Não gosto, e essencialmente nunca gostei, de Donald Trump. Ele não possui a postura nem a educação que se esperam de um líder do “mundo livre”. Falta-lhe o que, em bom português, chamamos de “chá”, e é difícil não sentir vergonha alheia nas suas frequentes intervenções “presidenciais”. No entanto, o mais preocupante é o culto de personalidade que ele conseguiu construir em torno de si. Isso, para mim, é inaceitável e imperdoável numa nação que se orgulha de ser a mais antiga república do mundo.

A verdade é que Trump alcançou uma vitória histórica. Pela primeira vez em vinte anos, um Republicano venceu com maioria no voto popular. E, pela segunda vez na história dos Estados Unidos, um Presidente conquistou um segundo mandato não consecutivo — a primeira vez foi Grover Cleveland, em 1892. Perder a reeleição foi o fim da carreira política para figuras como George H. W. Bush, Jimmy Carter e tantos outros. Raramente um candidato presidencial tem uma segunda oportunidade nos Estados Unidos. O último foi Adlai Stevenson, em 1956. O fenómeno que vemos agora é nacional, de costa a costa.

Observando o mapa eleitoral, torna-se difícil identificar zonas onde Trump não obteve ganhos significativos. A Florida, que era um “swing state” em 2020, votou mais expressivamente em Donald Trump do que Nova Iorque votou em Kamala Harris. Trump conquistou o voto suburbano, alcançou o melhor desempenho histórico para um Republicano junto ao eleitorado hispânico e venceu em todos os “swing states”. A esmagadora maioria dos votos jovens a favor dos Democratas (60% em 2020) foi diluída, tanto entre homens como mulheres, a favor da direita.

Pessoalmente, considero-me um conservador. Contudo, a direita populista não deve, nem pode, ser confundida com a direita conservadora. Partidos que nunca governaram, e que demonstram um total desrespeito pelas instituições — sejam elas quais forem —, não representam uma tradição política com raízes em Edmund Burke e Joseph de Maistre. Há um cancro na res publica ocidental, um problema no corpo político em que vivemos, que leva as pessoas a acreditarem que vigaristas, sem experiência ou competência, vão magicamente resolver problemas acumulados por décadas de políticas falhadas. Um eleitorado que aceita a promessa populista de “vota em mim e todos os teus problemas desaparecerão” é um eleitorado que perdeu por completo a confiança na política tradicional e nos partidos democráticos.

Os problemas e preocupações dos eleitores são válidos e devem sempre ser reconhecidos como tal. A política existe para ouvir o eleitorado e resolver os seus problemas sem preconceitos ou sermões. As eleições americanas deste ano mostraram que os eleitores preferem votar num homem que foi demonizado durante mais de uma década, mas que fala sobre os problemas reais do país, em vez de apoiar uma candidata que os insulta e age como se tivesse um direito adquirido aos seus votos.

Devemos tirar lições desta eleição americana para evitar que fenómenos semelhantes se espalhem para o nosso país. O primeiro passo é ouvir as pessoas, entender o que realmente importa, e não catalogar cerca de um quinto do eleitorado, que tem optado pela versão portuguesa de Trump, como “fascistas e radicais de direita”. Assim se repetiria o erro cometido pelos Democratas americanos. A solução passa por apresentar ao eleitorado uma alternativa realista e pragmática, que enfrente as suas preocupações sem rodeios. A melhor forma de combater a demagogia em temas como imigração e crime é resolver esses problemas, e não fingir que eles não existem.

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