Em período pré-eleitoral, António Costa acenava com o fim da austeridade e prometia taxas de crescimento da economia em harmoniosa consonância com esse desígnio. Infelizmente para o país, gerar condições que possibilitem o crescimento económico é mais difícil do que ajustar parâmetros numa folha de Excel. Com um crescimento económico anémico e muito abaixo do prometido, as dificuldades orçamentais inevitavelmente surgiram e o governo optou por se manter fiel às suas principais clientelas políticas ao mesmo tempo que impôs ao resto do país uma dose renovada e acrescida de austeridade.

A proposta do Orçamento do Estado para 2017 confirma esta tendência. Do lado da despesa, o caminho escolhido foi adiar toda a despesa passível de ser adiada e, cada vez mais, também despesa não passível de ser adiada. Como salientei recentemente, o resultado é um Estado que paga salários aos seus funcionários mas não presta serviços (ou presta-os de forma cada vez mais degradada comprometendo o seu funcionamento) porque não há dinheiro para mais nada.

Rui Ramos descreveu o mesmo fenómeno assinalando que, por via da “geringonça”, estamos a passar de um Estado social para um Estado eleitoral: “O governo devolve salários ao funcionalismo, mas tira-lhe, ao mesmo tempo, os meios para desempenhar o seu papel. Não poderia haver melhor sinal de que o Estado social só interessa ao governo e à maioria como uma bolsa de clientelas e de dependentes, e não como prestador ou garante de serviços à sociedade.”

Por sua vez, do lado da receita, o Orçamento de Estado para 2017 constitui um notável exercício de criatividade fiscal. Com os contribuintes portugueses sujeitos já a um regime de asfixia fiscal, não é fácil encontrar novas fontes de receita politicamente exequíveis. Dos veículos às munições para caça, sem esquecer as bebidas alcoólicas, os refrigerantes e o tabaco, praticamente nada que se mexa foi poupado, ainda que em alguns casos com isenções e excepções politicamente convenientes.

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Além disso, e contrariamente ao prometido pelo governo, a sobretaxa aplicada ao IRS não acabará em 2017, sendo apenas reduzidas as taxas aplicadas. Importa salientar também o agravamento do IRS por via de uma actualização dos respectivos escalões em 0,8% num Orçamento que prevê uma inflação de 1,5%. Mas o agravamento fiscal mais simbólico previsto no Orçamento é muito provavelmente o novo imposto sobre o património, o primeiro passo na concretização de uma bandeira ideológica de longa data da extrema-esquerda.

O efeito orçamental em termos de receitas geradas será mínimo (e a médio e longo prazo quase certamente negativo), mas o novo imposto constitui o pior sinal possível para um país que precisa desesperadamente de poupança e investimento. Continuando uma lamentável tendência que vem de trás, esta proposta de Orçamento premeia quem vive mais próximo do Estado e comunica de forma clara e inequívoca que Portugal não está interessado em produtores e acumuladores de riqueza. 2016 foi um ano muito mau mas, com este Orçamento, 2017 tem tudo para ser pior.

Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa