Eu já estava nervosa com este tema dos certificados de aforro versus taxas nos depósitos na banca mas ao ouvir, mesmo o pouco que ouvi, o Marques Mendes agarro-me ao computador para escrever este artigo. Só assim consigo acalmar. E espero que o dito Sr. o leia. Calculo que não mas gostaria muito.

Então vamos lá a perceber uma coisa muito simples – certificados de aforro e depósitos bancários não têm nada a ver uma coisa com a outra. Podem ser vistos pelo público em geral como produtos de poupança, como as obrigações (de taxa de juro) também o foram durante muito tempo, mas nenhum é igual, naquilo que é o seu objectivo, liquidez e risco implícito.

Os certificados de aforro são dívida pública. Ponto. O estado emite certificados de aforro para captar as poupanças das famílias e assim financiar a sua dívida. Eram subscritos aos balcões dos CTT porque, lembrem-se, os CTT eram uma empresa pública.

Porque são um instrumento de dívida pública, a sua remuneração deve ser o mais baixa possível já que quem a suporta, para variar, são os contribuintes. E por isso, se não têm concorrência na banca em produtos alternativos de risco comparável, a decisão de descer taxas de remuneração é certíssima. Até tenho de confessar que foi a única coisa certa que este governo decidiu em 8 anos de governação! Descer as taxas dos certificados de aforro. Clap, clap, clap!

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A sua liquidez pode ser variável – em alguns casos a desmobilização não é de todo permitida nos 90 dias subsequentes à sua constituição, noutros, estamos a falar de 1 ano sem que o aforrador possa mexer nesse dinheiro.

O risco implícito é o risco soberano ou país, o que, no caso de Portugal, não é tão displicente quanto isso! Nem me vou pronunciar sobre essa parte para não baralhar mas notem que a taxa de juro (que mais não é que o preço do dinheiro) deve “pagar” o risco implícito (por exemplo, obrigações do Benfica pagarão taxa juro inferior às do Sanjoanense!).

Os depósitos bancários – normalmente designados depósitos a prazo – são um instrumento completamente detido e controlado, como é óbvio, pelos bancos, que utilizam a sua remuneração como forma de atrair mais ou menos depósitos, consoante a necessidade que deles têm.

Têm liquidez total, ou seja, o cliente pode desmobilizar a poupança constituída a qualquer momento, perdendo no máximo a remuneração gerada até então, mas sempre com a garantia do capital investido ser devolvido a 100%.

O risco implícito é o risco banco, colmatado no entanto, pelo Fundo Garantia de Depósitos que dita que em caso de falência dum banco, os depósitos nele efectuados são garantidos pelo estado até um valor de 100.000€ por titular de conta.

Agora, o que despoletou toda esta confusão entre as taxas de remuneração dos Certificados de Aforro e os Depósitos Bancários?

A razão porque os bancos não estão em guerra pelos seus depósitos e por isso não aumentam as suas taxas de juro passivas, pode ser encontrada aqui.

Mas num breve resumo, e retiro desta mesma fonte, se “antes da crise de 2008, o BCE satisfazia as necessidades de liquidez do sistema bancário da área do euro de forma mais ou menos exata. Procedia todas as semanas a uma estimativa das necessidades de liquidez do sistema bancário e o montante estimado era disponibilizado às instituições de crédito sob a forma de empréstimos. As instituições de crédito competiam por estes empréstimos num leilão e o BCE garantia que os empréstimos correspondiam às necessidades do conjunto do sistema bancário. Uma vez no sistema, a liquidez era redistribuída entre as instituições de crédito – através de empréstimos interbancários –, em função das necessidades de cada instituição.

Em outubro de 2008, em resposta à crise financeira grave na sequência do colapso do banco de investimento Lehman Brothers, o BCE passou para um regime de colocação total. De acordo com este regime, as instituições de crédito podem obter um empréstimo do montante de liquidez que pretenderem, desde que disponham de suficientes ativos de garantia elegíveis. Esta mudança deveu-se ao facto de as instituições de crédito terem deixado de redistribuir a liquidez entre si através de empréstimos interbancários, como faziam antes da crise. A consequente falta de confiança no mecanismo de redistribuição teria conduzido a uma situação em que as instituições de crédito competiriam agressivamente por liquidez nos leilões, aumentando, assim, as taxas de juro sobre esses empréstimos. O regime de colocação total ainda está em vigor, o que significa que estes riscos não existem, porque cada instituição de crédito pode obter a liquidez de que necessita.

Na sequência da adoção do regime de colocação total, as instituições de crédito consideraram que seria melhor pedir mais do que menos. Tal levou todo o sistema bancário a solicitar mais liquidez do que o estritamente necessário para satisfazer a procura de moeda por parte do público e cumprir as reservas mínimas obrigatórias. O resultado foi liquidez excedentária no sistema.”

Como se isto não bastasse, a liquidez excedentária “aumentou” ainda mais como consequência do programa de compra de ativos do BCE, que se manteve até ao fim do período de “pandemia”, agravando ainda mais este cenário.

Ou seja, duma forma muito pragmática, há dinheiro a mais no sistema e por isso mesmo, o seu banco preocupa-se ZERO em que os seus depósitos lá continuem ou fujam para outro banco. Que na realidade não fogem, porque todos os bancos estão em igualdade de circunstâncias, ou seja, com excesso de liquidez.

Os políticos acharem que os bancos devem fazer favores aos seus depositantes elevando taxas de depósito e misturarem certificados de aforro com depósitos a prazo é só ridículo, num país onde, na realidade, “ridículo” é já o seu nick name.

Se os bancos tivessem algum tipo de pudor para com os seus clientes não cobravam o disparate em número e valor em comissões bancárias por tudo e mais um par de botas!

Nota: Não detalhei o tema obrigações de taxa de juro mas para quem ainda as considere produto de poupança sem risco, tome nota de que não é.  Tem risco emitente (banco, empresa ou país), tem risco taxa de juro e pode (também por isso) ter risco de capital se não for mantido até à maturidade. Pode ter uma liquidez muito reduzida.