Desde a Revolução de Abril de 74 que dois partidos têm em Portugal maiores responsabilidades: o Partido Socialista, com mais anos na governação e o Partido Social-Democrata com igual número de vitórias, algumas delas alcançadas em coligação com o CDS e o PPM, mas com menos anos no poder, desde logo porque o PS conseguiu igualmente governar quando perdeu as eleições de 2015. Nos últimos 29 anos o PS acabaria mesmo por governar num longo período de 22 anos.
Apesar de terem ocorrido alguns registos de instabilidade governativa (com uma média de eleições a cada 3 anos) a legitimidade de ambos os partidos tem permitido estabilidade constitucional, pois raramente os resultados ditaram a possibilidade de a lei fundamental poder ser alterada sem a participação de ambos, face à exigência de 2/3 para aprovação de eventuais alterações. São, dessa forma, partidos guardiães da democracia.
Dos 16 atos eleitorais realizados (após as eleições constituintes), cada um destes grandes partidos venceu 8 vezes. Em cada eleição, cada um destes partidos elegeu em média 91 deputados e só por duas vezes conseguiram, cada um deles, a maioria dos deputados (mais de 115). O PSD concorreu coligado com o CDS e o PPM (1979 e 1980) e só com o CDS (2015), sendo que sempre que concorreu coligado ganhou as eleições.
As maiorias do PS foram alcançadas por José Sócrates e por António Costa e as duas
maiorias do PSD foram alcançadas por Cavaco Silva. Em 2011, PSD, que vencera as
eleições com Passos Coelho e CDS, com Paulo Portas, formularam nova maioria pós-
eleitoral e, em 2015, PS (na sequência de uma derrota eleitoral), BE e PCP formularam uma nova maioria que ficou conhecida por geringonça e que governou até 2019.
Assim, e em média, estes dois maiores partidos recolhem 182 dos 230 lugares na Assembleia da República, ou 79% dos mandatos, ficando 21% para outros partidos. Vêm tendo, pois, uma legitimidade acrescida dada pelos portugueses e
consequentemente uma responsabilidade maior na prospetiva e desígnios nacionais.
São partidos políticos defensores de um Portugal integrado na Europa e fazendo parte da NATO, o que resulta em estabilidade na política externa, e ambos defendem os princípios e valores constitucionais e promovem o bem-estar-social. São, contudo, diferentes nos modelos de desenvolvimento económico que defendem. O PS mais à esquerda, querendo o mesmo dizer que será mais a favor da intervenção do Estado na economia (nacionalizando mesmo alguns setores, como a TAP, recentemente) e de políticas mais sociais e redistributivas; enquanto o PSD, igualmente social, mas personalista e mais ao centro-direita, defende a criação de valor pelas pessoas e pelas empresas, com o Estado a regular e a implementar políticas públicas que cumpram os ditames e princípios constitucionais. O primeiro parece basear muito o seu trabalho no alargar das prestações sociais assistencialistas (mais Estado) e o segundo parece apostar na criação de um quadro que favoreça o empreendedorismo e a mobilidade social pela vontade, entrega e livre iniciativa (menos Estado e mais sociedade), criando um quadro em que as oportunidades possam ser criadas para além do Estado.
Há depois outros partidos que concorrem a eleições legislativas, mas este texto não trata dessa análise. Dir-se-á apenas que à esquerda do PS, Bloco de Esquerda e Partido Comunista parecem – apesar dos seus programas avessos à construção europeia e sérias divergências nas políticas externa e económica-, sobretudo, preparados para reeditarem uma geringonça de esquerda.
Há outros partidos mais à direita, Chega e Iniciativa Liberal que, não obstante existam há pouco tempo, já elegem significativo número de deputados, um pouco em linha com o que se vem passando noutros países europeus. O Chega estará mais alicerçado nas políticas de segurança interna, controlo da imigração e combate da corrupção; já a Iniciativa Liberal terá subjacente a livre iniciativa privada com menos impostos e menos Estado, aproximando-se nessa vertente do PSD, se bem que este mantenha mais acentuada uma preocupação social para redistribuição e apoio social equitativo. Não parece que haja inultrapassáveis para acordos pós-eleitorais entre estes dois partidos, se a matemática ditar essa necessidade (para atingir os 116 assentos).
Há ainda o PAN e o Livre e até o JPP, todos com possibilidades de eleição de pelo menos um deputado. O PAN parece apoiar-se em políticas ambientalistas e pró-animais e o Livre parece querer fundar uma nova esquerda já com agenda europeia, ao passo que o JPP é um partido com implantação apenas na Madeira, mas que poderá nesse círculo eleitoral ser a surpresa da noite eleitoral, bastando-lhe ter os mesmos votos das eleições regionais para aí eleger um dos 6 deputados.
Obviamente que não cabe neste breve texto a melhor caracterização ideológica dos partidos políticos em apreço, pois ativemo-nos no resultado dos dois maiores partidos nos quase 50 anos de democracia. E nesse período, é indiscutível que Portugal cresceu e desenvolveu-se, aproximando-se muitas vezes das médias da OCDE e da União Europeia.
Há, claramente nesse período, momentos de menor eficácia das políticas públicas e de desaires financeiros, com situações de quase bancarrota a que foi necessário acudir e situações de clara divergência com o crescimento dos demais países da União Europeia, com os recém-admitidos países de leste a ultrapassarem Portugal, como vem acontecendo nos últimos anos.
Há, também, no presente alguns problemas dignos de agendamento de políticas e de maior eficiência e eficácia na implementação. Temos problemas demográficos sérios, problemas de sustentabilidade social e os pilares do bem-estar-social – saúde e educação, sobretudo – parecem estar pouco fortalecidos. Seria impensável chegarmos a 2024 e – apesar da comparativa elevada carga fiscal – termos um martírio no acesso aos serviços de saúde, estarmos a meio do ano e termos alunos sem professores, vermos sair milhares de jovens do país ou não existir habitação condigna que promova a família e o tal bem-estar social que todos ambicionam proteger. Mas é em democracia que as soluções têm de ser encontradas e felizmente temos liberdade de escolha. É verdade que apenas metade de nós faz essas escolhas. Quantos pelo mundo gostariam de poder votar e não o podem fazer. Já que mais não seja, por esses que vivem em regimes totalitários ou autocráticos e não podem votar livremente, todos devíamos fazê-lo em 10 de março de 2024.
Nota: O número de mandatos variou conforme tabela abaixo. Em 1975, ocorreram as eleições para a Assembleia Constituinte, ou seja, dos 250 deputados que iam na sequência da Revolução de abril de 1974, aprovar a Constituição.