A abstenção foi a grande vitoriosa da noite. Muito superior à dos restantes países europeus. Apesar do voto em mobilidade que muitos agradeceram e aproveitaram (como eu). Por isso é na sua análise que está a chave para se perceber os resultados destas Europeias e se perspetivar o futuro.

Dos números acima pode-se concluir que o Chega perdeu 67% dos votos. Que os votos que sozinho perdeu representam mais de 1/3 do aumento da abstenção.

Que a IL foi a única a subir de votação (+12% dos votos) . Que a AD perde 34% dos votos que teve nas legislativas (28,7% do aumento da abstenção) e o PS 30% dos votos (24,6% do aumento da abstenção)

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A Esquerda foi menos abstencionista (37% dos que tendo votado nas legislativas agora se abstiveram) contra 63% da Direita.

A extrema-esquerda, apesar de ter perdido 35% apenas é responsável por 13,5% do crescimento da abstenção.

Ou seja, o crescimento da abstenção foi sobretudo à direita. Em especial do Chega.

Não houve transferência de votos entre partidos (exceto para a IL que terá ido roubar votos à AD e talvez ao Chega, e entre os pequenos partidos da esquerda que, ao repartirem um eleitorado comum, quase que não elegiam ninguém).

A AD não conseguiu mobilizar os seus eleitores para manter a votação das legislativas,  e era muito importante para de alguma forma legitimar a opção por um governo super-minoritário. Conseguiu mobilizar menos que o PS (e por isso perdeu para o PS) , mas provavelmente também perdeu votos para a IL. Um cartão amarelo para a estratégia de Montenegro. Isto apesar do muito que fez (ou prometeu) neste último mês – decisão do aeroporto, TVG para Madrid acordos com os professores, acordo com os funcionários do tribunais, baixa de IRS (sobretudo para os jovens e classe média baixa), o apoio à compra de casa para os jovens , o plano para a Saúde em menos de 2 meses, a reforma da lei da emigração (que pode ter contribuído para desarmar o Chega), o voto em mobilidade. A par da uma muito boa performance nas suas intervenções como primeiro-ministro, ou Presidente do PSD.

Ou seja, a discordância com a opção de um Governo minoritário, (e  algum mimetismo  dos governos de António Costa) quando o seu sentido de voto,  para o qual tinham ido votar muitos dos 640 000 eleitores que em Março votaram a AD,  era por um  Governo forte, de forte pendor reformista, apoiado solidamente pelas forças à direita do PS com a maioria da AR), será a única razão que se encontra para não terem querido perder tempo a ir votar (quando este ano era tão fácil votar em qualquer sítio).

É certo que Montenegro , por prudência, nunca arriscou fazer destas eleições um plebiscito à sua opção.

Mas foi um cartão amarelo, que ditou que o PSD ficasse atrás do PS, e que certamente agravou ainda mais as condições parlamentares, no qual Montenegro precisa de refletir.  Embora no seu discurso, no fim das eleições, Montenegro não tenha apontado para aí. Apontou para privilegiar o PS como parceiro a negociar e a promessa de apoio a António Costa para Presidente do Conselho Europeu.

Disse, ipsis verbis, em, resposta às duas questões de Rita Tavares do Observador :  “O governo e a Aliança Democrática estão disponíveis, desde a primeira hora, para dialogar, negociar encontrar consensos com todas as forças politicas, mas naturalmente que dentro delas, aquela com quem temos muitas vezes necessidade de aprofundar mais essa diálogo e essa negociação é o Partido Socialista, em tudo o que foi relevante  das decisões do governo nomeadamente aquelas que carecem também de pronúncia parlamentar, abrimos sempre canais de diálogo direto com o partido socialista”.

O partido popular europeu é o vencedor das eleições a nível dos 27 estados membros da União Europeia… é possível que a presidência do Conselho Europeu seja destinada a um candidato Socialista. Se o dr. António Costa for candidato a esse lugar. a Aliança Democrática e o Governo de Portugal, não só apoiarão como farão tudo para que essa candidatura tenha sucesso (quando a jornalista fez a pergunta os militantes do PSD fizeram um bruá, mostrando a sua pouca vontade neste apoio. Mas Luís Montenegro fê-los calar e confirmou o apoio).

O Chega foi de longe quem perdeu mais votos nestas eleições em relação às legislativas: 67% . Não terá perdido votos para a AD mas sim para a abstenção e alguns para a IL.

