A construção é uma indústria caracteristicamente intensiva em mão-de-obra, mas, ao mesmo tempo, enfrenta vários desafios neste domínio, que afetam a sua qualidade e eficiência. De entre os desafios destacam-se os que se relacionam com a precariedade e instabilidade do emprego, a informalidade laboral, os baixos salários, a sinistralidade, a reduzida formação e qualificação, e a desvalorização social da profissão, que afetam principalmente a vertente mais operacional e contribuem negativamente para a atração e retenção de talento.
Neste contexto, a formação profissional assume um papel chave para desenvolver e valorizar o setor, ao aumentar a capacidade de realização e adaptação dos trabalhadores e promover o desenvolvimento e a adequação das suas qualificações, aumentando consequentemente a sua integração no mercado, com melhores condições, e a produtividade, rentabilidade e atratividade dos projetos e empresas. Ultimamente, uma força de trabalho mais capacitada e qualificada impacta positivamente na competitividade e desenvolvimento económico do setor e do país.
Neste sentido, a própria legislação portuguesa, conforme prescrito no Código do Trabalho, determina o dever das empresas em “contribuir para a elevação da produtividade e empregabilidade do trabalhador, nomeadamente proporcionando-lhe formação profissional adequada a desenvolver a sua qualificação”, estipulando ainda um número mínimo de horas de formação profissional por colaborador por ano. Reciprocamente, o trabalhador deve “participar de modo diligente em ações de formação profissional que lhe sejam proporcionadas pelo empregador”.
Não obstante, na construção, o investimento em formação (desenvolvimento de competências específicas) e os níveis de qualificação (competências ganhas e reconhecidas) são historicamente reduzidos face a outras indústrias, encontrando-se ainda, no caso de Portugal, abaixo da média europeia. Ou seja, não existe, em geral, uma valorização do capital humano, o que também tem contribuído para crescente escassez de pessoal tecnicamente especializado, principalmente ao nível de funções produtivas como desenhadores, pedreiros, carpinteiros e ladrilhadores, mas também de gestão, como projetistas, diretores de obra ou de fiscalização, que envolvem as áreas da arquitetura e engenharia.
Este problema, contudo, não é recente. Já no final do séc. XIX, com o programa de fomento contemplando a realização de grandes obras públicas para a renovação e expansão da rede ferroviária, rodoviária e portuária, e na segunda metade do séc. XX, com a adesão à CEE, a intensificação da atividade da construção em Portugal evidenciou a falta de mão-de-obra, sobretudo de caráter operacional. Enquanto durante a primeira metade do séc. XX esta problemática foi atenuada com o funcionamento das chamadas escolas industriais, o ensino profissional foi sendo descontinuado, acabando mesmo por desaparecer após o 25 de abril, em prol do forte crescimento do sistema de ensino superior, direcionado sobretudo para funções mais ligadas à gestão. A criação do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) na década de 80 e as alterações legislativas no âmbito da adesão à CEE contribuiram para mitigar o problema, mas de forma insuficiente e sem visão de longo prazo.
Requer-se, assim, um pacote de medidas estruturais num horizonte temporal alargado, em que, do lado do governo, o ensino profissionalizante deverá ser recuperado e, do lado da indústria, as construtoras deverão promover a lecionação de cursos e a realização de estágios profissionais para a formação e integração de novos trabalhadores no setor. Neste sentido, deverão ser criados sistemas de incentivo e deverá ser mobilizado um esforço conjunto entre o governo, as instituições de ensino e as empresas, no sentido de adaptar os modelos de ensino e de negócio à evolução do ambiente construído, que requer novas competências.
Em todo o caso, torna-se premente o desenvolvimento de conhecimento e capacidades mais tecnológicas. Como tal, o desenvolvimento de estratégias formativas em torno das tecnologias de informação constituem medidas importantes para responder aos desafios da industrialização e valorizar o potencial humano.
Posto isto, o investimento em formação e qualificação no setor da construção não se resume a um mero custo e cumprimento legislativo, mas pretende estimular o desenvolvimento de competências e a valorização das pessoas enquanto fatores decisivos para promover a atração e retenção de talento e contribuir para ultrapassar o crescente défice de mão-de-obra especializada, principalmente de caráter mais operacional. A excelência da construção depende intrinsecamente da capacidade do seu capital humano em dar resposta à crescente procura por qualidade, eficiência, segurança, sustentabilidade e tecnologia no desenvolvimento dos projetos e no desempenho das organizações.
Por fim, surgem frequentemente questões sobre o risco de as empresas investirem na formação das pessoas, e as mesmas não permanecerem nas empresas. Contudo, a questão maior que se coloca é: “Quais são os riscos de não se investir na formação das pessoas, e as mesmas permanecerem nas empresas?”.