A tempestade que era possível prever no final de 2014 e que já pairava sobre Portugal em Outubro de 2015 começou esta semana a abater-se sobre o país. A “geringonça” orçamental desbaratou em poucos dias a (frágil) credibilidade externa duramente acumulada ao longo dos últimos quatro anos, descredibilizou o país face aos seus credores, assustou os investidores e fez disparar os juros.

Nada que constitua surpresa num governo que, como bem realçou Rui Ramos, se encontra dependente da assistência política da extrema-esquerda para governar um país dependente da assistência financeira da UE. Mas, ainda que a triste novela a que estamos a assistir não possa ser considerada inesperada, ela é pelo menos frustrante. É difícil aceitar que, pouco mais de quatro anos depois de terem conduzido Portugal à bancarrota e a um pedido de assistência externa, muitos dos mesmos protagonistas políticos estejam a repetir basicamente a mesma receita para um segundo desastre anunciado.

Por muito que os entusiastas da “geringonça” e do “tempo novo” resistam a enfrentar a realidade, a verdade é que não há mesmo dinheiro para pagar mais socialismo. Repetir as mesmas políticas (inimigas do investimento, destruidoras da confiança, orçamentalmente irresponsáveis e profundamente estatistas) e esperar que desta vez o resultado seja diferente do anterior (a falência) é, no mínimo, pouco inteligente.

Como muito oportunamente alerta João César das Neves, realçando os paralelismos entre 2016 e 2008:

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“Há oito anos, com o mundo à beira do abismo, o nosso Orçamento do Estado para 2009 continha “o maior aumento à função pública desde 2001”, como titulava o DN de 15 de Outubro de 2008. No dia seguinte, também o DN assegurava que as “prestações sociais têm maior subida desde 2003”. Os tempos mudam mas as políticas mantêm-se e, apesar da instabilidade financeira mundial, o Orçamento para 2016 promete coisas parecidas. O resultado não pode ser muito diferente. Na altura o défice previsto no documento era de 2,2% do PIB para 2009, igual ao indicado para este ano. É bom lembrar que o verdadeiro valor verificado há sete anos acabou por ser de 9,8%.”

Uma situação que é agravada em 2016 por o governo aparentar funcionar sem ministro das Finanças. Mário Centeno, uma figura respeitável no panorama académico nacional mas notoriamente sem peso para se impor à máquina do PS, parece ser um mero figurante desorientado num meio que lhe é estranho. Sucessivamente desmentido e desautorizado publicamente, foi certamente com pesar e alguma vergonha que se viu forçado a apresentar às instituições europeias documentos pouco credíveis e mal fundamentados.

Ironicamente, na esfera do actual governo, é até um deputado eleito (como independente) pelas listas do PS – Paulo Trigo Pereira – quem tem conseguido dar mostras de alguma liberdade de espírito e independência intelectual, não obstante a sua condição. Face às últimas semanas, é aliás difícil não pensar que o país estaria, apesar de tudo, melhor se a pasta das Finanças tivesse sido entregue a Trigo Pereira em vez de a Centeno.

Mas mais do que o caso pessoal do ministro das Finanças, o que está em causa é o país e a repetição do lamentável caminho que conduziu à bancarrota e consequente pedido de resgate externo em 2011. Não aprender nada com os erros cometidos então não é apenas incompetência, irresponsabilidade e cegueira ideológica: é uma conduta de profundo desrespeito pelos portugueses e de traição a Portugal.

Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa