A implementação de programas de vistos humanitários tem demonstrado resultados positivos em diversas regiões do mundo nos últimos anos, nomeadamente na Europa, nas Américas e na Austrália, ainda que com variações significativas entre os países. Enquanto o projeto de lei apresentado pela Iniciativa Liberal aguarda aprovação na Assembleia da República, vale a pena olhar para as práticas internacionais, extraindo ensinamentos que permitam desenhar um modelo adaptado à realidade portuguesa.
Em países como a Polónia e a Lituânia, um visto humanitário garante autorização de residência temporária, que permite permanecer no país e trabalhar. No entanto, ali não há programas especiais de integração com encargos na despesa pública. Para os dissidentes russos e bielorrussos este visto representa, acima de tudo, a possibilidade de continuar as suas atividades – seja no campo do jornalismo, seja na defesa dos direitos humanos – em segurança, agora no país que lhes recebeu.
Estes programas, além do seu inegável valor humanitário, são também vistos como investimentos estratégicos para o futuro. Ao acolher aqueles que lutam pela democracia, os países receptores criam laços com as futuras gerações de uma Rússia e Bielorrússia livres e democráticas, o que tem uma importância especial para os países vizinhos.
Já em França e na Alemanha, os programas de vistos humanitários são mais amplos e envolvem um conjunto de medidas de apoio social. Estes países garantem alojamento a quem precisa, distribuindo os recém-chegados por diferentes regiões, além de oferecer cursos de língua e apoio na procura de emprego. Este enfoque na integração garante uma base sólida para a inserção dessas pessoas na sociedade.
Em todos os casos mencionados, as autoridades colaboram com as ONG locais e internacionais competentes para verificar os pedidos e minimizar os riscos de segurança nacional. Na França e Alemanha uma das condições para obter um visto humanitário é colaboração prévia com organizações francesas ou alemães, respectivamente.
No Brasil o visto humanitário destina-se sobretudo a facilitar a entrada no país de requerentes de asilo político. Um exemplo recente foi a concessão deste tipo de vistos a refugiados ucranianos.
A Austrália conta com diferentes subcategorias de vistos humanitários, como Emergency Rescue e Woman at Risk. De forma geral, a obtenção de visto garante subsequentemente asilo político. Os pedidos devem ser apoiados pelas organizações competentes, à semelhança com os países europeus, por cidadãos e residentes australianos que acompanham o processo e prestam apoio à integração dos beneficiários. Além disso, a Austrália dispõe de um robusto programa de inclusão social, no qual participam empresas, famílias e cidadãos, criando uma rede de acolhimento eficaz e solidária.
A proposta atual da Iniciativa Liberal, ao alinhar-se com o modelo brasileiro, prevê a concessão de vistos humanitários como um primeiro passo para permitir que os beneficiários, uma vez em solo português, possam solicitar asilo ou proteção internacional. Caso implementada, esta medida já representaria um significativo alívio para muitas pessoas em situação de risco. No entanto, o próximo passo poderá ser a criação de um programa mais abrangente que promova uma integração eficaz destes indivíduos na sociedade portuguesa.
Um programa deste tipo não só ajudará quem está em perigo, como também enriquecerá o país, ao acolher pessoas competentes e talentosas que, partilhando os valores europeus, rejeitam regimes autoritários e contribuem para o fortalecimento de uma Europa livre. Sejam elas a criar raízes em Portugal ou a liderar a mudança nos seus países de origem, estas pessoas tornar-se-ão agentes de transformação.
Portugal pode, assim, encontrar no modelo dos vistos humanitários uma oportunidade única de acolher quem procura a liberdade e, ao mesmo tempo, consolidar o seu papel num futuro de paz e democracia.