Quando, em 2015, o Governo e os seus parceiros iniciaram uma cruzada contra os colégios com contrato de associação, sabíamos que haveria de chegar o tempo de uma fatura grande a pagar.

Para os que já não se recordam, estes contratos foram a solução encontrada pelo Estado para suprir deficiências na rede de escolas estatais então existente. Os alunos frequentariam escolas geridas por entidades particulares, a maioria sem fins lucrativos, em condições de acesso e frequência em tudo iguais à da escola pública estatal. O Estado não gastava mais do que tivesse de ampliar a sua rede escolar e os alunos estariam integrados num sistema de ensino em tudo equivalente aos seus colegas da escola pública.

Porém, em 2015-2016, o Governo pareceu esquecer os compromissos que assumira com os alunos e suas famílias, professores, pessoal não docente, toda a comunidade educativa dos colégios, que se viram obrigados a fechar ou a reduzir de forma significativa. Entre 2015 e 2021, com o encerramento de 1.251 turmas correspondentes a cerca de 31.275 alunos (uma média de 25 alunos por turma), 3130 professores de todos os ciclos de ensino e 1050 funcionários não-docentes ficaram sem trabalho, no maior despedimento coletivo até à data em Portugal. O embuste propagandístico era através dos cortes nos contratos de associação que o Governo financiaria os manuais escolares gratuitos. Nessa altura, as famílias sofreram uma pesada fatura pessoal e coletiva com a interrupção de projetos educativos sólidos e com resultados comprovados; uma fatura intangível de destruição de conhecimento e de património educativo. Mas, tal como na altura se disse, havia também uma fatura financeira a pagar pelos contribuintes. Soubemos agora qual o seu valor.

Há dias, o Ministro da Educação finalmente confessou quanto custava um aluno ao Estado e pudemos calcular com todo o rigor quanto custou ao Governo e aos seus parceiros terem decretado o fim dos contratos de associação: 66 milhões de euros por ano. Sim, o encerramento de 2.160 turmas em contrato de associação resultou não num corte de custos, não numa diminuição de despesa pública, não em poupanças para os contribuintes, mas sim em aumento de custos, aumento de despesa pública e em mais gastos para os contribuintes. Porque, como era evidente, os alunos retirados à força das suas escolas teriam que ir para algum lado.

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Nas escolas com contrato de associação – que têm regras de acesso iguais à da escola pública estatal – os diretores são gestores efetivos do dinheiro que recebem, competindo-lhes administrar de forma profissional as verbas públicas recebidas. Verbas essas que, objetivamente, são utilizadas em benefício dos alunos e das suas aprendizagens. Este modelo, virtuoso, permitia poupar dinheiro aos contribuintes e gerar resultados educativos assinaláveis. Em média, as escolas com contrato de associação custam menos ao Estado e oferecem melhor ensino aos alunos. Dizem-no os alunos, dizem-no as famílias, dizem-no os resultados nas provas e exames nacionais. Sabemos que hoje educar uma criança numa escola do Estado custa 6200 euros por ano. Qualquer encarregado de educação que tenha um filho numa escola privada sabe o quanto tem que trabalhar, e poupar, para pagar as mensalidades. Dividindo 6200 por 11 meses (o que se paga num colégio privado), o custo de cada mensalidade situa-se em 563 euros, cento e poucos euros abaixo do valor do salário mínimo nacional. Ora, esse valor, em média, num colégio privado, garante não só educação de qualidade, como provavelmente engloba atividades extracurriculares e/ou refeições. Esta realidade deve fazer-nos pensar. Em primeiro lugar, porque estamos a pagar uma fatura sem sentido decorrente do fecho de turmas em escolas com contrato de associação e abertura subsequente de turmas novas em escolas públicas estatais. Mudam-se as paredes, mudam-se os professores, mas não se garante melhor educação. Só se garante um aumento de custo. Por outro lado, quando vemos que o valor por aluno numa escola pública estatal é superior à média das propinas pagas nos colégios privados, e sabendo as diferenças que existem na qualidade de ensino e nos resultados entre estas duas realidades, perguntamo-nos, como contribuinte, qual a racionalidade das políticas públicas na gestão da oferta educativa em Portugal. Em nenhum outro país da Europa uma percentagem tão grande de famílias paga para que os seus filhos estudem no ensino secundário privado como em Portugal. Aliás, no centro e no Norte da Europa, e até na vizinha Espanha, abundam modelos semelhantes ao contrato de associação. Este modelo garantia para todos, mesmo os mais pobres, educação diferenciada e personalizada, projeto educativo com identidade, liderança, corpo docente estável e comprometido, autonomia e flexibilidade curricular… tudo aquilo que os portugueses que podem, procuram e pagam.

Quem paga, pode escolher. A elite socioeconómica junta-se e, junta, num casulo, o seu percurso educativo. O país andará, no espaço de uma geração, a duas velocidades totalmente distintas. A visão estatizante, preconceituosa e ideológica do setor da educação está a criar um problema social com consequências gravosas a prazo.

Por isso muitas vezes me pergunto: será que a racionalidade parece ter desaparecido de vez da política de Educação?

Caderno de Apontamentos é uma coluna que discute temas relacionados com a Educação, através de um autor convidado.