Seria possível elaborar uma longa lista de exemplos mas deveria bastar relembrar os tristes casos da PT e do BES para atirar definitivamente a lengalenga dos “centros de decisão nacionais” para o caixote do lixo dos disparates proteccionistas. Infelizmente, no entanto, a memória e a consistência no pensamento são bens escassos em Portugal e, assim sendo, estamos a assistir a novo round dessa deprimente e perigosa lengalenga.
Uma análise séria da promiscuidade – ao longo dos anos e de sucessivos governos – entre o Estado e empresas como a PT e o BES dificilmente poderia deixar de concluir que a doutrina do favorecimento dos “centros de decisão nacionais” originou, pelo contrário, verdadeiros centros de destruição nacional e foi por isso absolutamente ruinosa para o país e para os portugueses, que aliás continuarão a suportar os seus custos durante muito tempo.
Ganharam – como habitualmente acontece quando este tipo de clamores se consegue impor nas decisões políticas – uma longa série de interesses rentistas que florescem precisamente no pântano da promiscuidade entre Estado e grandes empresas do regime. Os fenómenos de captura de legisladores e reguladores e as práticas de porta giratória entre as várias esferas de decisão relevantes completam o lamentável quadro que continua a ser um dos principais factores de atraso da economia portuguesa.
Como bem aponta Paulo Ferreira relativamente ao sector da banca :
“Muito mais do que a “espanholização” da banca temos que temer é a sua “portugalização”, que nos deu um BPN, um BPP, um BES e um Banif. E, noutro plano, uma Caixa que durante anos serviu interesses privados e políticos. Bancos? Que sejam sólidos, bem geridos, transparentes, disponíveis para financiar projetos viáveis e emprestar para além do imobiliário. Se o capital estrangeiro o faz melhor do que o português, então ele que venha. O resto é jogar Monopólio com dinheiro dos contribuintes.”
Num país em que o rentismo continua a ser uma opção de carreira altamente atractiva em muitos sectores, a doutrina dos “centros de decisão nacionais” é verdadeiramente tóxica. O ecossistema rentista em Portugal vai desde as esferas autárquicas e universitárias – em geral para os menos hábeis – até às entidades reguladoras e conselhos de administração – onde se concentra a maioria dos “prémios” mais atractivos. Ora o clamor pelos “centros de decisão nacionais” produz efeitos prioritariamente neste último segmento, razão pela qual é especialmente prejudicial para o país.
Quem agora vem, mais uma vez, manifestar-se pela defesa estatal dos “centros de decisão nacionais” deveria, por uma questão de coerência e como salientou Luís Aguiar-Conraria, explicar também por que motivo a aplicação da doutrina correu tão mal no passado e por que devemos acreditar que desta vez será diferente.
Ainda que muito tenha ficado por fazer no combate ao rentismo, Pedro Passos Coelho merece crédito por não ter cedido às pressões para usar recursos dos contribuintes para “salvar” o BES, em linha com o que a doutrina dos “centros de decisão nacionais” impunha. Infelizmente, os sinais das últimas semanas indiciam que as velhas práticas não só estão longe de ser extintas como se preparam para regressar com toda a força.
Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa