Talvez seja útil que a esmagadora maioria dos portugueses se habitue à realidade de que não tem nenhuma forma de influenciar a governação do País e de que as suas opiniões, por mais credíveis e fundamentadas que sejam, não servem para grande coisa. Sendo certo que aqueles que não desistem de estudar os problemas do País e de tentar fazer ouvir a sua voz, não terão qualquer sucesso. É aquilo a que tenho chamado trabalhar para a história, na medida em apenas passados muitos anos esses portugueses, se ainda vivos, podem obter a satisfação de terem estado certos, ainda que com pouco reconhecimento público. É certamente esse o meu caso.

Os exemplos não faltam, seja nos incêndios, seja nas cheias, seja na estagnação económica, seja na energia, seja relativamente às desgraças no Serviço Nacional de Saúde e à suposta falta de médicos, não faltam portugueses, muitas vezes estudiosos desses assuntos, que tentam fazer ouvir a sua voz, mas sem qualquer sucesso e correndo mesmo o risco de serem rotulados de ignorantes por um qualquer ignorante pertencente à grande família socialista. Família que dominando todos os cargos do Estado nas mais diversas áreas, prescinde, com a satisfação dos seus interesses, de quaisquer opiniões alheias.

O caso recente da ministra Vieira da Silva pode ser considerado educativo. A quando da nomeação de um jovem recém licenciado sem qualquer experiência profissional para o cargo e com um salário muito superior à generalidade dos dirigentes públicos mais qualificados e com anos de experiência,  ouviu um coro de protestos nos meios de comunicação. Pois bem, a ministra não precisou de dar qualquer explicação para o sucedido, além de dizer que a nomeação não era ilegal, nem explicou nada sobre as competências do nomeado, ou publicado o seu currículo, ou foi justificada a escolha. Nada, a ministra decidiu está decidido e os que não gostaram da ideia, por mais  fundamentadas  que sejam as suas objeções, o seu real valor é zero.

É neste contexto que vejo com crescente preocupação o papel mínimo da universidade portuguesa  no debate sobre as mais diversas questões que envolvem o conhecimento especializado. Talvez porque o papel da universidade em muitas decisões políticas do passado recente foi menorizado ou inconsequente, ou porque as opiniões expressas publicamente são desvalorizadas, ou mesmo acusadas de ignorância pelo poder político, o facto é que o papel da universidade na definição das estratégias sobre o futuro do País, é hoje irrelevante. Não que o poder político não fale na importância do conhecimento existente nas universidades portugueses, mas apenas porque os ministros e secretários de Estado preferem ver o conhecimento universitário longe das suas decisões, frequentemente marcadas por interesses e por soluções cozinhadas no segredo dos gabinetes. Na energia, na estratégia ferroviária, nas políticas ambientais, na economia e até mesmo na educação, escasseiam hoje as posições oriundas  das nossas universidades definidoras de alternativas às posições dos governos.

Há já muitos anos, no tempo da governação de António Guterres, vivi uma experiência pedagógica quando um sectário de Estado avançou com incentivos para o investimento privado na produção de energia pela via eólica demasiado cedo na curva do desenvolvimento tecnológico e a um preço demasiado elevado, além de  contractos demasiado longos no tempo, pelo que publiquei um texto, baseado no conhecimento de especialistas amigos, em que sugeri a existência de uma ligação a interesses ao tempo pouco claros. Como resultado recebi uma carta do secretário Estado em causa, ameaçando-me com um processo judicial se não retirasse publicamente as afirmações feitas. Respondi de imediato que teria muito gosto em debater em tribunal a política e as decisões do Governo sobre o assunto, mas fiquei a falar sozinho e não houve ida ao tribunal, com o resultado dos preços e das condições propostas pelo então secretário de Estado ainda hoje pesarem negativamente nos custos da electricidade pagos pelas famílias. A publicação de um Manifesto que expressava a mesma opinião negativa de alguns professores universitários sobre o mesmo tema da energia do vento, também não teve qualquer efeito e os interesses bem visíveis à época venceram facilmente o conhecimento universitário.

Penso que se trata de um bom exemplo das razões porque a universidade portuguesa participa pouco, ou não participa de todo, no debate sobre muitas das decisões dos governos, frequentemente com erros só reconhecidos muitos anos depois. Em Portugal o conhecimento não compensa.

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