A propósito da habitação e da sua escassez, muito se tem dito e escrito. Inclusive por mim, em texto anterior.

Hoje debruço-me novamente sobre este tema, sob uma nova perspectiva, até porque o tema é fértil em “soluções”, o problema está é na ideologia de quem manda e que, curiosamente e ao contrário do que apregoa, coloca o interesse financeiro (o seu, do estado) à frente do das pessoas.

Quem estiver atento ao mercado imobiliário percebe que existe, em muitas situações, uma desadequação do imóvel às necessidades do seu proprietário. Há 20 anos atrás, era de facto, mais “fácil” comprar casa. Não necessariamente em Lisboa, mas era relativamente mais fácil fazê-lo.

E também não o era pelas taxas de juro, como tanto agora nos querem fazer crer  – parece que todos nos esquecemos de que taxas de juro positivas são o normal! Taxas de juro nulas ou mesmo negativas, essas sim, aconteceram num período anormal, e não são sequer desejáveis. Tal como a inflação se pretende positiva, ao invés de negativa, as taxas de juros (que mais não são que o preço do dinheiro) também se pretendem positivas. O contrário traduz um sistema económico e financeiro pouco saudável.

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Voltemos à compra de casa. Quem comprou casa há 20 anos pode ver hoje o valor de mercado da sua casa, duplicado.  Eventualmente comprou um apartamento com 3 quartos, porque tinha dois filhos e um agregado familiar de 4 ou 5 pessoas, se tivesse por exemplo, um pai ou mãe, sogro ou sogra, a viver consigo.

Esta casa terá sito comprada com o seu dinheiro, fruto do seu trabalho e, possivelmente, com recurso a crédito bancário. Ou seja, para comprar esta casa, esta família pagou juros, imposto de selo, comissões bancárias e impostos a vida toda – pagou IRS, do rendimento do seu trabalho, pagou IMT (ou a anterior SISA) e Imposto de Selo. Pagou IMI a vida toda. Paga taxas e taxinhas em qualquer contrato de água, electricidade ou gás. E do seu trabalho, também paga Segurança Social, que nunca verá revertida a seu favor – quem acredita que o sistema conseguirá pagar-lhe a reforma daqui a 10 ou 20 anos, é mais ingénuo do que eu.

E esta família, que dum agregado de 4 ou 5 pessoas, tem actualmente um agregado de duas ou mesmo de uma só pessoa – face à elevada taxa de divórcios, será mesmo o mais normal – mantém este apartamento com 3 quartos. Porquê?

Não faria mais sentido colocar este apartamento no mercado e comprar um outro, com apenas um quarto ou, no máximo, dois? Não traria duas grandes vantagens?

  1. Promovia liquidez no mercado, com maior oferta;
  2. Garantia a reforma ao seu proprietário que, não sabendo quantos anos tem pela frente, se arrisca um dia a não ter poupanças (já disse que reforma não terá….) para (sobre)viver.

Sendo este raciocínio aparentemente simples, porque não vemos a generalidade das pessoas a fazer esta troca de casa?

Porque o nosso Estado, esse “ser” supremo que tanto se preocupa com o cidadão, nos obriga a pagar imposto sobre mais-valias. Pior, para não pagar mais-valias, o Estado obriga-nos a reinvestir a totalidade do valor da venda do imóvel e nem sequer apenas a efectiva mais-valia.  Ou seja, a “reforma” do proprietário é, em grande parte, engulida pelo Estado.

Não percebendo eu sequer a razão de taxar mais valias – não vejo qualquer fundamento para este imposto que não seja o “roubo” – no caso particular do imobiliário, considero mesmo uma afronta.

Vou dar um exemplo, meramente ilustrativo: comprei em 2004 um imóvel por 300.000€. Hoje poderia vendê-lo por 600.000€. Teria uma mais-valia de 300.000€ (600.000-300.000). Devo dar nota de que há factores de valorização do imóvel que reduziriam este cálculo ligeiramente mas não o suficiente para distorcerem o meu exemplo e o ponto a que quero chegar.

Pois se eu com o produto da venda desta casa, por 600.000€, adquirir uma outra por 200.000€, estarei sujeita a pagar imposto sobre mais-valias, não sobre um valor de 300.000€ mas sim sobre 400.000€ (600.000-200.000).

E claro que no meio disto, vou pagar novamente IMT e IS sobre a casa que vou comprar (5.577,58€). Tal como os compradores da casa que vendo, irão pagar IMT e IS sobre a casa que estão a comprar (39.609,86€).

Ou seja, numa transação “simples”, que daria liquidez ao mercado de habitação e que ajudaria pessoas que se aproximam da idade da reforma, a ter tempos de vida mais tranquilos, o Estado encaixaria uma pequena fortuna (mais de 120.000€) sem acrescentar rigorosamente NADA a estas pessoas.

Reforço que ambos os agregados, protagonistas anónimos deste exemplo, pagam impostos todos os dias – sobre o seu trabalho (IRS e SS), nas compras de supermercado (IVA), na compra e utilização do seu carro (ISV, IVA, ISP, IUC, Inspecção, EMEL, etc.).

A taxação de mais-valias é pois incompreensível, injusta e prejudicial ao correcto funcionamento do mercado. Mesmo se pensarmos em bens mobiliários – acçoes por ex. – o Estado cobra imposto sobre mais valias porquê? Assumiu algum risco? Compensa o cidadão quando ele regista menos valias? Ou nesse caso, o problema é dele?

E se quisermos sair do âmbito daqueles a que a esquerda gosta de considerar ricos, os que têm casa própria ou investem em acções – como se eles não as tivessem também, muitos em maior escala ainda (quem se esqueceu do Robles?), como é que num simples depósito a prazo, constituído com as poupanças de quem consegue poupar do ordenado que recebe – e sobre o qual paga impostos – o Estado fica com 28%? 28%????

Este estado não quer ser justo nem distribuir riqueza. Este estado quer distribuir e massificar a pobreza!