Um dos pilares de qualquer sociedade é o seu sistema educativo: uma estrutura construída sobre a competência e dedicação dos professores. Em Portugal, no entanto, o processo pelo qual os professores iniciam as suas carreiras revela uma contradição preocupante: o período probatório imposto aos professores ingressados na carreira docente mina a credibilidade das universidades, as mesmas instituições responsáveis pela sua formação e preparação profissional. Explicamo-nos melhor: o período probatório, que tem a duração mínima de um ano, é concebido para avaliar as competências pedagógicas, didáticas e profissionais dos novos professores de carreira. Durante este tempo, os professores são acompanhados de perto por mentores e direções escolares para determinar a sua adequação à integração definitiva na carreira docente. E à primeira vista, isto pode parecer uma medida sensata para salvaguardar a qualidade educativa.
No entanto, levantam-se questões fundamentais sobre a confiança do Estado nas suas próprias instituições de ensino superior, na medida em que, para seguir uma carreira docente em Portugal, é obrigatório possuir, no mínimo, um mestrado na área da educação ou ensino (uma qualificação académica rigorosa e exigente em termos de tempo e de custos). As universidades preparam de forma meticulosa os futuros professores para os desafios da sala de aula, combinando conhecimentos teóricos com experiências práticas em estágios pedagógicos, investigação e formação especializada. Assim, quando um professor ingressa na carreira docente (e muitos após longos períodos como professores contratados) já passou por um processo extensivo de avaliação e desenvolvimento de competências, apesar de o período probatório sugerir o contrário, o que implica a ideia de que as universidades são incapazes de formar professores devidamente preparados, transferindo para as escolas a responsabilidade de assegurar a qualidade.
Esta redundância cria um sistema onde os novos professores têm de se provar novamente sob a supervisão de mais uma camada de avaliadores e a implicações disto são graves.
Em primeiro lugar, mina a autoridade das universidades, questionando subtilmente o valor de um mestrado em educação ou ensino. Por que razão deveriam os estudantes investir anos a obter qualificações avançadas se o próprio Estado sugere, implicitamente, que essa formação é insuficiente? Isto enfraquece a confiança nas instituições de ensino superior e transmite uma mensagem desmotivadora aos futuros professores.
Em segundo lugar, sobrecarrega os novos professores com um stress e uma pressão adicionais, perpetuando um ambiente profissional precária, uma vez que, em vez de iniciarem as suas carreiras com a confiança resultante da formação rigorosa que receberam, são lançados num período de incerteza profissional que pode levar ao desgaste emocional ou à desilusão. Por fim, esta abordagem é um golpe autoinfligido pelo próprio Estado, visto que, ao minar as universidades, o governo enfraquece a base do seu próprio sistema educativo. As universidades não são apenas instituições académicas: são pilares fundamentais da sociedade, encarregues de preparar a força de trabalho do futuro e um Estado que compromete a credibilidade das suas próprias universidades arrisca-se a fragilizar os alicerces do seu próprio desenvolvimento.
Qual é a solução? Se o Estado insiste em manter o período probatório, deve fazê-lo de forma complementar e não a contradizer a formação académica providenciada pelas universidades. Por exemplo, as escolas poderiam focar-se em apoiar os novos professores na adaptação às dinâmicas específicas do seu ambiente de trabalho em vez de reavaliar competências já adquiridas, fomentando-se uma colaboração mais estreita entre escolas e universidades, garantindo uma transição harmoniosa entre a preparação académica e a prática profissional.
O período probatório, tal como está atualmente estruturado, é mais do que um simples passo processual: é um símbolo de prioridades mal colocadas. Um sistema que mina os seus professores e as instituições que os formam não pode aspirar à excelência. É tempo de Portugal confiar nas suas universidades e, por extensão, nos seus professores, investindo não em avaliações redundantes, mas no desenvolvimento contínuo e na dignidade de uma das profissões mais vitais da sociedade.