Miguel Galvão Teles foi um grande jurista e um grande advogado. E, ainda mais, um grande Homem. Eu pude confirmá-lo muitas vezes.

Conheci-o pessoalmente há mais de 30 anos. Depois, quando ainda era sócio de uma pequena boutique, que esteve (também) na génese da excelente sociedade que é MLGTS, negociei com ele o que na altura foi uma das maiores operações de M&A em Portugal, tive-o do outro lado num OPA hostil, nomeei-o como árbitro, enfrentámo-nos num processo judicial.

Antes tivera ocasião de ler obras suas sobre Direito Constitucional e depois fui árbitro num caso em que ele era advogado de uma das partes, sucedi-lhe na Corte Internacional de Arbitragem da CCI e fui seu Vice-Presidente na Comissăo Nacional de Arbitragem da CCI.

Refiro tudo isto porque assim se demonstra que tive a sorte de ir construindo dele uma imagem multifacetada, em várias épocas e circunstâncias, e porque assim se revela a sua aproximação global ao Direito. Mas também porque com ele confirmei mais uma vez um velho aforismo da nossa profissão: depois de combates profissionais os advogados ou ficam amigos ou passam a não gostar um do outro.

Reconheço que nem sempre tenho bom feitio. Mas com o Miguel era difícil não acabar amigo muito depressa. Cérebro privilegiado e brilhante, por vezes dava a sensação de estar perdido nas suas reflexões, como se o que estava a ocorrer à sua frente não fosse importante. Erro absoluto. Como a águia que parece pairar levada pelos ventos, apenas preparava a forma de enfrentar o problema, o impasse, o conflito ou o desafio.

Podia ser cortante, não deixando de ser delicado. Era um homo ethicus, mas não era ingénuo. Dotado de um conhecimento enciclopédico do Direito, isso não bloqueava – como em tantos outros – o seu ADN de advogado. Era culto, mas não era vago no seu saber. Nessa paleta de contrastes se construiu um dos maiores advogados portugueses dos últimos 50 anos.

Não conseguiu tudo na vida, como acontece aos melhores. Não se doutorou em Direito, apesar de não se perceber como isso (não) foi possível. Bastava pegar num dos seus textos científicos, juntar algumas anotações, e vários deles dariam melhores teses do que tantas outras que lá chegaram. Mas talvez tivesse sido melhor assim. Se o tivesse feito, provavelmente não teria sido Doutor Honoris Causa. E com ele o título foi totalmente justificado.

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