A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) difundiu um estudo com a análise global do fenómeno da corrupção em 2024, onde se defende que Portugal deve regulamentar a chamada “representação de interesses”, ou seja aquilo que habitualmemte vimos designado por lobbying.

Mas, quando falamos de corrupção, falamos exatamente do quê? E o que está em causa?

Em 2020 Portugal definiu a “Estratégia Nacional de Combate à Corrupção 2020-2024” assente, essencialmente, em sete prioridades:

1.Melhorar o conhecimento, a formação e as práticas institucionais em matéria de transparência e integridade;
2.Prevenir e detetar os riscos de corrupção no setor público;
3.Comprometer o setor privado na prevenção, deteção e repressão da corrupção;
4.Reforçar a articulação entre instituições públicas e privadas;
5.Garantir uma aplicação mais eficaz e uniforme dos mecanismos legais em matéria de repressão da corrupção, melhorar o tempo de resposta do sistema judicial e assegurar a adequação e efetividade da punição;
6.Produzir e divulgar periodicamente informação fiável sobre o fenómeno da corrupção; e
7.Cooperar no plano internacional no combate à corrupção.

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Não me vou deter nas minudências operacionais de cada uma das sete prioridades, apenas dar nota que destas sete prioridades, e com vista a reforçar e melhorar os mecanismos de prevenção e deteção da corrupção e crimes conexos, quatro foram identificadas como centrais (supra 1, 2, 4 e 6).

No mesmo documento é ainda possível encontrar uma definição de ‘corrupção’ e, cito: “conduta corruptiva (é quando) se verifica o abuso de um poder ou função públicos de forma a beneficiar um terceiro, contra o pagamento de uma quantia ou outro tipo de vantagem”. Não obstante, o conceito pode ter um sentido mais abrangente, “abarcando outras condutas, também criminalizadas, cometidas no exercício de funções públicas, como o peculato, a participação económica em negócio, a concussão, o abuso de poder, a prevaricação, o tráfico de influência ou o branqueamento”.

Definido, o conceito de corrupção, vamos agora ver como é proposto o seu combate no terreno.

A “Estratégia Nacional de Combate à Corrupção 2020-24” estabelece que a política de combate à corrupção se faz através da articulação de um conjunto de instituições públicas e privadas, a saber:

O Mecanismo Nacional Anticorrupção (MENAC), que coordena as actividades de implementação, acompanhamento, informação e avaliação do plano de ação da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção;
O Tribunal Constitucional, que controla o cumprimento das regras em matéria de conflito de interesses para os funcionários políticos tal como a Procuradoria-Geral da República tem o mesmo mandato para os altos funcionários públicos;
A Entidade das Contas e Financiamentos Políticos (ECFP), organismo independente que funciona junto do Tribunal Constitucional e é responsável pela fiscalização das contas dos partidos políticos e das campanhas eleitorais.
O Tribunal de Contas, instituição que fiscaliza a legalidade e regularidade das receitas e despesas públicas, julga as Contas que a Lei manda submeter-lhe, dá pareceres sobre a Conta Geral do Estado e sobre as Contas das Regiões Autónomas, aprecia a gestão financeira pública;
Depois temos ainda a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), responsável pelas questões de informação pública; a Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM), a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), a Agência para a Modernização Administrativa (AMA) e a Transparência e Integridade, Associação Cívica (TI-PT) que têm responsabilidades no que respeita à política de dados abertos.

Pela amostra, é obvio que Portugal, para além de ter os objetivos estratégicos bem definidos, tem as instituições (públicas de privadas) suficientes para o combate à corrupção. O que Portugal não tem são “Relatórios de monitorização” sobre este plano de ação 2020-2024. De que servem todas estas instituições se não exite uma instituição responsável pela monitorização das actividades de lobbying?

Este é o cerne da questão e o ponto a partir do qual o problema devia começar a ser tratado.

O lobbying não está regulado em Portugal, é pouco conhecido e frequentemente confundido com práticas não legais. Mas lobbying não é isso. O lobbying é exercido por indivíduos ou grupos que representam interesse específicos, como empresas, organizações não-governamentais ou grupos de cidadãos, que procuram moldar políticas ou regulamentações a favor desses interesses. Na verdade, o lobbying é uma poderosa ferramenta democrática que dá voz a todos, incluindo os mais vulneráveis, na defesa e formulação de políticas públicas.

É preciso criar a Lei do lobbying e definir claramente as suas atividades para fortalecer a elaboração de políticas, bem como estabelecer, por uma questão de transparência, os requisitos de divulgação dos lobistas com vista à sensibilização do público para os intervenientes que influenciam as políticas. Adicionalmente deve ser constituída uma entidade independente para fiscalizar o cumprimento da Lei lobista e garantir a sua eficácia, mas sobretudo para monitorizar o trabalho que todos vão fazendo no terreno. Este caminho que tantas e tantas vezes foi adiado impõe-se pois é um instrumento legítimo de participação da sociedade nas tomadas de decisões.

Aí Portugal, para quando o consenso partidário sobre a Lei de lobbying e o compromisso com a transparência, a integridade e a responsabilidade no processo democrático, para que todas as vozes possam ser ouvidas de maneira justa e transparente?