Há constatações que devem ser reforçadas. Uma delas é que o planeta está a aquecer. Com um consenso superior a 99%, é amplamente aceite pela comunidade científica, que o atual aumento da temperatura média global é consequente das emissões de gases com efeito de estufa (GEE) provocadas pelas atividades humanas, nomeadamente, através da queima de carvão, petróleo e gás natural1.

Vamos a números?

O último Relatório do Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA), emitido em 2023, confirma que se registaram novos máximos de emissões de GEE e novos recordes de temperatura. Adicionalmente, este Relatório alerta também que, com base na aplicação dos atuais planos climáticos dos diferentes países, isto é, as Contribuições Nacionais Determinadas (NDCs), o planeta poderá aquecer entre 2.5ºC a 2.9ºC ainda neste século. Recorda-se que o Acordo de Paris, adotado em 2015, tem como objetivos limitar o aumento da temperatura média global a níveis bem abaixo dos 2ºC (acima dos níveis pré-industriais) e prosseguir esforços para limitar o aumento da temperatura a 1.5ºC2.

De acordo com o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC), prevê-se que os fenómenos extremos relacionados com o clima serão cada vez mais frequentes e graves, podendo assim afetar vários setores de atividade (p.ex., setor agrícola), com consequentes perdas económicas. Por conseguinte, embora seja incerto, é pouco provável que estas perdas económicas associadas diminuam até 20303.

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Para analisarmos a origem das perdas económicas, é útil refletir como pode a despesa dos governos e das organizações variar em função de pelo menos dois cenários alternativos: o “cenário da ação climática” ou o “cenário da inação climática”.

O “cenário da ação climática”, através das exigências regulatórias e da disrupção do mercado e tecnologia, poderá gerar potenciais impactos financeiros, tendencialmente, a curto prazo, e apenas caso haja uma reorientação do capital para planos climáticos que permitam cumprir os objetivos do Acordo de Paris.
Exemplos de efeitos financeiros incluem o aumento dos custos de operação, a redução da procura de bens e serviços devido à alteração das preferências dos consumidores e os custos de nova tecnologia baixa em emissões.

O “cenário da inação climática”, através de mudanças progressivas do clima (p.ex., stress hídrico) ou do aumento de eventos climáticos extremos (p.ex., incêndios), poderá gerar potenciais impactos financeiros, a médio-longo prazo, particularmente, caso a temperatura média global exceda os 2ºC.
Exemplos de efeitos financeiros incluem a desvalorização de propriedades ou ativos com risco climático elevado, o agravamento do prémio do seguro de ativos e o aumento do custo de capital.

Mas se ambos os “cenários” têm impactos na economia, existirá um que seja considerado “menos mau”?

Em teoria, sim. De acordo com a resseguradora Swiss RE, a atual trajetória de aumento da temperatura poderá contribuir para a uma perda de valor económico global até 10%, superior à prevista nos objetivos do Acordo de Paris. Num cenário mais crítico (em que o aumento da temperatura global seja de 3.2ºC), esta perda poderá ser 14% superior4. Por outro lado, caso seja cumprido o objetivo do Acordo de Paris, de limitar a temperatura a um aquecimento muito inferior a 2°C, poder-se-á evitar até 10% da perda prevista do PIB global em meados do século4. Ou seja, podemos concluir que pode existir um benefício financeiro caso se cumpram os objetivos do Acordo de Paris4.

Como incentivar as organizações a reduzir emissões?

Existem alguns instrumentos financeiros, tais como a fiscalidade verde, que poderão dar um contributo interessante. Por exemplo, alguns economistas defendem um aumento da taxa de carbono e, em simultâneo, a redução de outros impostos aplicáveis às organizações. Esta medida permitiria, por um lado, dar folga orçamental às organizações para alocar o capital financeiro em soluções de baixas emissões e, por outro lado, tornar os investimentos com elevadas emissões pouco atrativos.

Embora os cenários em causa não sejam prognósticos, permitem vislumbrar possíveis implicações futuras com base nas ações atuais. Sabendo que existem diferentes cenários que demonstram que o cumprimento dos objetivos do Acordo de Paris é a “melhor das piores opções”, torna-se cada vez mais evidente que o investimento na mitigação e na adaptação às alterações climáticas (“cenário da ação climática”) sairá mais barato do que manter o business as usual (“cenário da inação climática”) e deve ser encarada como uma oportunidade para as gerações presentes e futuras.

Como recomendação final, sugiro que, os governos e as organizações tenham a ambição e coragem de responder ao desafio das alterações climáticas e que, a sociedade se mobilize, de forma cívica, para debater este tema com a seriedade que lhe é devida.

1.Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC), “Sixth Assessment Report”
2.United Nations Environment Programme (UNEP), “Emissions Gap Report 2023”
3.European Environment Agency (EEA), “Economic losses from weather- and climate-related extremes in Europe”
4.Swiss RE, “The economics of climate change: no action not an option”

O Observador associa-se aos Global ShapersLisbon, comunidade do Fórum Económico Mundial, para, semanalmente, discutir um tópico relevante da política nacional visto pelos olhos de um destes jovens líderes da sociedade portuguesa. Ao longo dos próximos meses, irão partilhar com os leitores a visão para o futuro nacional e global, com base na sua experiência pessoal e profissional. O artigo representa, portanto, a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da Comunidade dos Global Shapers, ainda que de forma não vinculativa.