A Comissão Europeia publicou esta semana as previsões económicas da Primavera (Spring 2022 Economic Forecast). Foi num contexto de enorme incerteza que foram agora actualizadas as previsões do Inverno em função dos novos desafios colocados pelas implicações da invasão russa da Ucrânia. Concretamente, o crescimento económico é agora revisto em baixa e a inflação revista em alta, nomeadamente devido à subida dos preços da energia e dos alimentos e à disrupção nas cadeias de distribuição, esta última fortemente agravada face ao que já havia ocorrido como efeito da pandemia.
Portugal, Espanha e Irlanda são os países que mais deverão crescer em 2022, sendo – surpreendentemente – Portugal o país que apresenta maior crescimento previsto para o PIB em 2022: 5,8%, após um crescimento de 4.9% em 2021, recuperando cerca de metade do nível de PIB perdido em 2020 (-8,4%). Prevê-se que o crescimento PIB se reduza em 2023 para níveis mais habituais para a economia portuguesa – cerca de 2,7% — à medida que as tensões geopolíticas se desvaneçam e as cadeias distribuição se reestabeleçam. O défice orçamental deverá continuar a reduzir-se, prevendo-se que se situe em 1.9% do PIB em 2022 e em 1% em 2023, beneficiando dos efeitos favoráveis do crescimento e do influxo de fundos da UE (PRR), à medida que vão desaparecendo as medidas de apoio à economia relacionadas com a crise sanitária COVID-19 e que o investimento público vai ganhando algum impulso após vários anos de estagnação. Para mais informação sobre as previsões da Primavera da Comissão Europeia para Portugal veja-se aqui.
Quanto às razões para o surpreendente crescimento previsto para o PIB em 2022 – cerca de 5,8% – as mesmas devem-se a duas ordens de razões:
- A profunda queda do PIB português durante a pandemia: -8,4% em 2020, uma das maiores quedas nos países da UE. A esta queda do PIB acresce ainda o facto de Portugal ter sido dos países da UE onde foi gasto menos dinheiro público para apoio a empresas e famílias em dificuldades durante a pandemia. Estes dois factos levam a que qualquer recuperação posterior, por partir de uma base mais baixa, pareça ser maior do que realmente é; note-se que apesar deste “forte crescimento” em 2022, só agora – uma vez decorridos 3 anos – é que o PIB português está a voltar ao valor nominal de 2019. O facto de a própria Comissão Europeia prever que o PIB português volte em 2023 ao seu crescimento (infelizmente) habitual – cerca de 2,7% – é bem elucidativo de como não há nada de estrutural nesta previsível “forte recuperação” de 2022.
- A forte recuperação do turismo em 2021 e, sobretudo, em 2022. Trata-se do maior sector exportador português, pelo que assim que o turismo recuperasse para os níveis pré-pandemia – como está atualmente a acontecer – os efeitos de arrastamento sobre o PIB seriam muito significativos. Acontece, porém, que boa parte deste forte impulso do turismo em 2022 resulta das tensões geopolíticas exacerbadas a leste devido à agressão russa na Ucrânia – na verdade, esta é uma inusitada circunstância em que, contrariamente ao que é habitual, a nossa situação periférica de país mais ocidental da Europa nos está a beneficiar face aos concomitantes desvios das correntes turísticas para a península ibérica. Este é, porém, um efeito temporário, pelo que, também aqui, a Comissão Europeia prevê que o turismo volte a estabilizar em 2023, pelo que também este factor de crescimento económico deverá normalizar o seu contributo para o crescimento em 2023.
Daqui se conclui, portanto, que não há quaisquer novos factores estruturantes a explicar o “forte crescimento” previsto para a economia portuguesa em 2022. Pelo contrário, tratando-se de factores temporários explicados por circunstâncias meramente conjunturais, conclui-se que, infelizmente, a economia portuguesa – se nada for, entretanto, feito a nível de reformas estruturais para melhorar a sua competitividade e condições para o progresso económico – voltará a partir de 2023 ao crescimento anémico que tem conhecido durante todo o séc. XXI.