Durante este ano, a habitação foi seguramente um dos temas mais determinantes da agenda política nacional, a par do acesso à saúde e educação; e, seguramente, sê-lo-á nos próximos anos. É irreal admitirmos que resolveremos a qualidade, o acesso e permanência nas habitações num prazo mais curto que uma década.

E para que o prazo seja curto, é necessário que as várias partes interessadas assumam os seus papéis e queiram estar na pole position, como se de uma corrida de Fórmula 1 se tratasse.

E quais são as partes interessadas? Seguramente o Estado central e local, os fazedores do mercado imobiliário, os proprietários e os cidadãos. Estes últimos, faróis das necessidades e o foco de todas as políticas de habitação.

Mas qualquer política de habitação, à semelhança das políticas de educação, deve materializar as respostas efetivas às questões da sociedade, num caminho gradualmente evolutivo, dificilmente disruptivo, mas efetivo na resposta.

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Quero com isto dizer que as medidas a executar não podem esquecer-se da cultura local de habitação e das idiossincrasias locais, como opção de comprar ou arrendar. Portugal é um país de proprietários: 78,3% das habitações são próprias e apenas 21,7% são arrendadas, contra 69,9% e 30,1%, respetivamente, na União Europeia.

O Governo decidiu recentemente não adotar o mecanismo travão das rendas como fez no ano passado, e bem. Ao mesmo tempo, decidiu reforçar o apoio a algumas famílias no pagamento das rendas – chegará a alguns, talvez não a todos que o necessitem, nem na dimensão do apoio.

De recordar que no ano passado o aumento foi limitado a 2%, e no que é que isto se traduz? Na perda de confiança dos proprietários no mercado de arrendamento e na perda de interesse dos promotores de imobiliários no que no mercado internacional se chama built to rent, ou seja, construir para arrendar. E quem perde? Os cidadãos, com menos oportunidades de habitação para arrendamento.

Quanto aos apoios, não haverá medidas universais e absolutas que apoiem todas as famílias de forma equitativa. Mas é erróneo suportarmos os apoios, porque voltamos para um país de arrendatários e inquilinos, quando culturalmente não somos e dificilmente o seremos.

O desequilíbrio de mercado só se resolverá com aumento da oferta, com mais produção, com incentivos à colocação de imóveis no mercado, sem medo do próprio mercado e do sistema fiscal.

Sem medo e com confiança. E a confiança das partes interessadas acima indicadas obtém-se com estabilidade de políticas, e não política, sustentável no tempo e nas opções de fundo, com privados, com lucros, com intervenção pública, com garantia de acesso a quem menos tem e mais precisa, no mercado de arrendamento e de compra e venda, com equilíbrio no acesso aos serviços básicos e com qualidade da habitação.

Isto vivendo voltados para dentro do problema da habitação, mas nem só por via da habitação se resolvem as necessidades. O acesso resolve-se com mais rendimentos disponíveis das famílias, porque a habitação pode não estar cara, os rendimentos é que estão baixos. E aqui, o Estado é o principal responsável pelo sistema económico que temos e pelo que queremos ter.

Concluindo, sem confiança nas políticas, o mercado imobiliário não irá reagir; sem essa reação, não teremos mais habitação e os preços (renda e venda) não vão descer; e sem mais rendimentos, não teremos mais habitação; e sem políticas de longo prazo, os resultados não existirão e as medidas efémeras de apoio ao acesso e permanência não passarão de meros paliativos, numa realidade difícil de resolver com todos, sem fundamentalismos ideológicos ou de mercado, mas com confiança.