Nas eleições de 10 de março irá ocorrer uma das seguintes quatro hipóteses:

(i) A Direita (AD, IL, Chega) terá mais de 115 deputados e o PS mais deputados do que a AD;
(ii) A Esquerda (PS, BE, PCP, Livre e PAN) terá mais de 115 deputados e a AD mais deputados do que o PS;
(iii) A Direita terá maioria e a AD mais deputados do que o PS;
(iv) A Esquerda terá maioria e o PS mais deputados do que a AD.

No debate de segunda-feira, Pedro Nuno Santos (PNS) afirmou, e cito: “O PS se não ganhar… não apresentará nenhuma moção de rejeição nem viabilizará nenhuma moção de rejeição se houver uma vitória da AD”.

Ou seja, de forma inequívoca, nas hipóteses (ii) e (iii) supra a AD poderá formar governo e o PS ficará na oposição. Nas hipóteses (i) e (iv) o PS ganhará e a AD ficará na oposição. Pareceu a todos uma solução equilibrada.

Esta proposta foi descrita como uma “cambalhota” e realmente foi uma mudança de 180 graus em relação ao que PNS vinha afirmando. Parecia significar uma vitória do que José Luís Carneiro e Francisco Assis de forma clara defenderam: os partidos moderados de Direita e de Esquerda se fizessem isto (que foi uma regra não escrita entre eles durante décadas) ficariam libertos de pressões dos radicais de ambos os lados.

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Nesse caso faria sentido que a AD aceitasse a contrapartida se as hipóteses (i) e (iv) viessem a ocorrer. Por isso, logo nesse debate, PNS começou a pressionar Luís Montenegro (LM) para que assumisse a reciprocidade.

No entanto, no dia seguinte, terça-feira, PNS veio dizer, e cito: “Nós só governaremos se ganharmos ou se conseguirmos formar uma maioria”. Ou seja, de acordo com o que afirmou na terça-feira, veio aditar a expressão “se conseguirmos formar uma maioria” ao que afirmara no debate com LM.

Esta alteração significa que o PS afinal, na nova versão, quer governar nas hipóteses (i), (ii) e (iv) e a proposta que fez no debate afinal se limita à hipótese (iii) — a Direita ter maioria e a AD mais deputados do que o PS — o que é manifestamente pouco ou nada.

No entanto continuou a insistir que a AD não deu ainda “uma resposta à viabilização do governo do PS”. Ou seja, PNS propõe-se não votar uma moção de rejeição se a AD e a Direita ganharem (hipótese iii), mas espera que a AD em contrapartida não vote moção de rejeição de governo do PS em todas as outras hipóteses, as (i), (ii) e (iv).

Como é óbvio, PNS tem todo o direito de lutar para conseguir um acordo desigual com a AD (eu diria um acordo com uma vitória 3 a 1 do PS) e até de achar – e seria a natural conclusão da sua versão de terça-feira – que a AD não poderia nunca esperar governar mesmo que tendo ganho as eleições fosse chamada pelo Presidente da República a formar governo.

O que não pode é afirmar – sem mentir — que na segunda-feira e na terça-feira disse o mesmo.

E, sobretudo, não pode logica, intelectual, política e moralmente exigir que a AD reciproque com a “viabilização do governo do PS”.

O que isto revela, numa análise objetiva que nem precisa de abordar se houve intencionalidade, é que PNS no debate com LM não tirou sequer um coelho da cartola, mas apenas lançou uma armadilha para ver se LM nela caía.

Na terça-feira, no meu programa “As Causas” – há ingenuidades que não passam com a idade – acreditei no que PNS dissera na segunda-feira, que “não apresentará nenhuma moção de rejeição nem viabilizará nenhuma moção de rejeição se houver uma vitória da AD”. Os comentadores a seguir ao debate também, e nisso se baseou o que teria sido uma vitória de PNS devido ao facto de LM não ter reciprocado. E esta quarta-feira no Público vários politólogos julgaram que a verdade era o que PNS dissera na segunda-feira.

Claro que o que PNS prometeu no debate pode não ser sido uma armadilha.

Mas nesse caso foi uma precipitação: decidiu fazer uma proposta que não pensara bem e que exprimira pior. E fazê-lo diante de mais de dois milhões de portugueses.

Os seus assessores reagiram e ele teve de dar uma nova “cambalhota” no sentido contrário.

No fundo, a ter sido assim, mais uma vez na segunda-feira se confirmou que PNS não arrasta os pés e decide depressa.

E desta vez nem precisou de mandar publicar no Diário da República a sua decisão.