Várias causas terão contribuído para esta hecatombe: Mau candidato? Grupo europeu problemático com apoiantes de Putin? Desinteresse dos temas europeus dos eleitores no Chega (que tinha nas legislativas tido o pior resultado na cidade de Lisboa e do Porto)? Desmobilização da máquina interna do Chega quando os fiéis de sempre” são preteridos e ultrapassados por “paraquedistas” de outros partidos?

Cartão amarelo à Cheringonça? Se é certo que Luís Montenegro é o responsável pelas linhas vermelhas e por publicamente fazer questão de não passar cartão ao Chega (ao contrário do que se propõe com o PS), a verdade é que André Ventura não soube encontrar a melhor forma de se libertar da armadilha. Ao passar a considerar o PSD como o inimigo a abater desaponta os seus eleitores que apostam numa coligação ampla à direita do PS, como atrás se referiu.

Perdeu a hipótese de ir buscar aqueles que nas legislativas pensavam votar Chega e à última da hora resolverem votar AD para dar a Montenegro a hipótese de ficar à frente e governar sem controvérsias. Uma subida do Chega e uma descida da AD daria um sinal de como se interpretar os resultados das legislativas.

Assim, esses votos ou foram para a abstenção ou para a Iniciativa Liberal.

Ao se abster sucessivamente nas propostas do PS, viabilizando-as deste modo, não só desagrada ao seu eleitorado como dá razão a uma frase dita ontem por Pedro Nuno Santos “ Se não contarmos com o Chega a Esquerda tem a maioria”. As pessoas riram-se desta frase, mas ela é certeira. Se o Chega se continuar a abster o Chega não conta e a Esquerda ganha. Montenegro e Ventura precisam de meditar nisto.

E não podem esquecer que, de momento, o saco de eleitores que podem ser mobilizados da abstenção para uma eleição nacional estão na bolsa do Chega. Assim o Chega consiga recuperar a sua confiança. Se não, acaba como o PRD.

O PS também precisa de meditar.

Perdeu 33,69 % dos votos em relação às legislativas, é certo que pouco menos que a AD, e por isso ficou à frente, mas cabia-lhe provar que as eleições de Março tinha sido um desaire pontual- E não só o não conseguiu como não tem como quem fazer maioria, uma vez que toda a esquerda continua a ser minoritária (se a direita contar com o Chega)

PNS tem que decidir, se considera que o Chega deve ficar fora do arco da governação e, havendo maioria à direita deixa a AD governar sem precisar do Chega (como o fez o PSD em relação ao PCP- Marcelo, Ferreira Leite e Pedro Passos Coelho -enquanto foi possível), sem, ele, PNS, se aproveitar dos votos Chega. Ou considera que o Chega é um partido democrático como os outros e acaba com esta farsa do Papão Chega, de que tanto se tem aproveitado.

Não pode também dizer-se de braços abertos para negociar com o Governo e logo a seguir dizer que não abdica uma vírgula das suas propostas e recorrer ao Chega para as fazer aprovar no parlamento contra o Governo. Os estados gerais do PS anunciados por PNS é uma boa ideia. Mas enquanto o PS se prepara precisa de deixar o Governo da AD governar.

A IL foi a grande vencedora da noite: Graças à excelência do seu candidato, Cotrim de Figueiredo, e das suas propostas a apontarem para o desenvolvimento económico da Europa. Aproveitou também os votos dos que não quiseram votar na versão atual do Chega nem na AD de Luís Montenegro.

A questão é : como vai Luís Rocha aproveitar os votos que teve agora? Aproximar-se à AD? Tentar ser um fiel da balança? Manter o seu isolamento esperando crescer em cada eleição?

Enquanto o PCP está cada vez mais reduzido aos sindicatos da função pública da CGTP, Bloco de Esquerda e Livre ou fazem uma fusão, ou um qualquer acordo, ou ficarão irrelevantes. Até porque a juventude já virou de campo…

Com estes resultados e declarações dos atuais dirigentes partidários, sem possibilidade de se entenderem e fazer uma maioria de governo, estamos, ao fim de 50 anos, a assistir ao esgotamento do atual sistema parlamentar.

Ou os partidos se entendem para governar e fazer as reformas necessárias, ou, à falta de alternativa, iremos, ainda dentro do que a constituição permite, evoluir para um Sistema mais presidencialista: ” Um Presidente uma Maioria”.