Os rankings das escolas fazem parte das rotinas do ano escolar. Isto arrasta duas consequências. A primeira é que, de ano para ano, vão surgindo melhorias metodológicas. A segunda é que, apesar disso, as reacções dos agentes educativos pouco variam, denunciando um debate cristalizado no que não importa – por um lado, a comparação privado/público, por outro a ilusão de que uma classificação de escolas diz algo sobre quais são as melhores escolas do país. Sim, há vida para além dos rankings. Mas, sobretudo, ficar só por estas constatações é perder de vista o real contributo dos rankings das escolas: identificar tendências, assinalar boas práticas em escolas, detectar problemas estruturais, realçar os desafios actuais do sistema educativo. Isto é, pôr um país a discutir reformas na Educação, no sentido de a melhorar. E é essa oportunidade que, anualmente, muitos dos agentes educativos em Portugal deitam a perder.

Os rankings não são um ponto de chegada, nem o culminar de um debate. São, sim, o ponto de partida para uma conversa séria sobre um conjunto de problemas que vão ao coração do sistema e que pouco se discutem. Vai uma lista? Um: a prática reiterada das retenções nas escolas – quanto mais tempo vão as escolas apostar numa prática que se sabe ineficiente para as aprendizagens dos alunos? Dois: o falhanço estrutural de um sistema educativo incapaz de proporcionar igualdade de oportunidades, uma vez que a escola não consegue superar o peso do perfil socioeconómico dos alunos no seu percurso escolar – afinal, que meios faltam às escolas para puxar os alunos desfavorecidos para cima? Três: o modelo de acesso ao ensino superior, que não somente amarra o ensino secundário à obsessão pelas notas como estabelece tratamentos desiguais entre alunos (há escolas que inflacionam as notas de avaliação interna e outras que penalizam demasiado os seus alunos) – então, que alternativas existem? Quatro: as discrepâncias regionais, que elevam o litoral e afundam o interior do país: os resultados dos alunos nos centros urbanos e no litoral são significativamente superiores aos do interior – assim sendo, como ajudar as escolas do interior a melhorar, sabendo que isso é determinante para fixar população? Cinco: as diferenças de qualidade no funcionamento das escolas: afinal, mesmo entre escolas vizinhas e que servem a mesma população, os resultados diferem – como ajudar as escolas que estão a falhar? Seis: as regras das matrículas, que reproduzem as desigualdades sociais por via da residência (quem mora num bairro “bom” tem uma escola “boa”, quem está num bairro “mau” tem uma escola “má”) – como alterar esses critérios, no sentido de proporcionar aos jovens desfavorecidos acesso a escolas que realmente os ajudem?

São muitas questões, haveria outras mais, e todas são difíceis. Mas também todas têm resposta. Veja-se, por exemplo, o caso das discrepâncias regionais. Sabe-se que os alunos das áreas mais interiores do país têm, em média, desempenhos mais fracos do que os alunos que estão no litoral e nas zonas urbanas. Sabe-se ainda que, em média, o perfil socioeconómico das famílias no interior é mais baixo do que no litoral – o que, lembrando o peso que a dimensão social tem, ajuda em parte a explicar os resultados. Mas sabe-se também que, nas escolas do interior, há menor percentagem de professores do quadro, indicando maior instabilidade na composição das equipas pedagógicas. E sabe-se ainda que, em média, os professores que vão para as escolas do interior têm menos anos de experiência e graduações mais baixas. Isto é, que em média os professores mais qualificados escolhem instalar-se nas zonas urbanas e no litoral, ficando o interior do país como “sobra” para quem luta por uma vaga nos concursos nacionais. Que conclusão? Fica claro que, sendo o papel do professor fundamental para o sucesso escolar, as escolas do interior precisam que lhes dêem autonomia e ferramentas para atrair professores mais experientes, mais motivados, mais qualificados para lidar com uma população jovem que, comparativamente ao resto do país, precisa muito que a escola sirva de elevador social. Dito de forma directa: enquanto vigorar o actual modelo centralizado de concurso de colocação de professores, muitas das desigualdades regionais manter-se-ão tal como estão.

Lá está: as questões acima são difíceis e as respostas impõem (muitas vezes) reformas estruturais. E, claro, não se resolvem criticando duramente os rankings, rejeitando utilidade na informação que prestam, ou defendendo mesmo a sua abolição. Com cerca de 15 anos de rankings das escolas e indicadores cada vez mais fiáveis e informativos, já está na hora de se dar o passo em frente: em vez de olhar para os rankings como ponto de chegada, ver neles um ponto de partida para pais, professores e agentes educativos discutirem políticas públicas de educação. Discussões que, em Portugal, continuam a ser demasiado raras e pouco participadas. E não é por falta de informação – é mesmo por faltar quem as queira ter.

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