Os bebés, embora normalmente estimados e protegidos, não são exemplo moral para quase ninguém; e poucos consideram que tenham discernimento moral satisfatório.  No entanto uma especialista reparou que não parecem ter dúvidas sobre as companhias que querem ter por perto; e de que querem sempre ter por perto as pessoas certas.  A sugestão desenvolve outra inspiração mais antiga, que é a de que o mundo se divide para os bebés entre o que querem ter perto de si e o que querem ter longe.   São distinções morais básicas, que mais tarde passamos muito tempo a tentar readquirir, quase sempre sem resultado.  Seria por isso mais simples seguir o instinto dos bebés; mas esse instinto parece-nos também inalcançável, como um dente de leite.

Com o tempo, as memórias dos nossos tempos de infalibilidade moral vão-se esbatendo; e quando deixamos de brincar com miniaturas de pessoas e de dormir com ursos já desapareceram completamente.   Será em parte por descuido e esquecimento; mas também não nos são encorajados grandes hábitos de reverência em relação aos nossos estados anteriores, e não somos ensinados a honrar quem fomos.   Não é fácil determinar se o decréscimo em prestígio dos nossos estados anteriores se deve a uma ideia de progresso que nos leva a considerar os nossos estados anteriores como versões primitivas daquilo que somos hoje, e que foram substituídos com vantagem, ou se é antes o resultado de termos ganho o hábito de entreter certas dúvidas.

Os nossos hábitos morais foram caracteristicamente formados a duvidar: de que a imagem de uma pessoa seja essa pessoa; de que uma pessoa certa seja a pessoa realmente certa; de que o que alguém está a fazer ou a dizer seja o que alguém parece estar a dizer ou a fazer; e de que o que temos de fazer nos seja evidente.  O resultado dessa educação moral é o aumento do preço da ideia de esforço, e a descida do preço da ideia de confiança.  Estados de certeza são considerados arcaicos, e estados de segurança insensatos.   A nossa teoria moral, à medida que crescemos, torna-se parecida com uma teoria política, normalmente com uma versão de Realpolitik, e observa um princípio prudencial de destruição mútua assegurada: duvidar dos outros para que ninguém possa ter certezas sobre nós.

Por desconfiar dos nossos instintos morais e de certos hábitos antigos começamos a substituir os seus objectos por deliberações, e por cálculos de consequências.   O processo é gradual:  vamos pouco a pouco reduzindo o número de pessoas a quem aplicamos os nossos instintos morais primitivos.  Não é por isso raro ver gente acabar as suas carreiras biológicas num estado de completa sabedoria moral, rodeados por pessoas iguais entre si, e que vistas bem as coisas lhes são totalmente indiferentes.   O processo de aprendizagem moral por que passaram curou-os do facto de se terem comportado como bebés quando eram mais pequenos.

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