Estamos no ano de 2050, na Era Digital.

Vivemos em smart cities, onde tudo está interconectado através da internet das coisas (IoT).

As taxas de criminalidade baixaram drasticamente.

Existem câmaras de vigilância (CCTV’s) em todos os cantos, altamente equipadas com a mais avançada tecnologia de reconhecimento facial, bem como com sistemas sensoriais inteligentes. Drones e robôs-polícias humanoides baseados em inteligência artificial (IA) a patrulhar as ruas e os edifícios. Tudo diretamente connectado.

As universidades foram substituídas por colégios de IA. A maioria das organizações não tem, sequer, trabalhadores ou espaços físicos, sendo autónomas e baseadas em IA.

Os negócios são todos digitais, no âmbito do metaverso, desenvolvidos por empresas artificiais.

Já não existem profissionais relacionados com trabalho físico e as profissões que requerem a inteligência humana são cada vez mais escassas. São os robôs industriais baseados em IA que produzem tudo.

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As pessoas que já não trabalham, que representam a esmagadora maioria, recebem um rendimento básico único, providenciado pelo Estado.

Esse rendimento é pago em moeda digital de banco central (CBDC), sendo essa a única moeda com curso legal.

As pessoas que ainda têm trabalho, exercem atividades no âmbito de negócios digitais no metaverso, a partir de casa, onde passam praticamente todo o seu dia (e noite). Os locais de trabalho são todos digitais.

O metaverso está cada vez mais desenvolvido, sendo cada vez menor a linha que separa a realidade virtual (VR), a realidade aumentada (AR), a realidade mista (MR) e a realidade extendida (XR).

O mesmo sucede com a linha que separa a realidade física da realidade digital.

Nas tarefas diárias, somos assistidos por tecnologias portáteis e vestíveis (em muitos casos invisíveis) ou mesmo por robôs domésticos humanoides baseados em IA.

Nas decisões que tomamos, somos assistidos pela IA através de assistentes de voz ou mesmo através de tecnologia de interface neural para fundir a consciência humana com inteligência artificial.

Em geral, cada vez que as pessoas estabelecem uma conexão com o metaverso, é iniciada uma ligação neural.

A interação sensorial digital fez com que as pessoas se sentissem cada vez mais confortáveis ligadas ao metaverso, sendo essa a realidade que as novas gerações melhor conhecem.

A verdade é que não existem muitas oportunidades para conhecer outra realidade.

Como consequência desta vida digital, as pessoas encontram-se rodeadas de câmaras, microfones e sensores. Inclusive desde a nascença, pois o desenvolvimento embrionário ocorre exclusivamente através de incubadoras artificiais.

Aliás, muitas pessoas optam por criar e cultivar relações afetivas ou amorosas com robôs domésticos humanoides baseados em IA.

Os próprios animais domésticos foram substituídos por animais artificiais.

É tudo artificial.

Acresce que a circulação encontra-se bastante limitada, essencialmente devido às políticas climáticas e de sustentabilidade. Existem confinamentos periódicos durante o ano, com vista a mitigar o alegado impacto ambiental causado pelas pessoas.

Os meios de transportes são autónomos e extendem-se a praticamente todo o território. Porém, existem apenas transportes públicos e veículos para aluguer. Em geral, as pessoas não possuem veículo próprio.

Fruto das tais políticas climáticas e de sustentabilidade, a propriedade privada foi abolida há vários anos e, hoje em dia, tudo é um serviço. Inclusive a propriedade imóvel.

Quem não respeitar estas regras, vê os pontos do seu crédito social descerem, o que pode limitar ainda mais a sua circulação.

O crédito social das pessoas é baseado no seu comportamento pessoal, social, ambiental e profissional, e até nas opções políticas.

Para viajar ou, sequer, sair de casa, é necessário ter crédito suficiente. Já não existem passaportes ou cartões de cidadão, apenas o certificado de identidade digital.

No caso de a luz de acesso à via pública ou ao transporte público sinalizar vermelho, nada há a fazer, senão voltar para casa, pois não vale a pena reclamar com robôs…

Quem não respeita as regras, pode ainda ser automaticamente penalizado, sendo a sua conta bancária de moeda digital bloqueada ou os fundos relativos à respetiva coima imediatamente retirados. Imposições de limites de compras (consoante o tipo, valor ou mesmo quantidade) podem também servir de penas acessórias.

A implementação da moeda digital tornou a aplicação coerciva automática de coimas via suspensão, limitação e retirada de fundos literalmente possível e, ao mesmo tempo, a evasão/ fraude fiscal ou o branqueamento de capitais praticamente impossível.

Com exceção do compartimento, em espaço público ou privado, dotado de equipamento próprio para a satisfação de necessidades fisiológicas e de cuidados de higiene (também conhecido por casa de banho ou WC), a conduta das pessoas é vigiada e avaliada em qualquer local, inclusive em casa. Inclusive na utilização de palavrões.

Os nossos próprios pensamentos não estão a salvo, pois quando nos conectamos ao metaverso e ativamos a tecnologia de interface neural, tornamo-nos um livro aberto.

Mais do que isso, tornamo-nos eventuais alvos de manipulação mental e de brain hacking. Nunca foi tão fácil alguém plantar ideias ou mesmo ideologias na nossa cabeça. Literalmente.

Como é que sabemos que ainda comandamos o nosso próprio processo psíquico consciente? Ou melhor, como sabemos que o nosso próprio estado prévio insconsciente não está a ser manipulado?

De volta ao ano de 2023. É este o futuro que andamos (in)consciente e coletivamente e construir?