Nesta época de pandemia fala-se muito em saúde e em recursos para a saúde. Fala-se de enfermeiros e fala-se de médicos. Fala-se ainda mais de medo, ou melhor, fala-se pouco de forma directa, mas espalha-se muito nas entrelinhas das notícias e do distanciamento social. Porque as pessoas afastam-se umas das outras por medo.

Por medo, impõem-se medidas e restrições. Por medo, isolam-se pessoas. Por medo, forçam-se equipas de saúde a trabalhar em condições duras fisicamente, mas, principalmente, duras em termos psicológicos.

Aquilo que permanece escondido é o impacto real do medo na saúde mental, não apenas dos cidadãos, mas também dos profissionais de saúde, médicos, enfermeiros, analistas, radiologistas, auxiliares de acção médica.

E o impacto nos professores? A quantidade de professores aterrados por terem de dar aulas num meio onde o vírus é visto como altamente propagável. Muitos a sentirem-se forçados a dar aulas a jovens que são diabolizados, representados na comunicação social como sendo irresponsáveis. Muitas das vezes a servirem de desculpa, representando eles o medo de quem cria as medidas e as implementa.

Do que não se fala é da Psicologia na gestão do medo e do seu papel na gestão da comunicação que é feita à população. Do que não se fala é da presença dos psicólogos no apoio às tomadas de decisão sobre os planos de contingência e a gestão da crise pandémica. Do que não se fala é de uma intervenção organizada na prevenção da saúde mental nos principais sectores alocados à resposta a esta pandemia, no cuidado com as pessoas, profissionais e utentes que deles fazem parte.

Exceptuando a Linha de Apoio Psicológico, apregoada aos sete ventos pela Direcção Geral de Saúde e pela Ordem dos Psicólogos Portugeses, e as inúmeras linhas de apoio psicológico que foram criadas por sociedades científicas e faculdades, nada se fez. A Linha de Apoio Psicológico é um paliativo. É uma intervenção em crise que não intervém na promoção da saúde, mas apenas na estabilização de uma pessoa que recorre à linha porque já entrou em desequilíbrio.

Onde é que estão as intervenções de continuidade? Onde estão as intervenções de promoção da saúde junto dos profissionais que estão em desgaste? Onde estão as equipas ou projectos criados conjuntamente com as outras Ordens da Saúde, ou com os diversos ministérios (Saúde, Educação, Justiça) para intervir junto da população de risco constituída por médicos, enfermeiros, professores?

Do que não se fala é de uma verdadeira intervenção psicológica e numa perspectiva de prevenção em saúde mental. O que não se discute é como promover a saúde junto de recursos humanos escassos.

O que não se discute é a possibilidade da Psicologia ser chamada a intervir na gestão emocional, na gestão de equipas numa perspectiva de prevenção do burnout e da implementação de estratégias geradoras de bem-estar junto de recursos humanos que estão a ser fortemente requisitados. Quem cuida daqueles que cuidam? Quem está lá para ajudar a reenquadrar e promover novas perspectivas de equilíbrio, regulação e auto-cuidado?

Este é um problema que tem de ser encarado de frente, com a seriedade de quem não foge aos assuntos. Não há psicólogos suficientes nas escolas, nem no sistema nacional de saúde para poderem implementar estes projectos. Não chegam para a população para a qual foram contratados para servir, como os alunos, os utentes dos centros de saúde e dos hospitais.

Se as ordens da Saúde se unissem na procura de soluções, se os ministérios reunissem com os psicólogos, se a Ordem dos Psicólogos propusesse planos de intervenção, alguma solução financeira haveria de surgir através de financiamentos europeus, fundos de investigação, mecenas. Há soluções, se tivermos a vontade de agir e de as procurar, com base no conhecimento da realidade, na procura de sinergias e na vontade de ir mais longe!

Acredito que a Psicologia e os psicólogos têm muito a contribuir na manutenção e melhoria da saúde mental e que neste cenário pandémico pode trazer novas soluções. Assim promovam a inovação e a rentabilização de recursos, assim protejam os recursos humanos deste país. O discurso de medo nunca foi bom conselheiro e nunca levou à criatividade necessária para encontrar novas soluções.