Em 2002, Paulo Pedroso, responsável por redigir as alterações à declaração de princípios, acrescentou ao documento que “O PS assume a defesa do ambiente e a promoção do desenvolvimento sustentável, como elementos essenciais de políticas orientadas pelo princípio da precaução, informadas pelo cuidado com o nosso futuro comum e fundadas no respeito por nós próprios e pelas gerações vindouras”.

Posto isto, é inegável o vanguardismo do PS na sustentabilidade ambiental, que tem décadas de contributos tangíveis e que hoje começamos a sentir como essenciais à nossa vida. Nos últimos dias temos ouvido falar de seca severa e observando o boletim meteorológico, vemos previsões de chuva intensa em vários pontos do país. Contrasenso? Não. São as consequências das alterações climáticas. As secas, cada vez mais severas e mais próximas temporalmente, deterioraram os solos e muitas vezes as quantidades de água que caem muito repentinamente, não se encaminham para onde deveriam. Quando o solo se torna muito duro, as chuvas em vez de serem absorvidas e recarregar os lençóis freáticos, escorrem pelos solos e provocam inundações, que se tornaram cada vez mais frequentes em toda a região mediterrânea. Itália enfrentou nas últimas semanas cheias catastróficas, Espanha enfrentou o maio mais chuvoso em 90 anos, Portugal assiste a sucessivos alertas de chuvas fortes.

Portugal perdeu 15% das suas disponibilidades hídricas no último século, por via das alterações climáticas, contudo é expectável que percamos mais 15% da nossa disponibilidade hídrica nas próximas três décadas. Se a norte do país, poderíamos ser levados a pensar sentimos menos a falta de disponibilidade hídrica, em Viseu e Vila Real começamos a sentir problemas, mas se descermos a sul do Tejo, os efeitos são dramáticos e muito possivelmente irreversíveis.

O Governo já conseguiu inscrever no PRR verbas na ordem dos €390 Milhões em projetos para a Gestão Hídrica para promover interligações entre regiões. Estão contratados projetos para o reforço hídrico dos sistemas e abastecimento de água na Madeira e em Porto Santo. O Alto Alentejo contará com investimentos essenciais no reforço da bacia hidrográfica do Tejo, com uma nova barragem com capacidade de abastecer água potável a cerca de 55.000 pessoas, assim como novos aproveitamentos energéticos. No Algarve, onde os dados sobre a disponibilidade hídrica são catastróficos, estão previstos €200 Milhões em projetos de redução de perdas de água no setor urbano, aumento da eficiência hídrica do setor agrícola e uma grande fatia será alocada à construção de uma estação dessalinizadora, capaz de fornecer água potável.

Mas há um conjunto de trabalhos a montante que estão a avançar para tornar cada um dos setores mais eficientes. Mas, sobretudo, é necessário entender que a água é um recurso cada vez mais escasso e que não poderá voltar a ser tratado como um bem infinito. Só com políticas públicas fortes e uma mudança de pensamento da parte de todos os cidadãos e agentes económicos poderemos proteger este ativo estratégico e essencial para a vida de cada português. Não podemos, não ficar chocados quando ouvimos dizer que os campos de golfe se regam com milhares de hectómetros de água com a mesma qualidade da água que utilizamos para escovar os dentes. Não podemos ficar chocados quando se afirma que o setor agrícola tem que racionalizar consumos e escolher culturas mais sustentáveis na utilização de água. A produção de um quilograma de abacate consome tanta água como oito quilogramas de alface. De igual forma não podemos aceitar que haja infraestruturas de água com perdas na ordem dos 30%. Não podemos aceitar que a água das chuvas escorra para rios, enquanto que os municípios e organismos públicos regam jardins com água pública. Não devemos ambicionar reduções no preço da água, quando temos que a racionalizar, mas sobretudo quando lutamos diariamente, para não ter que fechar torneiras.

O caso espanhol pode dar-nos a dimensão da urgência de pensar a gestão de água de forma racional no nosso território. No pico da seca de 2022, Espanha apresentava disponibilidades hídricas na ordem dos 40%. Mas em Portugal já há populações cujo abastecimento de água é feito por autotanques e cisternas. Com as medidas em curso, o país vai estar mais preparado para enfrentar os desafios futuros, mas tudo estará alicerçado na nossa mudança de comportamentos na gestão da água.

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