Num país como Portugal, onde a escolaridade obrigatória existe (e espero que continue a existir) e onde a escola pública representa um papel fundamental do Estado na formação dos seus cidadãos, mas também na evolução da sua economia, a resposta que responde ao meu repto inicial é simples na forma: para que haja uma democracia saudável, ampla e ativa no seu papel de gerir os assuntos públicos do país, é preciso existir, desde logo, uma verdadeira Democracia nas escolas, nas universidades, nos politécnicos.
Uma fórmula essencial para que isso aconteça é garantir que praticamente todos os estabelecimentos de ensino em Portugal, possuem órgãos de representação dos estudantes, democraticamente eleitos e geridos concretamente pelos estudantes. Paralelamente, é necessário repensar o nosso ensino e os seus métodos de avaliação, pois considero que estamos a eliminar o pensar diferente, as questões de discordância, as questões políticas das escolas. Os estudantes deixaram de ser tão reivindicativos, por conforto ou pela ilusão do mesmo existir, admito, mas também porque o ensino não procura incutir pensamento crítico, suscitar o debate, e o confronto de ideias é evitado propositadamente. Infelizmente, existe um conjunto de direções das escolas e universidades que se recusam a alterar este status quo, conscientes de que, a partir do momento que os Estudantes começam a questionar e a organizarem-se, eles ganham força, colocando em causa o completo domínio das questões educativas, de gestão e até políticas por parte da classe dirigente dos estabelecimentos de ensino.
As associações, os núcleos, os clubes, não podem existir para depender da aprovação e concordância das direções ou da classe docente. Estas existem separadamente e paralelamente, com propósitos comuns muitas vezes, mas com a sua identidade e autonomia próprias, e, claro, os seus interesses próprios. Se procuramos fortalecer a nossa democracia, não é a fugir do debate e atenuar contrastes que o devemos fazer, mas sim a formar cidadãos em instituições de ensino capazes de lidar com essa tensão constante, de forma saudável e produtiva, para o enriquecimento tanto da instituição como dos estudantes e de todos aqueles que fazem parte dela. Não há maior obstáculo para o sucesso da educação em Portugal do que a falta de discordância entre alunos, entre aluno e professor, entre passado e futuro, entre áreas e correntes de pensamento. Querer uniformizar mentalidades e competências é anti ciência, contra o progresso, e apenas desmotiva quem procura evoluir academicamente, além de afetar a saúde mental de qualquer estudante, independentemente da sua motivação, disciplina e propósito.
Nas Universidades é urgente abandonar o formalismo excessivo, disfarçado de reverência académica, que muitas vezes resulta numa cultura de medo e ansiedade, em que os estudantes se encontram à mercê de professores cruéis na sua forma de estar e exercer a suas funções. Combater o assédio no meio académico, em qualquer circunstância, entre alunos, entre professor/aluno e também entre estudantes de graus académicos e cursos distintos. Rever os métodos de ensino e de avaliação, valorizando competências diversas, abandonando os métodos tradicionais que privilegiam mecanismos de memorização e colagem de conhecimento.
O movimento associativo português está de boa saúde no ensino superior, o que falta é que mais estudantes ganhem consciência da urgência em dizer “presente!” e participem ativamente no dia a dia da sua universidade, encontrem lutas comuns que inspirem e tragam cada vez mais jovens cidadãos à vida política, ativista e cívica do país.
Nas Escolas Secundárias é muito grave o constante incumprimento da lei do associativismo, revelando um total desrespeito pela organização coletiva dos Estudantes. A grande maioria das associações de estudantes nem sequer está legalizada, o que resulta em sérios constrangimentos, tais como a falta de acesso a financiamento importante, a um espaço próprio com o mínimo de condições (Artigo 16.º do quê?), ao direito a serem informadas dos assuntos relativos à gestão escolar e de serem tidas em conta no processo de tomada de decisão.
Os cidadãos não servem apenas para receber respostas da democracia e votar, delegando o dia a dia do sistema aos responsáveis políticos, mas sim para participarem ativamente e legitimamente nela. Esse processo passa muito por incutir nos estudantes desde cedo a noção do seu papel na construção do que é e vai ser a sua comunidade, o seu país.
Além disso, é muito importante que os partidos tenham de uma vez por todas a coragem política para ouvir as reivindicações e propostas dos estudantes e, com base nelas, agir e reformar o ensino, nunca por cima, mas ao lado das suas vozes. Os Estudantes têm pedido a palavra, incessantemente a hora dos decisores políticos, reitores e professores nos darem o espaço e as ferramentas reivindicados para que possamos dar uso a estas vozes.