Calhou ser dia de S Agostinho, o meu último dia de férias. Não deixa de ser original  escrever sobre as férias no dia em que elas acabam, e não quando estou no começo delas – do género, “hoje começo blá, blá, blá “.

Dizem que Setembro é um mês de recomeços, e é mesmo verdade. Hoje levo comigo imensos recomeços, que aqui vou partilhar. São intencionalidades  vazias que espero ajudar-me a preencher.

Intencionalidades? Sim, a palavra é clássica, de antes de Cristo, vem de Aristóteles: “ a inteligência é de certo modo todas as coisas”. Trocado por miúdos, enquanto as outras coisas são uma espécie de câmara vazia, eu, pelo contrário tenho uma câmara onde posso registar tudo. O passado, o presente, o futuro, tudo o que há no céu e na terra.

S. Tomás de Aquino, já no século XIII, deu lhe uma volta e “batizou-a”…

Mas foi preciso o século XX para Husserl vir a descobrir o poderio da intencionalidade. Inaugurou um novo método de pensar, a fenomenologia, que, ancorado nas elasticidades da intencionalidade, deu carta branca à filosofia…

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A Fenomenologia é também uma das minhas praias. E uma das mil coisas que levo das férias na Praia Grande é uma leitura “como deve ser” de um dos livros básicos  de Robert Sokolovski, o meu professor polaco que conheci em Washington, por quem me apaixonei, ao ouvi-lo discorrer sobre os ricos e rigorosos documentos do pai desse novo  movimento filosófico.

Nesse livro que agora retomo, ele não se limita a dizer o que os filósofos dizem sobre o que é a fenomenologia, mas “faz” fenomenologia. Sokolovski faz assim  como os matemáticos, que começam por partir do já adquirido em matemática, e avançam, não se limitando – como fazem muitos filósofos –  apenas a dizer o que os outros filósofos pensaram.

E agora? Que intencionalidades são essas que carrego com tanto entusiasmo?

Sao intencionalidades  vazias que – acrescentei acima – espero ajudar-me a preencher. Ajudar-me? Sim, as minhas intencionalidades de fazer  isto e aquilo, assim e assado, dependem essencialmente de mim. O passarem de intencionalidades vazias a intencionalidades realizadas (“empty” versus “ fulfilled”), quero dizer.

Levo no saco de regresso das férias  os livros lidos, os livros lidos a metade, as prendas para os “miúdos “ (que já não regressam comigo no banco de trás, como dantes, mas se encontram noutras vidas…), a Vogue espanhola, anotada, com as tendências 2024 – 2025, e não apenas  no que respeita à moda (novidades do Almodóvar que já digo…), a Agenda anual que veio comigo mas que também descansou e agora está desejosa de receber a escrita das minhas duas Lamys, e os lápis afiados que vieram e agora voltam encolhidos pelo muito trabalho que tiveram. Algum terá ficado perdido na areia…

Ainda no saco o livro de Notas deste ano, concluído e agora a ser continuado no novo livro de notas , que começo para a semana. Anotar é essencial para avançar tendo em conta a experiência feita, sem esquecer.

Vai no saco o novo ano que espera por mim. Onde espero não me adiar  – não me posso esquecer de me realizar, cada dia, to the full, tipo depósito cheio, assim esteja viva, ou se doente, que o mal não me paralise.

São inúmeros projetos culturais, de entre os quais finalmente escrever o livro sobre o Manoel de Oliveira. E, falando de cinema, vou ver já daqui a dias a estreia do documentário sobre o Luís Miguel Cintra, e em Outubro o novo trabalho de Almodôvar, que vai dar muito que falar por abordar um tema fraturante, e por ser de Almodôvar…

Em modo de conclusão, e para responder à pergunta em epígrafe, “E agora? “, acrescento que continua para mim essencial  um ditado nosso “não deixes para amanhã o que podes fazer hoje”, passando assim a batata quente para a necessidade de estabelecer as prioridades do meu fazer.

Nos vastos campos das memórias do passado, das intuições do presente e da antecipação do futuro, é na sua intencionalidade que olho e sinto cada dia que nasce!