Caro leitor, começo o título da seguinte crónica sobre emigração jovem, inspirada numa dos slogans publicitários mais icónicos criados por Artur Agostinho: o da entrada da Toyota, em Portugal, pela mão de Salvador Caetano, em 1968.

O tema que me traz hoje, vem na sequência de declarações do dia 7 de Outubro, por parte do primeiro-ministro António Costa, no momento da apresentação do acordo de Concertação Social para 2024, quando proferiu as seguintes palavras: “Estas medidas foram tomadas para tentar reter o talento jovem qualificado, pois se emigram poderá ser uma tragédia para o nosso país.”

Segundo os dados do PORDATA, em 2021, 47,6% dos emigrantes portugueses (com 15 ou mais anos) tinham ensino superior concluído. É a percentagem mais elevada de sempre. Nem nos anos da troika (2011-2014) os valores eram tão elevados.

As medidas de António Costa vêm demasiado atrasadas e, lamento informar, a tragédia de Portugal está operacionalizada e efetivada. A emigração qualificada nacional está a ser substituída por imigração massificada e pouco qualificada que podemos encontrar nos operadores de distribuição- Glovo e Uber Eats ou nos TVDE, com os problemas demais conhecidos e já referenciados pelas autoridades (cartas e documentos falsos, problemas de exames e de língua, alojamentos sobrelotados, entre outros).

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Vir o primeiro-ministro destacar orgulhosamente, na televisão, que o novo ordenado para um técnico superior em início de carreira passará a ser de 1330€ brutos mensais (996,70€ líquidos) é, relembrando as palavras do mesmo interlocutor, em 2014, na altura das eleições europeias, manifestamente “poucochinho”.

Esse valor, atualmente, mal dá para despesas de habitação nas grandes cidades nacionais, onde o preço médio de um quarto ronda os 450€ em Lisboa e 420€ no Porto. Logo, um jovem qualificado, em início de carreira, fica desmotivado, pois passou 3 a 5 anos numa universidade, estudando e começa a sua vida laboral com poucos horizontes de futuro pessoal e profissional.

Pelo caminho, ter o dado que Portugal é o 20º país da União Europeia em termos de salário líquido (2021), deixa os jovens desmotivados e a procurar novos horizontes fora deste país que é um referencial para o turismo e para a gastronomia.

O Governo tem muita culpa nesta emigração qualificada, bem como outros agentes empresariais e de empresas de recursos humanos.

Os agentes empresariais também contribuem para o fenómeno da emigração jovem qualificada. Há grandes multinacionais que ficam muito felizes por encontrar em Portugal um país onde o Estado abre portas facilmente, os jovens sabem falar línguas estrangeiras e têm grande capacidade de trabalho, com boa produtividade, a baixos preços, na sua ótica financeira.

Para algumas destas empresas, Portugal está equiparada à Grécia e à Polónia: somos a “Índia da Europa”. Temos muita mão-de-obra, qualificada e predisposta a trabalhar muitas horas, em horários flexíveis, para outsourcings, por baixos salários e contratos de 6 meses.

Ao nível das empresas nacionais, deparamo-nos com um fenómeno conjugado: elevada fiscalidade e baixa produtividade. A elevada fiscalidade, levada a cabo pelo Ministério das Finanças, conjugada com a falta de atualização dos meios produtivos das empresas, faz com que seja muito difícil de elaborar ofertas salariais adequadas à qualificação dos candidatos. Logo, os salários praticados são, em muito, similares, aos de 2019.

Por fim, as empresas de recursos humanos que operam em Portugal e com o mercado português também têm contribuído favoravelmente para que aumente a emigração de jovens qualificados. Basta começar pelos processos de recrutamento opacos, onde ainda se esconde as margens salariais propostas para as funções, bem como pelas descrições de ofertas de emprego, onde ainda se pedem autênticos candidatos similares a “canivetes suíços”.

Se o leitor não acreditar, aconselho a pesquisar por ofertas para marketing digital, onde se pede alguém em início de carreira capaz de trabalhar com imensos softwares especializados, ao nível de profissionais com 5 anos na função e, pelo caminho, ter que desempenhar funções que deviam ter mais 1 colega contratado para auxiliar.

Seguidamente, as empresas de recrutamento são coniventes com a desmotivação criada nos jovens qualificados, pois demoram imenso tempo a dar respostas e, na maioria das vezes, quando o processo não avança ou é cancelado, nem sequer mandam feedback ao candidato, fazendo do silêncio a resposta negativa.

Se compararmos com processos estrangeiros, isto é um autêntico “turn off”. No estrangeiro, independentemente do resultado do processo, há sempre um email com feedback, deixando o candidato mais orientado para o seu futuro.

Muito terá que ser feito nos próximos anos, pelo Governo, pelos agentes empresariais e também pelas empresas de recursos humanos, com mudanças severas ao nível de incentivos financeiros e laborais, para criar uma perspetiva de futuro digno, para os jovens, em Portugal.

Portanto, tendo em conta o panorama atual e as poucas alterações que se vislumbram no horizonte económico e social do país, a emigração jovem qualificada portuguesa é como a Toyota, em 1968… veio para ficar.