O fluxo de portugueses para Moçambique estabilizou e a comunidade tende a reduzir, disse à Lusa o cônsul geral de Portugal em Maputo, que explica os números com os raptos, incerteza política e também alguma ilusão.
“Pela primeira vez em vários anos, reduzimos as novas inscrições” consulares de portugueses residentes em Moçambique, adiantou Gonçalo Teles Gomes, apontando a interrupção de um crescimento substancial da comunidade entre 2009 e 2013.
Em 2014, o Consulado Geral de Maputo registou 1.986 novas inscrições, contra 2.537 em 2013, uma tendência de descida sustentada pelos dados de janeiro e fevereiro, que também indicam uma diminuição face ao período homólogo do ano anterior.
Embora os dados da comunidade não sejam precisos, uma vez que o registo consular não é obrigatório e que muitos emigrantes não dão baixa da sua inscrição quando se vão embora, estima-se que, na área abrangida pelo Consulado de Maputo, residam 18 mil portugueses, a que se somam outros cinco mil na área do Consulado da Beira.
“A história dos raptos mexeu com a cabeça de muita gente”, segundo Gonçalo Teles Gomes, lembrando que, em 2013, no auge da vaga deste crime que assumiu proporções descontroladas em Maputo e que também assusta outras comunidades expatriadas, houve dois picos de inscrições consulares, “mesmo de pessoas que já viviam no país há cinco ou dez anos”.
A instabilidade entre Governo e Renamo, que se confrontaram militarmente no centro do país até setembro do ano passado, associada à incerteza política motivada pelas eleições gerais de 15 de outubro, também contribuiu, segundo o cônsul, para os números da comunidade em 2014.
A indefinição política que o país vive desde as eleições, mais a descida das cotações internacionais das matérias-primas, levou por outro lado a que várias empresas adiassem as suas decisões de investimento, com impacto no total de quadros expatriados em Moçambique.
“Houve também muita gente que veio para aqui iludida. Há uns anos parecia que na imprensa internacional se vendia Moçambique como o ultimo paraíso na terra e agora parece que virou um inferno”, observou Gonçalo Teles Gomes, para quem a verdade estará algures no meio.
“Acho que nunca foi um paraíso mas também não é um inferno”, comentou o diplomata, referindo que a crise em Portugal empurrou para Moçambique pessoas “pensando que era muito mais fácil e rápido fazer negócios e as coisas não deram certo”.
“Agora que a situação em Portugal se alterou um pouco algumas daquelas pessoas encontraram condições para regressar”, assinalou.
Os números do Consulado afastam também a possibilidade de emigrantes desencantados com Angola procurarem novo destino em Moçambique, embora tenha sido já sinalizado um padrão de que várias empresas que se instalam num país acabam por fazê-lo também no outro, mas sem relação com a descida de preços de matérias-primas e que atingiu gravemente a economia angolana.
No sentido inverso, os vistos de moçambicanos para Portugal “explodiram”, de acordo com os dados do Consulado, duplicando nos últimos cinco anos para quase oito mil em 2014, mais 10% do que em 2013, e mantendo a tendência de crescimento em janeiro e fevereiro.
“Portugal é o país no âmbito de Schengen que dá mais vistos para Moçambique, o dobro de todos os outros em conjunto”, disse Gonçalo Teles Gomes, dando conta de que há cada vez mais moçambicanos a fazer visitas de turismo e uma grande quantidade de estágios e formações de funcionários de empresas portuguesas em Moçambique.
“Isto é muito positivo e demonstra a transferência de conhecimento no investimento português”, comentou o diplomata.
Em pausa está um acordo de facilitação de vistos entre os dois países, para várias categorias de cidadãos como empresários, desportistas ou agentes culturais, submetido ao anterior Governo moçambicano e que ainda não terá sido apreciado pelo atual, que prepara novas regras para a entrada de estrangeiros no país, embora o seu conteúdo ainda não seja conhecido.