Nuno, no último dia em falámos foi no funeral do nosso tio. Meu tio por laços de sangue, teu por uma afinidade distante, e porque “sempre te sentiste parte desta família”, como me disseste nesse dia. Na verdade, eras sobrinho de um tio por afinidade, mas nesta nossa família imensa sempre houve lugar para todos. E cada um, mesmo que mais afastado, sempre se sentiu parte do todo.
Acho que nos cruzámos menos de uma dezena de vezes na vida. Recordo, contudo, a tua afabilidade e o sorriso aberto. Reencontrámo-nos há poucos meses no funeral do “nosso tio”. Partilhámos memórias sobre o meu avô e o meu pai. Rimo-nos sobre histórias antigas da família. Ambos lamentámos que esta geração, a dos nossos pais, estivesse a partir. Contudo, ultrapassando a casa dos 50 anos, já aprendemos a lidar com a perda antecipada, pois é a inexorável lei da vida. Na realidade, os dias do velório e do funeral de um ente querido idoso, constituem uma oportunidade de reunião familiar. Podemos falar sobre tudo e sobre nada. Podemos rir e chorar. Naqueles dias abraçamo-nos e permitimo-nos dar e receber o amor e carinho dos outros, muitas vezes de quem estamos afastados pelo tempo e pela distância.
Nesse dia falaste-me vagamente de um qualquer problema de saúde, um exame que terias de fazer. Estavas bem disposto e com um ótimo estado geral. Eu e tu estávamos bem longe do que se seguiria nos meses seguintes. Apenas quatro meses depois aqui estamos nós reunidos, desta feita para te acompanhar na última viagem.
Venho para casa a pensar sobre a imensa fragilidade da vida e sobre como cada um de nós se considera imortal. Aceitamos a morte dos idosos, mas ninguém está preparado para morrer antes do tempo. Penso na minha própria mortalidade e no significado da vida “ se eu morrer em menos de 6 meses, o que quero fazer agora?”. A reposta é que não sei, nunca planei a tão curto espaço de tempo.