O jornalismo atual está num momento histórico decisivo. Entre ser um instrumento do poder político ou de corporações que detêm os grandes grupos de comunicação social. Sabemos que não há almoços grátis. Se os jornais dependerem dos apoios do Estado para sobreviver, algo está mal. Se as televisões têm comentadores que servem para as pessoas não terem de chegar às próprias conclusões, algo está mal. Se os jornalistas são doutrinados desde a universidade e têm de manter certa linha ideológica para ter trabalho, algo está mal. Mas nada muda se esse poder na comunicação social é exercido por intermediários, neste caso quem injecta o capital nos grupos económicos. De uma forma ou doutra, só serve para dar uma ilusão de democracia onde há coletivismos autoritários.
Nestes dias, liguei o noticiário e estava um jornalista da SIC Notícias a usar o espaço televisivo para fazer uma manifestação de opinião sobre Luís Montenegro. Não concordo com Luis Montenegro em muitas coisas. Alias, saí do PSD porque não podia continuar num partido sob a sua liderança, assim como de alguns dos que o rodeiam. Não concordo com o atual primeiro-ministro dentro da área da economia e já o deixei claro, por exemplo dentro da minha Ordem profissional. Tem muitos defeitos como líder, mas há locais apropriados para o criticar. Se o jornalismo quer ser “livre e independente” não pode usar a antena para ser mensageiro de propaganda eleitoral. Fiquei sinceramente enojado quando liguei a televisão e me deparei com o tal jornalista da SIC Notícias a ler no teleponto um discurso de propaganda pré-eleitoral. Porque na conjuntura daquele momento, era apenas isso. Terão estado na origem deste imbróglio, afirmações de Montenegro a respeito de certo “jornalismo ofegante” e que, segundo percebi, estendeu as críticas ao uso inapropriado dos auriculares em reportagens de diretos. Para complementar, uma peça jornalística da RTP resolveu troçar de Luís Montenegro a respeito dessas declarações. A reportagem, que é vergonhosa e não tem o mínimo de senso, traduz uma caricatura daquilo em que se tornou o jornalismo português. Este é o jornalismo “livre e independente” em Portugal: livre de ser ideológico e fazer favores a quem quiser; independente de pressões para ser verdadeiramente livre e independente.
No meio das declarações de Luís Montenegro, também ficou vincado que “as redes sociais podem ser um perigo para o jornalismo livre e independente.” Sim, as redes sociais podem ser um perigo para as pessoas que não sabem pesquisar, confirmar e fazer análises críticas. E este esforço é preciso ser feito todos os dias, quando se lê manchetes de jornais nacionais em papel, que são títulos de artigos de opinião jornalísticos. O que se passa neste momento é uma selva e não há órgãos que coloquem um ponto de ordem, nem associações profissionais, nem a entidade reguladora da comunicação-social (ERC). Eu próprio senti isto na pele nas últimas eleições autárquicas no Porto, onde houve a narrativa aberta dos “sete candidatos” e só aconteceu um debate televisivo em que pude participar: na RTP, curiosamente na mesma hora de um jogo de futebol. Como mesmo assim terá havido quem ficasse incomodado com as minhas críticas diretas aos reis da política nacional, não voltei a ser convidado. Evidentemente, fiz queixa à ERC que aceitou as justificações da SIC e declarou culpada a TVI, simplesmente instando a que “não voltasse a fazer o mesmo.” Fiquei a saber, na pele, que a ERC não serve absolutamente para nada, a não ser para eternizar o poder dos donos disto tudo. É que em dezenas de queixas que fiz, nessas e noutras eleições, o resultado foi sempre nada, zero, bola. Para se ter tempo de antena sobre o que vai mal no país e nas cidades, tem de se fazer parte da cartilha: são os famosos comentadeiros do sistema, que tanto entretêm os adeptos partidários, mas que não ousam questionar os alicerces desta “democracia”. E não, Dr. Luís Montenegro, as redes sociais não são um perigo para o verdadeiro jornalismo livre e independente. São um perigo para o jornalismo atual: livre do propósito de informar de forma independente.
Um bom exemplo sobre o “perigo” das redes sociais é o Brasil. Lula voltou ao poder, já tinha do seu lado a maioria da justiça e da comunicação social. Típico de certos líderes que querem ser autocratas. As redes sociais seriam o último reduto para uma maior “venezualização” e a plataforma X é a única que ainda resiste a tentações corporativas de censura sistemática. Tal não agradou ao juiz Alexandre Moraes, aliado da extrema-esquerda de Lula, que resolveu lançar uma guerra a esta plataforma e ao seu dono, Elon Musk. Só a desbloqueou no dia a seguir às importantes eleições locais brasileiras, mas aparentemente ninguém aqui na Europa deu por isso. Com Zuckerberg a confessar, arrependido, que o Facebook (a Meta) cedeu às pressões da Casa Branca para ser irredutível com as publicações sobre o covid-19, parece que Elon Musk e o antigo twitter (X) serão os únicos defensores resistentes da liberdade de expressão. Por isso, é o local onde hoje, os líderes do Hezbollah e de Israel, fazem as suas comunicações ao mundo. E é a fonte de informação mais rápida e independente, desde que saibamos filtrar e confirmar as fontes de informação. Desta forma, é contraditório que, por exemplo, a senhora Ana Gomes vá para a televisão reclamar que no X consegue dizer tudo o que lhe apetece. Eu já disse várias vezes e repito: a liberdade de expressão é o fundamento sobre o qual se sustém todas as outras liberdades. É muito mau sinal quando um líder político manifesta vontade de amordaçar o seu povo, mesmo que para o justificar utilize palavras bonitas e demonstre intenções puras. O resultado será sempre negativo e apenas serve para colocar na clandestinidade quem utiliza as famosas fake news. Mas é insultuoso afirmar que a população é suficientemente estúpida para não discernir a verdade. Pior ainda, é paternalista e ditatorial não deixar que as pessoas julguem, discutem e cheguem sozinhas a conclusões fundamentais para as próprias vidas.