O executivo da Câmara Municipal de Gaia anunciou, recentemente, a sua intenção de suspender, por um período de 6 meses, a atribuição de novas licenças para a atividade de Alojamento Local, como forma de mitigar os problemas de acesso à habitação no concelho.

Para quem já teve a oportunidade de analisar o documento do Observatório Social de Gaia, disponível online, na sua 90a edição dedicada aos Censos de 2021, rapidamente percebe a falácia desta medida e a sua aplicabilidade para fins meramente de regozijo ideológico.

O Alojamento Local, atualmente com 1271 licenças atribuídas, representa cerca de 0,9% do parque habitacional do concelho e está concentrado essencialmente nas freguesias de Santa Marinha e São Pedro da Afurada (651), 51% do total das licenças.

Se não bastante, o enorme impulso que a atividade turística teve na reabilitação de edifícios e quarteirões degradados na zona histórica do município, bem como os enormes dividendos do setor do turismo, atividade que emprega uma franja importante da população e da qual a própria câmara recolhe uma importante receita, sob a forma de Taxa Turística, que só em 2022 rendeu 605 mil euros.

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Porquê atormentar agora, uma atividade que tantos proveitos tem trazido para a economia do concelho? Sob qual desígnio e alicerçado sob que fundamento?

A nova construção em Vila Nova de Gaia está nos níveis mais baixos das últimas décadas, sendo que as habitações construídas na última década são apenas 2,6% do parque habitacional e representam um valor inferior às habitações existentes no município anteriores a 1919.

A tendência da última década (2011 a 2021) demonstra que o total dos alojamentos para Residência Habitual aumentaram de 79,9% para 84,1% e que houve um decréscimo acentuado nos alojamentos vagos (12,5% para 9,4%) e para habitação secundária (7,6% para 6,65%).

Parece, pois, óbvio, que a oferta de habitação é cada vez mais diminuta e que a prioridade, neste momento, deveria passar por garantir que existe oferta de habitação em quantidade, para desta forma potenciar um mercado concorrencial, capaz de dar resposta ao crescendo de procura, num concelho que viu crescer a sua população residente nos últimos 10 anos em 1556 pessoas (+0.5%).

A CMG tem um objetivo ambicioso em curso, de compra e/ou construção própria de habitação acessível, com uma dotação de até 70 milhões de euros, que foi altamente propalado na comunicação social, mas que urge agora questionar: ao final de um ano e já depois de duas ofertas Públicas de Aquisição, quantas habitações foram já adquiridas e entregues às famílias no âmbito do Programa 1o Direito?

Antes de usar o subterfúgio de suspender novas licenças de Alojamento Local pode o executivo camarário garantir que foi feito tudo ao seu alcance para, por exemplo, no que concerne à redução das taxas urbanísticas, impulsionar a nova construção?

Pode a Câmara Municipal afirmar que os procedimentos internos da Gaiurb já são ágeis o suficiente para que, no prazo legal de 30 dias, todos os pedidos de licenciamento recebam uma resposta conclusiva?

E a articulação entre empresas municipais, como as Águas de Gaia e Gaiurb, que por vezes demoram meses a decidir, entre si, para a simples autorização de instalação de um novo contador de obra, já está dirimida?

Nas freguesias do concelho com menor pressão imobiliária, nomeadamente as freguesias do interior, algumas que inclusive perderam população residente na última década, esgotaram-se já todos os esforços para as dotar de uma rede de transportes e mobilidade adequados, de forma a que se tornem apelativas para uma jovem família aí decidir estabelecer-se?

Não há habitação, mas o tanto que já se diz feito, está já, mesmo feito?