Uma mãe trabalha todos os dias do ano. Não tem horário de trabalho. Não tem direito a férias, feriados e dias-santos de mãe. Não tem direito a cadernos reivindicativos. Não lhe permitem nem o direito à greve nem à sindicalização. Tem, quando muito, nos grupos de mães das redes sociais, o direito à manifestação. Trabalha mais,  dorme menos e tem menos tempo para ir ao ginásio que o pai, e é obrigada a ser multi-funções, como se isso fosse só mais um apontamento do seu infatigável instinto maternal. Tem de saber o nome professores das crianças, o nome dos “amiguinhos” delas e o calendário dos testes e dos trabalhos de casa, como se a sua cabeça fosse uma lista interminável de “checks” e de mais “checks”. Tem, contra a sua vontade, de se assumir como “a chata oficial” da família. E, por causa desse seu estatuto de excepção, é obrigada a seringar, a resmungar e a barafustar a propósito dos trabalhos de casa, todos os dias. E, na verdade, a propósito de quase tudo…  Por isso mesmo, a mãe faz — muito a contragosto! — de “polícia mau”, quando se trata de aplicar coimas por roupa no chão, salas desarrumadas e pacotinhos de bolachas entrincheirados no sofá. E cansa-se só de se esganiçar entre as 7 e as 8 da tarde por causa do banho e quando se trata de porem em causa o seu direito (inalienável!) a tirar o champô da cabeça das crianças. Aliás, nem sequer é justo que  a mãe se estafe ao ser azucrinada por tantos “Mãe?!…”, como se três letrinhas apenas tivessem não sei quantas sílabas a puxarem umas pelas outras sem nunca mais acabarem. Ou que sobrem para si “resmas” de melindres como: “Ó mãe, o mano disse que eu sou feia!”. Ou que fosse a pessoa mais bafejada pela sorte quando se trata de agradecer a preferência  por alfinetadelas do género: “Eu sei que gostas mais da mana do que de mim!…”.

Vendo bem, a mãe adoraria não ter que começar todas as manhãs na sua versão de sargentão! E agradeceria se a paridade tivesse melhores dias, quando se trata de serem interrompidos os seus “5 minutos só para mim” com mais um: “Mãe?!… Já fiz cocó!”. E que não tivesse que sobrar sempre para si a gestão de todos os “Foi ele que começou!…”. Ou as “guerras” por pirraças parvas entre irmãos” que acabam com a tolice a ir por ali adiante e a dar umas não sei quantas cenas “à italiana”. E que a aplicação de castigos e de “pagamentos por conta”, quando se trata de distribuir coimas a torto e a direito (mesmo quando não faz, sequer, ideia daquilo que se passou entre a criançada) não fosse um “assunto de mãe”, que acaba, vezes sem conta, com mais um: “Prometes que não contas ao pai?…”

A mãe também não acha gracinha nenhuma quando todos – desde os pediatras aos enfermeiros, dos educadores  aos professores – a tratam por…  “mãe” (mas pode, assim, evocar-se do nome de “Deus” em vão, como se a mãe fosse colectivizável, e ela não se tivesse nem sequer o direito de dizer, com toda a delicadeza: “Não me leve a mal; sim?… Mas vá  chamar mãe à sua, se faz favor!…”). E não entende porque é que só ela é que tem de ficar “da cor do diabo” quando se trata de chamar as crianças para virem para a mesa. Aliás, a mãe tem, também, dificuldade em perceber porque é que todos acham os bebés engracadíssimos e, depois, desde as entidades empregadoras a todos os outros, não há quem não entenda que as crianças são equiparadas a uma espécie de imposto de luxo só para mães que onera e prejudica quem mais quer ser mãe. E percebe menos, ainda, quando aquilo que ela desconta nos impostos como mãe lhe dá a entender que, quando se trata de ser tributada, todos (ao contrário de si) parecem educar crianças, e vesti-las, alimentá-las, dar-lhes tempo e oportunidades e futuro a preços de “loja dos 300”, enquanto o seu “trabalho de mãe” é de borla; pois então.

Debaixo de tanta exigência, a mãe não entende que, depois de tudo o que lhe pedem, não possa dizer mais vezes, alto e bom som: “Já não vos posso ouvir!”. Nem possa desabafar para com os seus botões: “Estou farta!”. Nem mesmo que lhe seja permitido reconhecer mais vezes que “as riquezas da sua mãe” estão impossíveis de aturar, sem que venha de lá uma espécie de “polícia dos costumes” que, pela boca de outras mães, a advirta e repreenda e a chame à razão duma tal forma que a mãe fica sempre com a sensação que não faz nada bem feito. E que em todos os momentos em que diz, já só para si, que isso de ser mãe pode não ter sido das suas melhores ideias, ninguém entenda os seus desabafos e tudo o que venha de si seja tributado com tantas toneladas de culpa que só de abrir a boca a mãe já tem medo que até o ar a castigue.

Como se nada disto já chegasse, a mãe também já não suporta que, perdidos e achados, tudo o que está mal numa criança seja culpa da mãe. Se uma criança é malcriada, de quem é a culpa? Da mãe! Se ela não tem maneiras ou parece viver o tempo todo no mundo da lua, tudo isso deve-se a quem? À mãe! Se uma criança não morre de amores pela matemática quem é que tem repetir 100 vezes aquela máxima: “Se eu não estiver ao lado dele, o meu filho não estuda…”? A mãe! E quem é que estafa os neurónios com todas as matérias escolares de uma criança, faz resumos e faz perguntas e mais perguntas nas vésperas dos testes? A mãe! E quem é que dá cabo dos nervos, quando se trata de espreitar para dentro dela,  vê não sei quantos tsunamis na mochila, mesmo antes de se sair de casa? A mãe! E quem é que nas festas de Natal faz aquelas figurinhas assim-assim quando, no escuro da plateia, sente que a “obrigam” a levantar-se e a esbracejar para o palco, e a saltitar e quase a gritar para que o seu petiz, enquanto mostra as suas habilidades aos outros pais, actue só para ela? A mãe!

Ora, este pequeno ror de coisas já é suficiente para que, num Dia da Mãe que calha num primeiro de Maio, a mãe possa transformar-se numa sufragista e lute pelo seu direito a um sindicato de mães. Porque, não sendo assim, parece que ninguém repara que mãe é Mãe! Mágica. Imensa. Bondosa. Divina. Ternurenta. E divertida. Mas, afinal,  seria possível que o melhor do mundo fossem as crianças se o melhor de cada uma delas não fosse, bem feitas as contas, a mãe?…

Por isso mesmo, mães de todo o mundo, unam-se. A luta continua. Mas a vitória é certa!

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