A fazer fé no que foi sendo anunciado ao longo dos últimos tempos, o Congresso do PSD que decorre este fim de semana decorrerá sob a égide da reafirmação da matriz identitária social-democrata do partido. O peculiar slogan “Social-democracia, sempre!” visará assim afirmar uma ruptura clara por parte de Pedro Passos Coelho com uma retórica política que, por altura do colapso das contas do Estado e subsequente pedido de assistência externa de 2011, chegou a ter tímidos tons liberais.
Em defesa do slogan agora adoptado por Passos Coelho, é justo reconhecer que, não obstante alguma retórica, a sua governação foi, no essencial, social-democrata. Os cortes no Estado foram quase sempre os mínimos impostos pela secagem das fontes de financiamento e consequente dependência externa e a reforma do Estado – com uma ou outra honrosa excepção sectorial – ficou-se quase sempre pelos piedosos anúncios de boas intenções. Apesar de todo o ruído mediático em sentido contrário, a verdade é que a governação PSD-CDS ficou mesmo muito aquém da troika e do que o país precisava em termos de contenção da despesa pública (conseguida em larga medida à custa de medidas temporárias) e reforma do Estado.
Numa interpretação bondosa, a governação de Passos Coelho poderá ser classificada como uma social-democracia de contas (mais ou menos) certas. Não é pouco se for comparado com o descalabro anterior (e com o desfecho previsível da governação da “geringonça”) mas está muito longe de poder ser considerado uma ruptura com o pensamento social-democrata que é praticamente hegemónico em Portugal.
Quer isto dizer que o slogan é defensável? Factualmente, sim, mas é também politicamente um sinal de desistência e uma desilusão para quem chegou a depositar esperanças de que Passos Coelho pudesse representar uma alternativa não socialista. Desde a sua fundação que há no PPD/PSD uma tensão latente entre a base sociológica maioritariamente de centro e direita e as convicções e práticas sociais-democratas de uma parte substancial das elites do partido que vive confortavelmente encostada ao Estado.
Com a reafirmação – em tom de derrota e auto-flagelação – da social-democracia de sempre por parte de Pedro Passos Coelho e os sinais dados até agora pela nova líder do CDS Assunção Cristas, Portugal fica com um panorama político ainda mais monotónico. O PS é, naturalmente, social-democrata. O PSD é agora social-democrata desde sempre. O CDS quer – ele também – ocupar o espaço da social-democracia. O PCP e o BE – pelo menos enquanto não houver condições objectivas para os extremismos revolucionários que continuam a ambicionar – são, no essencial, social-democratas. E até o PAN apresenta uma espécie de social-democracia com extensões ao reino animal. Sem esquecer, claro, que o novo Presidente da República é, também ele, um social-democrata.
Num cenário em que todos são sociais-democratas, não se perspectiva no horizonte uma alternativa não socialista de governação e Portugal deverá – infelizmente – continuar condenado a gerir bancarrota atrás de bancarrota. Resta a duvidosa consolação de, face ao consenso social-democrata transversal, todos poderem pelo menos concordar em culpar o “neoliberalismo” pelos males que teimam em afligir o país.
Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa