tal – o que é uma raridade e com espaços próprios para corresponder às características e necessidades das crianças). Acresce dizer que os pais não têm qualquer possibilidade de escolha sobre o estabelecimento que o seu filho deve frequentar (escola pública ou para uma instituição/colégio, que reúna todas as condições para dar a resposta adequada às necessidades do seu filho).
A escola pública, em geral, é um falhanço (felizmente há muitas excepções), como quase tudo o que é público é um falhanço. Aliás, é apenas mais um exemplo de um País falhado. Em muitas escolas, desde há muitos anos, presenciei esta realidade e falo com pais que a viveram também e ainda vivem: não há papel higiénico, não há sabonete para lavar as mãos (durante a pandemia nunca faltou álcool gel, por sinal bem mais caro que sabão), muitos miúdos no final do dia saem das escolas aflitos para ir à casa de banho pois andaram o dia todo a aguentar, quer pelos motivos que referi, quer pela falta de higiene nas casas de banho das escolas. Muitos alunos reclamam e recusam-se a comer as refeições na escola dada a falta de qualidade. As escolas não têm dinheiro suficiente para cumprir a sua missão e sempre pediram, (continuam a pedir) aos pais que deem donativos mensais para ajudar a comprar material (os miúdos levam envelopes nas suas malas para entregar aos pais para este efeito). Os Governos só se preocupam em aumentar salários aos funcionários públicos. Podiam dar aumentos menores e não faltar dinheiro para a sua função básica. Ou seja, há que manter o equilíbrio com os recursos financeiros existentes e não faltar dinheiro para material. Mas não. Os escassos recursos que existem são só para salários e depois nada funciona. Se nós, no sector social e cuidados continuados, não cumpríssemos a nossa missão fechavam-nos a porta. Já o Estado pode falhar em toda a linha.
Como se isto não bastasse, muitos pais desesperam devido às greves constantes. No ano lectivo passado eram os professores, este ano lectivo são os assistentes operacionais. Todas as 6ªas feiras, religiosamente, há greve desde que o ano lectivo começou. 4 dias de aulas para 3 de descanso. No final quantos dias de aprendizagem ficaram a faltar? Que fazem estes pais à 6ª feira? Alguém se preocupa com isso? Onde está o direito à greve (abusivo) e os deveres? E os direitos dos outros que são altamente prejudicados? Onde anda a Constituição e o Tribunal Constitucional? A situação é ainda mais grave para quem tem filhos com deficiência devido aos cuidados especiais que necessitam, pois não há centros de Actividades para Tempos Livres (ATL) com pessoal especializado.
Para concluir, em 2021 o Ministro da Educação do PS veio dizer, com enorme satisfação, que um aluno na escola pública custava (e custa) mais ao contribuinte do que custaria numa escola privada. Que fazer? A resposta é, claro está, acabar com as escolas privadas. Óbvio, não é? Se são melhores e mais baratas, qual a dúvida do caminho a seguir? Afinal temos de continuar no caminho feliz de comer ideologia e de nos tornarmos a Venezuela da Europa.