A maior parte das pessoas acha que as classes lazeirentas se distinguem das classes não lazeirentas porque, como disse um bruto com brutalidade, têm mais dinheiro. A intuição comum sustenta que as classes lazeirentas gastam o seu dinheiro em diversos ócios porque sentem prazer com eles, e porque naturalmente têm dinheiro para esses ócios. A teoria da classe lazeirenta, pelo contrário, provou cientificamente que as classes lazeirentas gastam o seu dinheiro em ócios para que possam ser reconhecidas como classes lazeirentas pelas outras pessoas. A teoria postula que o lazeirar não se deve a nenhuma apetência particular pelo ócio ou pelo prazer daqueles que lazeiram, mas à apetência de terceiros pelo seu lazeirar, e à apetência dos lazeirentos pela ideia de serem reconhecidos por terceiros.

A teoria da classe lazeirenta sustenta que ao equilíbrio das coisas e à felicidade geral é essencial que todos possam ter acesso a imagens agradáveis: os lazeirentos, a imagens de si próprios a lazeirar; e os terceiros, a imagens dos lazeirentos a produzir imagens de si próprios. Torna assim compreensível que exista um número escolhido de lazeirentos ao serviço da felicidade: da sua, bem entendido, e da dos outros, bem entendida. A ordem dos lazeirentos mata um arminho com uma única cajadada: serve regularmente o público com a ideia de que há pessoas diferentes do público, a saber, os membros das classes lazeirentas.

Parecerá a muita gente improvável que em banheiras cheias de leite de burra até aos bordos se ocultem os últimos franciscanos, animados por aquilo que no fundo é a consciência séria de uma missão. Existem razões para essa desconfiança, que se devem porém a uma noção limitada do serviço público. Não há razão para que um serviço público não possa ser bem exercido por um pequeno esquadrão de pessoas ocupadas a casar-se, a manifestar indignação, a começar a comer, a comprar opalas, a ler a sua autobiografia, em posições de descanso, e a sair e entrar do avião.

A teoria da classe lazeirenta explica o aparecimento de uma ordem de lazeirentos abnegados, a pingar leite de burra, que se dedicam a fazer coisas para que, à base das suas aventuras, a sua felicidade possa ser melhor conhecida do público. Não considera todavia o preço que os membros dessa pobre ordem pagam pelo seu serviço. Como serão suscitadas as suas vocações? Haverá violência familiar na sua origem? Sentir-se-ão satisfeitos com o que fazem? E, mais importante de tudo, como serão os lazeirentos em privado, nos intervalos do seu múnus? Serão, como alguém sugeriu, moles e cínicos? Não é de excluir que fora das horas de expediente os membros das classes lazeirentas possam ser iguais à gente que ajudam; que queiram apenas que os deixem descansar em paz num parque de campismo do interior, de boca aberta e sem sentir nada de especial.

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