Maria de Belém Roseira e António Sampaio da Nóvoa não querem ser a batata quente nas mãos dos militantes socialistas. A solução não é a melhor, mas é a possível para ambos: na primeira volta das presidenciais, o PS não deve apoiar nenhum dos candidatos; na segunda volta, eliminado um deles, o partido deve reunir-se em torno do candidato mais votado. Evita-se assim atirar gasolina para a fogueira de uma luta pela liderança do partido que se espera dura. E o congresso extraordinário? Deve realizar-se antes ou depois das presidenciais? As opiniões dividem-se.
José Lello, ex-ministro de António Guterres e apoiante de primeira linha de Maria de Belém, acredita que “o PS deve, nesta altura, distanciar-se dessa temática. A candidatura presidencial é um ato unipessoal e individual” e, existindo duas candidaturas da área do PS, a direção do partido não deve “condicionar os militantes do partido” a escolherem uma em detrimento da outra – mesmo que lhe pareça “pouco gratificante ter uma ex-presidente do partido colocada no mesmo plano do que que outros que não têm qualquer vínculo ao partido”.
Outro ponto claro para José Lello é que o congresso extraordinário deve realizar-se em “março, depois das presidenciais”. Se o entendimento da direção for diferente e o tema da corrida a Belém estiver na agenda do congresso, “está o granel lançado“, garante ao Observador.
“A discussão sobre as presidenciais é uma vertente muito fraturante e complexa dentro do partido”, avisa. “Se as presidenciais forem a congresso, o Sampaio da Nóvoa é embrulhado em celofane” e sai derrotado, sublinha.
Eurico Brilhante Dias, um dos rostos da ala segurista do PS e também ele apoiante da candidatura de Maria de Belém, acredita que a derrota de António Costa nas legislativas, “no limite, adicionam força” à corrida da ex-presidente do PS.
Mas as coisas mudam de figura quando o assunto é a data do congresso. O antigo membro da direção de António José Seguro defende que o congresso deve realizar-se o “mais rápido possível” – talvez ainda em janeiro – para não condicionar as eleições presidenciais. Essa seria a “melhor solução”. Coisa diferente é dizer que o tema das presidenciais deve estar em cima da mesa nesse congresso. Seria um caminho “sinuoso” para um partido dividido, sublinha.
Para Eurico Brilhante Dias, no entanto, Maria de Belém continua a perspetivar-se como “a candidata que reúne mais condições à esquerda” e ideal seria que o “partido no seu conjunto apoiasse” a ex-presidente a socialista. “Não encontrando condições” para que um dos candidatos “tenha um apoio esmagador“, então os militantes socialistas devem ter a “liberdade” de apoiar quem consideram ser a melhor alternativa.
Já José Vera Jardim, outro dos apoiantes assumidos da candidatura de Maria de Belém, volta à tese defendida por José Lello: “O congresso extraordinário tem de ser feito depois das presidenciais”, sob o risco do partido se deixar envolver por um “debate interno que seria difícil”.
O ex-ministro da Justiça de António Guterres reconhece que o dossiê presidencial é de difícil gestão, mas que o “problema tem de ser solucionado”. Como? Neste ponto, os três estão de acordo: o PS não deve apoiar ninguém na primeira volta. “Não é a solução habitual, mas é a solução possível. Evita uma discussão e um debate interno que seriam difíceis para o partido”.
Estas três posições trazem ecos de um aviso à navegação deixado por Jorge Coelho, ainda na noite eleitoral. “A última coisa que o PS pode fazer é tomar qualquer decisão que cause instabilidade. O PS deve dar liberdade de voto e ter isenção total na primeira volta das eleições”, afirmou na “Quadratura do Círculo”, da SIC Notícias. O antigo homem forte do aparelho socialista disse ainda que o PS deve “fazer um acordo com os [dois] candidatos, dizendo que apoiará o que passar à segunda volta”.
A solução parece colher adeptos mesmo entre os apoiantes do antigo reitor da Universidade de Lisboa0. Ao Observador, Vítor Ramalho lembrou que a direção do PS “deve ter em atenção que há militantes e responsáveis do partido que estão a apoiar Sampaio da Nóvoa”, lembrando, por exemplo, o facto de Mário Soares, Jorge Sampaio e até de Ramalho Eanes – que não sendo socialista, tem peso político – “deram a cara” por Nóvoa.
Apoios de peso que ajudam a segurar a candidatura do antigo reitor. O ex-secretário de Estado e ex-dirigente socialista acredita, por isso, que a direção do partido “deve dar liberdade de opção aos militantes para apoiarem quem entenderem” e, na segunda volta, então sim “deve pronunciar-se no sentido de dar o apoio a um deles”.
Este argumento – o da divisão do partido em torno dos presidenciáveis – serve também para atirar o congresso para depois das eleições para Belém. “Acho que é preferível” que assim seja, defende Vítor Ramalho. Antes das presidenciais, existe a tomada de posse do novo governo, a apresentação do programa de governo e a discussão do Orçamento, enumera. “É muita coisa junta” e o PS deve fazer “um esforço para se unir”, não gastando energias em matérias que o dividam, insiste o socialista.
Ainda antes de colocar as suas peças em jogo, Sampaio da Nóvoa terá tido o apoio não formal de António Costa – o ex-reitor chegou mesmo a confirmar, em entrevista ao Diário Económico, que falou com Costa antes de apresentar a candidatura e que este lhe terá dito que não via a sua candidatura como uma dificuldade para o partido.
No entanto, uma ala do partido não viu com bons olhos o avanço de Nóvoa e começou a cozinhar a candidatura de Maria de Belém. A ex-presidente do partido deixou-se convencer e lançou informalmente a corrida a Belém, surpreendendo António Costa, no preciso momento em que o secretário-geral do PS dava uma entrevista em direto na SIC.
O certo é que os dois candidatos presidenciais parecem já não alimentar esperanças de colher o apoio formal do partido. De acordo com o Diário Económico, Nóvoa “já não conta” com o apoio oficial do PS nesta corrida – uma tese, aparentemente, suportada pelas declarações de Vítor Ramalho ao Observador. E António Costa dificilmente apoiará uma eventual candidatura de Maria de Belém, alimentada, em grande parte, pela ala segurista do partido mas que recolhe cada vez mais apoios no partido.