Nos últimos vinte anos não deixei de ser político na acepção etimológica do termo (interesse pela “pólis”, cidade), ainda que tenha evitado ser partidário. Esta opção resulta do modo como entendo viver a minha cidadania. Porém, jamais deixei de exercer o dever de votar, e nunca o fiz abstractamente.

A linha que separa o todo (política) e a parte (partido) é muito ténue. Partimos do pressuposto de que todos desejamos o melhor para o nosso país. Até prova em contrário assim deve ser. No entanto, quando vemos serem tomadas decisões políticas que destroem projectos de educação e cultura com “direito de cidadania” com provas de qualidade dadas, pelo modo como se construíram, desenvolveram e afirmaram, é preciso dizer basta!

Muita tinta tem corrido e continuará a correr sobre as ditas escolas privadas. Quanto a mim, de privadas têm as paredes, a gestão (escrutinada pelas auditorias, e ainda bem) e os projectos educativos, devidamente aprovados pelo Ministério de Educação.

É geralmente sentido e pessoalmente experimentado, pela maior parte das pessoas, a dor provocada pela enorme carga de impostos a que todos, e de diversas formas, estamos sujeitos. Esta enorme carga fiscal, a qual não foi sujeita a qualquer reversão, só pode ter retornos através de variados serviços que o Estado deve garantir a todos os cidadãos (sem ter que ser o “patrão”, ou seja, o Estado não tem que ser gestor directo da coisa pública).

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Lamentavelmente, é de todos sabido que os serviços do Estado não fazem, regra geral, a melhor gestão dos dinheiros públicos. Num Estado democrático, é bom que o mesmo Estado não se substitua àquilo que pode ser feito pela Sociedade Civil, pelos “parceiros sociais”. Nisto consiste o Principio da Subsidiariedade. Não faça o Estado (instância superior) o que pode e deve ser feito pela instância intermédia ou inferior.

Apesar de já terem passado mais de 40 anos de democracia, Portugal continua a apresentar um grande défice na área da iniciativa privada, comprovado pela falta de visão e ambição. A este défice não é alheia a máquina pesada e burocrática do Estado. Esta influi negativamente na “capacitação humana” e arrasta consigo todos os défices numéricos. Será devido ao nosso “ADN” português? Estou convencido do contrário. Conheço centenas de pessoas que saíram do país e vingaram precisamente por serem empreendedoras e manifestarem excelente iniciava pessoal. Os resultados económicos e sociais assim o demonstraram. Deixaram de procurar trabalho e passaram a proporcionar emprego.

O que é que mudou? Não foram certamente e de repente as pessoas. O potencial estava ali à espera de se transformar em acto. Mudou o pêndulo. Surgiu outro contexto. E fez-se texto, fez-se história. Por vezes e desgraçadamente, é complicado ser empreendedor em Portugal. Mais complicado ainda com governos que (por razões ideológicas) têm dificuldades em conviver com a iniciativa privada. Um bom governo, numa sociedade aberta e democrática, tem a obrigação de garantir e defender o bem comum, aproveitando o potencial da Sociedade Civil, e não a desvalorizar. A verdade é que muitas destas pessoas que saíram do país deixaram de perguntar ao Estado o que poderia este fazer por si, e passaram a perguntar a si mesmas, o que poderiam fazer pelo Estado, isto é, pelo país. Trabalharam muito. Sentiram o estímulo da compensação. E tornaram esse país mais rico e próspero.

É preferível um Estado com cidadãos capacitados e capazes de capacitar os demais, do que um Estado paternalista, absorvente, infantilizado e prepotente. Não obstante, vamos encontrando no nosso país gente dedicada e séria, não só no sector privado, mas também no público.

Nesta reflexão, sublinho o sector privado como plataforma ímpar para o desenvolvimento humano, cultural e económico. Este precisa de ética e precisa de regras. Mas é possível e é o caminho. Para isso, nada melhor que pessoas motivadas, preparadas, competentes e agindo num quadro de escrupulosa legalidade. Neste sentido, privilegio a importância das escolas, uma vez que, depois do berço, e juntamente à família, é daí que vem a formação, a informação ou mesmo a deformação.

