Em 12 de março de 2020, um ucraniano foi morto no aeroporto de Lisboa.

Muitas pessoas, cujas responsabilidades profissionais incluem proteger a vida, a saúde e os direitos humanos, viram Igor Homenyuk, algemado e a morrer. Ele estava a morrer por um “crime” que era procurar um emprego noutro país.  Um trabalho honesto.

A sua morte não causou um boom global de informações, protestos em massa, lojas saqueadas, etc.

A sua morte não se enquadra em nenhuma categoria de discriminação “popular”.

Ele era um cristão desinteressante e um bom homem de família que tinha a responsabilidade de garantir o futuro dos seus filhos. Ele era um dos milhões trabalhadores migrantes que existem agora no mundo.

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Vivemos num mundo pervertido, onde aqueles que tentam ser honestos não são interessantes para o feed de notícias não se tornando heróis a seguir.

Neste caso em particular, não há evidências de que o Igor tenha morrido por ser ucraniano, por ter uma cor de pele diferente ou por ter uma religião diferente. Até ao final da investigação, não sabemos a causa da sua morte.

Não existem países no mundo onde não haja casos de abusos da força policial, banqueiros que não usem a sua posição oficial para desviar dinheiro da conta de alguém para a sua e onde funcionários públicos não recebam subornos para resolver algum assunto.  Crimes de abuso de poder não têm fronteiras ou nacionalidades. A resposta da sociedade a estes crimes é crucial. É esta resposta que constrói um estado de direito e responsabiliza todos os membros da sociedade.

Eu vivo em Portugal há vinte anos. Eu sou imigrante e sei o que Igor sentiu quando foi procurar trabalho fora da sua terra natal. Milhões sabem o que Igor passou. Ucranianos, portugueses, brasileiros, cabo-verdianos, todos aqueles que, por causa das desigualdades econômicas globais, estão à procura de oportunidades de trabalho honesto. Por causa disto tivemos que suportar humilhação, mal-entendidos, enganos e salários mais baixo.

Mas como imigrante, estou convencido que não é através de manifestações violentas e distúrbios na via pública que se resolve o problema da imigração e os problemas sociais que daí advém.

Nós ucranianos já vivemos no século passado em 1917 uma revolução de sangue e violência que ceifou milhões de vidas inocentes e interrompeu o desenvolvimento cultural e económico de muitas nações e foi a principal causa da imigração em massa de ucranianos para todo o mundo.

Nós ucranianos não culpamos os portugueses pela morte do Igor. Recebemos centenas de cartas de portugueses, brasileiros e organizações solidárias com palavras de pesar e apoio. Todos nós, ucranianos, portugueses e todos os imigrantes que vivem em Portugal, estamos chocados com o que aconteceu e procuraremos uma investigação justa, mas não queremos utilizar a violência e fazer com que os partidos políticos utilizem estas situações para seu proveito partidário. Violência só gera violência

O que eu vou fazer é imprimir a foto de Igor e colocá-la ao lado de meu documento de identificação assim cada vez que eu passar a fronteira ou visitar os serviços de migração lembro aos funcionários o que aconteceu em 12 de março de 2020 no aeroporto de Lisboa.