Há evidências de que o poder atrai pessoas que gostam de abusar dele e que temos tendência para votar em líderes com traços de narcisismo e sociopatia. Isto pode levar-nos a pensar que o poder resulta apenas de um conjunto de características pessoais. Na verdade, ninguém tem poder sem que alguém lho atribua. O poder é uma relação que se estabelece com os outros e, por isso, não há líderes se não houver seguidores. Hitler, Hugo Chávez, Putin e Donald Trump chegaram ao poder com o voto dos seus concidadãos.
Existem mecanismos psicológicos que podem levar-nos a colocar pessoas incompetentes, pouco íntegras ou mesmo sociopatas em posições de liderança. Como afirma Chamorro-Premuzic, do Universiy College de Londres, nas empresas como na política, “as pessoas são seduzidas por líderes que são mais confiantes que competentes, mais carismáticos do que honestos e mais narcísicos do que discretos”.
Uma das razões é a relação entre confiança demonstrada pelas personalidades narcisistas e a confiabilidade que lhes é atribuída. As pessoas que mostram confiar muito em si próprias são mais persuasivas. Por exemplo, uma testemunha que apresenta um discurso afirmativo, convicto e controlado torna-se mais convincente e influencia a seu favor a decisão final de um juiz. É uma técnica que há muito é usada nas vendas, mas também na comunicação política.
Uma elevada autoconfiança pode, contudo, estar associada ao efeito de Dunning-Kruger, que mostra que as pessoas pouco competentes tendem a sobrestimar as suas capacidades e confiar no seu desempenho, enquanto as mais competentes e informadas têm níveis relativamente mais baixos de autoconfiança. A razão é simples: as pessoas mais competentes são mais exigentes e críticas quando se autoavaliam e percebem as suas limitações, mostrando-se menos seguras dos seus conhecimentos e capacidades. As pessoas menos competentes não têm, por isso mesmo, a capacidade de reconhecer as suas limitações e mostram uma autoconfiança exagerada e irrealista. As forças políticas tendem a escolher líderes com elevados índices de autoconfiança sabendo que isso favorece a adesão dos eleitores, apesar da autoconfiança e da competência poderem ter uma correlação negativa.
Embora possa parecer estranho, os líderes menos informados e pouco competentes podem ainda ter outra vantagem em termos persuasivos: o simplismo e a superficialidade. A compreensão dos desafios que enfrenta uma sociedade complexa como a nossa exige conhecimento e disponibilidade. A maior parte das pessoas está centrada nos seus objetivos pessoais mais imediatos. Não é capaz nem está motivada para acompanhar análises técnicas e opções difíceis expressas em linguagem pouco acessível. Tudo favorece o sucesso de líderes autoconfiantes e com poder de imagem que apareçam com soluções simples e promessas de curto prazo.
A recetividade ao que é simples ou comum encontra apoio na lei da trivialidade, formulada por Northcote Parkinson. As pessoas focam-se mais no que é fácil de apreender e resistem ao que exige tempo e esforço para ser compreendido. Estão, por isso, mais disponíveis para aceitar as mensagens esquemáticas e simplistas que são frequentes nos líderes com elevada autoconfiança. Portanto, as visões redutoras também aumentam a capacidade de influência dos líderes menos competentes.
A isto acresce um terceiro fator psicológico: a seletividade percetiva dos eleitores. Tendem a acreditar nos líderes que dizem o que gostam de ouvir e rejeitam os que contrariam as suas crenças ou põem em causa a sua identidade de grupo, mesmo quando falam a verdade.
Há, pois, razões para acreditar que o apelo das personalidades narcísicas, a atração pelas soluções simplistas e de curto prazo, e a tendência para só aceitar as mensagens que confirmam as nossas crenças, facilitam a conquista de apoios eleitorais no curto prazo. Ao mesmo tempo tornam difícil a tarefa dos líderes mais competentes e experientes que apostam na verdade, na transparência das suas intenções e nas visões reformistas de longo prazo, para conseguirem a adesão dos eleitores.
Estes mecanismos psicológicos são tendências inconscientes que condicionam as perceções, as crenças e as decisões, sobretudo dos que decidem o seu voto à boca da urna. São condicionantes que passam despercebidas, mas ajudam a explicar por que elegemos com entusiasmo líderes que depois nos desiludem, sem que nos sintamos responsáveis por isso. Neste sentido, pode afirmar-se que temos os líderes que escolhemos, mas já não é tão seguro que tenhamos os líderes que merecemos, uma vez que as nossas opções de voto escapam, em parte, aos mecanismos controlados pela vontade.
A consciência dos automatismos psicológicos que condicionam as decisões de voto é importante para um voto mais fundamentado, que reduza o risco de se elegerem maus líderes. Saber tomar decisões de qualidade faz parte do desenvolvimento pessoal para uma cidadania responsável.