Na verdade, na sequência da desnecessária polémica a que temos assistido, o Estado parece não gastar mais dinheiro por subsidiar as escolas com Contrato de Associação do que o que gasta nas escolas públicas. Estas contas deveriam ser rigorosamente feitas, incluindo todos os gastos nas escolas estatais, tendo como referência o montante dado (para todos os gastos) às escolas com Contrato de Associação. Note-se: as escolas com Contrato de Associação são de ensino público. Conhecem-se práticas excelentes de inclusão. Desempenham com afinco o seu trabalho de acompanhamento pessoal (o mesmo se passa em muitas escolas estatais). Não é por acaso que são preteridas. Valeria a pena examinar as razões. Dizer-se que as poupanças desta desastrosa decisão (de acabar com os Contratos de Associação) vão ser usadas para oferecer manuais escolares aos alunos das escolas estatais é entrar num discurso demagógico e falso. Isto faz recordar o discurso soviético no seu pior, o qual faliu (também) por não ser verdadeiro. Isto ofende a inteligência das pessoas.

Todos e quaisquer projectos educativos, provados, comprovados e pelos pais procurados, não podem deixar de ter a aprovação e apoio do Estado.

A afirmação “le état c’ est moi” ainda que deva ser entendida no contexto próprio, ficou feia a quem a disse. Ainda hoje, quando recordada nos manuais escolares, não deixa de expressar uma ironia fina e hermenêutica cómica dada a pequenez mental de quem assim pensava. Não obstante, esse pretensiosismo latente continua a pairar como “nuvem” a ameaçar enxofre. Isto fica feio a quem disso está convencido. Quando tinha 7 anos, perguntei ao meu professor o que era o Estado. Ele respondeu que eramos todos nós. Nunca mais o esqueci.

Sendo o Estado todos nós, cabe ao governo ser seu intérprete. Assim, o Governo não deve fazer mais do que confirmar o que os pais, que não são em número residual, buscam e entendem ser o melhor para os seus educandos. Os pais têm esse direito. O Estado tem o dever de o garantir. Neste sentido, as escolas procuradas, sejam elas quais forem, primem pela excelência. As escolas não procuradas, sejam elas quais forem, sejam encerradas. Fica muita caro à cultura e ao país uma má escola continuar em exercício. É bom para o país que se invista em qualquer escola que forme, e de modo completo, homens e mulheres para o futuro desse país. Acreditemos na educação e instrução que é procurada e assimilada. Parece que os homens que fazem história nem sempre aprendem com a história dos homens que a fizeram.

Neste sentido, dentro dos condicionalismos que sempre existem, a escola deve ser uma escolha dos pais. Todos e quaisquer pais têm o direito de escolher a escola e os projectos educativos para os seus educandos sem terem que pagar duas vezes por isso (através dos impostos e através de propinas). Os impostos por todos nós pagos devem ser revertidos em bem comum; podem e quando necessário devem ser geridos por privados sendo estes sujeitos a escrutínios e vigilância de rigor na sua gestão. O mesmo deve acontecer transversalmente em todas as áreas onde são geridos os dinheiros públicos. É possível fazer muito com pouco. A maior parte dos serviços do Estado conseguem a proeza de fazer pouco, com muito!

Não se enveredar por esta via, como se tem constatado, só se pode dever a miopia, a interesses corporativos, a tendências extremistas e antidemocráticas da esquerda radical que pensam ser donos disto tudo. Poder-se-á ser escrupulosamente cumpridor em relação a um Estado que parece não ser pessoa de bem?

Quando eu era criança chamavam a pessoas deste género ditadores. As cores e os tempos mudaram, mas o bichinho da ditadura anda por aí, e começa sempre pelo monopólio da educação ou prima pela sua ausência!

Uma coisa é certa, em vez de apoiar e estimular, é grave que o governo tente acabar com algumas das melhores práticas, a nível do ensino, que este excelente mas pobre país tem. Isto não pode deixar de ter resposta. Pais de todo o país, unam-se!

Padre jesuíta