Esta semana, e a passada, desci e subi a costa Este da China. Ora de avião, ora de carro, ora de comboio. E até tive direito a uma volta de barco, imagine-se. Objetivo: internacionalização. Processo: reuniões com universidades. Dessas que todas as universidades fazem até chegarem ao ponto em que entram em êxtase máximo, o pináculo das relações, ou seja, na altura em que assinam um MoU.

Cada vez que chego a este ponto pergunto-me quantos e quantos MoU existirão pelos cofres e prateleiras das universidades. Nem 5% tem consequências interessantes. Mas as universidades adoram-nos. E os meu colegas idem. Eu detesto-os.

Estes MoU estão para as universidades como os protocolos de colaboração bilateral estão para os países.

É evidente que todos temos, mais tarde ou cedo, que passar por eles. Então na China, o MoU universitário é obrigatório. Com fotos para cá e lá. Com apertos de mão, a fingir que estamos a assinar quando já assinámos, depois encostados ao logotipo da universidade, depois com os representantes, depois ainda com mais alguns presentes e, finalmente, com o grupo todo. Como se fossem quase sessões de casamento. Pergunto-me para quê, mas ok, aceito que é a praxis. Mas nunca gostei dela. Entre países e cooperação bilateral aos mais vários níveis a história é a mesma. MoU’s e acordos de boas intenções. E o terreno? E a implementação?

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Problema: Isto não é economia. São relações públicas. E nós precisamos de economia. E que ela funcione. Precisamos dos passos a seguir.

Desde que me envolvi em formação universitária de executivos que estes MoU se vão repetindo. Aceito o jogo. Queremos crescer por internacionalização, pelo que temos de passar por isto.

No entanto, não deixo sempre de dizer que o MoU não serve para nada se não houver consequências: um piloto, um programa, um conjunto de alunos já a seguir e que fazem uma “executive week”, por exemplo. Mais ainda em formação de executivos, onde nada há de gratuidade nas trocas, quaisquer que sejam.

A confiança é um capítulo sem fim para os chineses. Tudo se ganha com confiança. Com consistência comportamental. E, descobri também (acho que apenas precisava de confirmar), que com humor. Não parece, mas os chineses e depois de algum tempo de conhecimento – e algum álcool, verdade – começam a entrar na parte do riso e do humor. Riem por tudo e nada. E mostram um coração que parecia não existir até ali. Quem os olha à primeira vista apenas consegue dizer que são chineses, frios, irascíveis com frequência, distantes. Mas, a seu tempo, revela-se um outro chinês e isso aprendi (ou talvez tenha apenas confirmado) desta vez na China. Finalmente. E felizmente.

As faixas com o nome da universidade e o nome escarrapachado na apresentação de boas-vindas são habituais. Os jantares de cortesia são, normalmente, dos piores momentos para mim, na medida em que não simpatizando com a comida e, não sabendo falar mandarim, se tornam sempre num cumprimento de calendário. Com álcool que não acaba.

Desta vez, porém, acho que foi diferente. Assisti a bons momentos de humor, a um iate com o nome da nossa escola de executivos, a uma atenção especial ao detalhe que não apenas e só à entrega de presentes como mais um chá ou mais um objeto da sorte. Assisti ao genuíno interesse em fazer coisas, em desenhar programas, em enviar alunos. Assisti a uma China diferente da que conhecia pré-covid. Mais humana, muito preocupada e muito interessada em recuperar o fraco desempenho económico e a braços com um desemprego a rondar os 20%. Uma China mais direcionada e focada para o objetivo que para o floreado. A necessidade, como sempre, aguça o engenho.

E penso que os chineses – a população – estão verdadeiramente interessados em fazer coisas rápido, estando até mais dispostos a prescindir de alguns salamaleques para passarem a ser um pouco mais diretos e objetivos nestas relações.

O momento económico de grande letargia e o fecho da economia durante tanto tempo, via covid, acabaram por fazer a China que conheci sofrer ainda mais – este povo é sofredor – e desejar rápido a retoma. E começar a trabalhar para isso. E se há coisa que gosto na China é que esta gente trabalha. E trabalha muito. Penso que a maioria do povo chinês percebe que o seu mercado é global e que as relações económicas internacionais são fundamentais. Entre países e entre universidades, ao caso.

Falta apenas que Marcelo Rebelo de Sousa venha dar um aperto de mão a Xi Jiping, como fez Macron recentemente, para que os nossos consulados e o SEF comecem a trabalhar a parte económica que falta, i.e., nos vistos universitários como deve ser e a tratar do que lhes compete de forma rápida para que possamos exportar mais ensino superior executivo. Diria isto para a China como para todos os países com que temos atividade. Precisamos de menos MoU, menos acordos de papel e menos diplomacia de fotografia. Precisamos, sim, de muito mais economia real. E com isto termino: esse aperto de mão valeria por muitos milhares de selfies e muita ação diplomática feita pois permitiria abrir a porta, num sinal claro, aos consulados e embaixadas para que haja efetiva diplomacia económica, que infelizmente os portugueses não estão a fazer. Neste caso permitiria, de uma vez, resolver o problema de aprovação dos diplomas nacionais, o que é sempre casuístico na China.

Por isso remato, apelando: Sr. Presidente da República, que tanto gosta de viajar, ponha os olhos em Macron e coloque-se a caminho. Não basta dizer que queremos internacionalizar as universidades. É preciso que alguém dê um passo firme, e um exemplo, para desbloquear muita coisa: de consulados ao SEF e às aprovações na China. E esse alguém só pode ser o Sr. Presidente da República. E neste caso não é irrelevante que seja professor porque sabe bem do que falo. No dia em que Portugal virar as suas universidades apenas para o mercado interno morrerá vítima da pirâmide etária que tem. Olhe por favor por isto, Sr. Presidente da República, e faça qualquer coisa pelas universidades. E essa coisa é um nada de diplomacia que vale muitíssimo para desbloquear a diplomacia económica.

Nota: após o recente aperto de mão de Macron a Xi Jiping todos os diplomas universitários franceses foram reconhecidos pelos serviços de ensino superior da China.