Lá vão os tempos em que era possível circunscrever os cuidados de  saúde em Portugal ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) — o sistema de saúde  português é composto pelos setores — público, social e privado. Ora, neste  contexto, há competição por recursos humanos e inovação tecnológica. Os  recursos humanos e materiais não são ilimitados e, à data de hoje, não é  possível manter as múltiplas urgências polivalentes com todas as áreas em  permanência de 24 horas. Há, pois, que centralizar por distrito e região,  com redes de referenciação bem definidas para os hospitais de última linha!

Ao contrário do que se tem vindo a permitir, a especialização médica  é da mais elementar premissa para a qualidade dos cuidados de saúde prestados aos utentes. O preenchimento de escalas de urgência externa nas  áreas de Pediatria, Medicina Interna, Ortopedia e Cirurgia por não médicos  especialistas e não médicos internos de formação especializada nessas  Áreas tem contribuído para a falta de prestação do melhor cuidado aos  doentes e para o desinteresse dos recém-formados em Medicina em atingir o grau de especialista.

Acontece que, dependendo da  especialidade, cabe ao médico interno de formação especializada e médico especialista realizar atividade assistencial em enfermaria, bloco operatório,  consulta externa, urgência interna, urgência externa e consultadoria.

Já os  médicos contratados de forma externa, vulgarmente apelidados de  “tarefeiros” e até em várias análises “indiferenciados” (esta última  francamente depreciativa para Médicos, que são por si só pessoas  altamente qualificadas e com elevado grau de formação), são contratados  na maioria das vezes para realizar urgência externa, não tendo as demais  responsabilidades enumeradas aos médicos internos de formação  especializada e médicos especialistas. Acresce ainda que não raras vezes a  este menor leque de responsabilidades, é imputada uma remuneração  monetária superior. Estas condições têm levado à falta de preenchimento  de vagas de formação especializada e de especialistas para integrarem os  quadros hospitalares. Pasmem-se que seja de declinar trabalhar com mais  responsabilidade e num maior número de contextos e ganhar menos! O  que sustenta atualmente os Médicos Internos são as perspetivas a longo  alcance, o investimento em carreiras a logo prazo.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

É hora de falar claro em Portugal!

É hora de falarmos abertamente  do uso abusivo das urgências fruto da falta de literacia em Portugal, da  solidão e falta de apoios sociais. Porque sim, há muito idosos que recorrem  mais de 500 vezes às urgências hospitalares por viverem sozinhos acima dos  85 anos e não terem qualquer apoio ou por exacerbações frequentes de  doença crónica desencadeada por insuficiência económica para a compra  de medicamentos. Há idosos que vivem nos hospitais, nos designados  internamentos sociais — já que não têm motivos clínicos para permanecer  nos Hospitais, mas não têm autonomia para sair e não têm quem os vá  buscar ou receber em casa.

É hora de falarmos do turismo em saúde porque  se é certo que devemos ter fronteiras abertas, também é certo que quem  financia o SNS são os nossos impostos. Àqueles cujos impostos não  suportam o Estado português e que usam o sistema de saúde público, há  que pedir ressarço aos países de origem.