As recentes mudanças políticas nos países anglo-saxónicos — destinos tradicionalmente preferenciais para estudantes internacionais — têm reduzido a sua atratividade. Por um lado, os resultados das recentes eleições norte-americana estão a ter impacto na procura das Universidades Norte-Americanas por estudantes internacionais. Numa pesquisa realizada pela plataforma global Studyportals, com mais de 1.300 futuros estudantes, 57,7% dos entrevistados afirmaram que agora é menos provável que procurem um diploma nos Estados Unidos devido ao resultado das eleições. A maioria dos estudantes refere que os EUA estão a tornar-se menos acolhedores para estudantes internacionais e minorias, enquanto outros têm agora uma visão desfavorável dos americanos em geral. Por outro lado, no Reino Unido o Brexit levou a queda drástica no número de matrículas de estudantes internacionais, com uma em cada três a enfrentar desafios financeiros significativos.

Este contexto pode ser uma excelente oportunidade para as Instituições de Ensino Superior (IES) em Portugal. Nos últimos anos, estas instituições têm desenvolvido esforços, individualmente ou de forma conjunta, na promoção de Portugal como um destino apelativo para estudantes internacionais. O foco da mensagem tem sido a educação de alta qualidade e um custo de vida acessível.

Como resultado, o número de alunos estrangeiros que escolhem Portugal como destino para os seus estudos tem aumentado significativamente. De acordo com dados oficiais do governo português, em outubro de 2023, “O número de inscritos no ensino superior atingiu um número recorde no ano letivo 2022/2023, com 446 028 alunos — um acréscimo de 12 811 face ao ano letivo anterior”. No mês passado, a ESN (Erasmus Student Network) considerou o Porto como o destino Erasmus de 2024.

No entanto, esta proposta de valor e o contexto internacional favorável podem ser deitadas a perder devido à burocracia lusa. De facto, Portugal enfrenta desafios e custos substanciais e específicos decorrentes de processos burocráticos e regulamentares complexos, requisitos de residência e limitações institucionais que aumentam tanto o fardo financeiro quanto o logístico para estudantes e universidades.

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Um dos principais desafios burocráticos para estudantes internacionais em Portugal é a complexidade do processo de visto e imigração, que é obrigatório para estudantes de fora da União Europeia. Este processo é demorado e complicado, pois os estudantes precisam de apresentar um comprovativo de matrícula, prova de recursos financeiros, seguro de saúde e, por vezes, até comprovativo de alojamento.

Além disso, os atrasos no processo de solicitação de visto podem fazer com que os estudantes percam o início do ano académico. Por exemplo, um atraso de algumas semanas na obtenção do visto pode resultar em aulas perdidas ou, em casos extremos, até em uma admissão adiada. Estas situações causam um impacto financeiro e emocional extremamente negativo para os estudantes.

Para os estudantes que conseguem obter o visto e entrar em Portugal, o próximo desafio é obter uma permissão de residência, exigida para estadias superiores a três meses. Tal adiciona mais uma camada de papelada e visitas a órgãos governamentais. Em Portugal, esse processo é inimaginavelmente demorado sendo os atrasos da AIMA conhecidos de todos.

Para os estudantes, esse processo não só consome tempo como também pode ser stressante, especialmente se houver barreiras linguísticas. Como resultado, muitos estudantes não conseguem ter sucesso nos seus estudos porque consomem o seu tempo à porta da AIMA para conseguir um agendamento, consomem a sua energia intelectual a pensar como podem resolver a sua situação que muitas vezes os impede de voltarem ao seu país de origem para assistir ao funeral de um familiar e consomem a sua saúde mental por se encontrarem ilegais num país estrangeiro.

Para as universidades portuguesas, apoiar os estudantes nesse processo requer um apoio dedicado. Os serviços de Relações Internacionais são chamados a disponibilizar orientação sobre renovação de permissões de residência, manter-se atualizados sobre as mudanças nas regulamentações e até acompanhar os estudantes aos órgãos locais em certos casos. Todos esses serviços de apoio requerem financiamento e tempo, colocando uma pressão financeira significativa nas universidades, sendo que no caso das IES com menos recursos poderá nem ser possível oferecerem esse apoio e consequentemente perderem a oportunidade de atrair estudantes estrangeiros.

Os desafios burocráticos e regulamentares enfrentados por Portugal na captação de estudantes internacionais são multidimensionais e impõem custos significativos para estudantes e instituições. Se Portugal pretende fortalecer sua posição como um destino de eleição para estudantes internacionais, será necessário abordar esses desafios simplificando processos administrativos, flexibilizando as regulamentações e aumentando a autonomia das instituições.

“Nada é mais dispendioso do que uma oportunidade perdida” disse H. Jackson Brown Jr. As oportunidades que as eleições americanas ou o Brexit vieram oferecer às IES portuguesas são únicas. A burocracia lusa é o custo de uma oportunidade perdida.