Em 1923, depois combater na Primeira Guerra Mundial, Adolf Hitler virava-se para a política e tentaria, nesse ano, realizar um golpe de Estado em Munique. Mas falhou e foi preso. Foi neste período de encarceramento que Hitler pôde imortalizar os seus ideais nacional-socialistas, antisemitas e a começar a espalhar a corrente ideológica que iria marcar toda a atuação do Partido Nazi durantes os anos seguintes. E iria mudar o mundo. Nascia assim, no ano seguinte, o livro “Mein Kampf”.
Este livro, que é uma das obras mais controversas alguma vez escritas, vai voltar a ser publicado na Alemanha, no próximo mês, e pela primeira vez desde o final da Segunda Guerra Mundial, altura em que foi proibido.
Devido ao seu conteúdo de tal maneira polémico, será publicada uma versão académica, com o texto original a ser acompanhado com volumosas notas académicas. Segundo o Finantial Times (FT), os historiadores aplaudem esta medida, mas a comunidade judaica torce o nariz.
Mas há mais. Um texto tão sensível e suscetível como este obrigou o gabinete do ministro da Justiça alemão a aplicar algumas restrições. Para evitar acender o sentimento e movimento neo-nazi, o acesso público a “Mein Kampf” vai ser limitado.
O Instituto de História Contemporânea de Munique, entidade responsável pela publicação da nova edição, refere que está apenas a publicar um “trabalho académico” e não uma qualquer obra acrítica e “irresponsável.” Quem o diz é o diretor do Instituto, Andreas Wirsching, anunciando também que vão ser impressas 4 mil cópias desta nova versão que contará com 2 mil páginas contendo mais de 3.500 mil notas, e que vai começar a estar disponível nas bancas entre os dias 8 e 11 de janeiro com um preço a rondar os 59 euros.
Há 70 anos, no final da Segunda Grande Guerra, os aliados, que passaram a ocupar parte da Alemanha, ofereceram os direitos de autor do livro ao Estado alemão da Baviera. Durante todos estes anos as autoridades da região recusaram-se a republicar a obra por respeito às vítimas do nazismo e para prevenir o incitamento ao ódio. No entanto, no final do ano os direitos de autor esgotam-se. Isto significa que os direitos do livro proibido passam para o domínio público dia 1 de janeiro.
De livro obrigatório a proibido
Escrito em 1924, enquanto Adolf Hitler estava preso por uma tentativa de golpe de estado falhada, “Mein Kampf”, que significa “A Minha Luta”, foi editado em 1925 e a sua crescente popularidade coincidiu com o crescimento político de Hitler nos anos posteriores à edição do livro.
Saído de uma humilhante derrota na Primeira Guerra Mundial, onde foi ferido, Hitler queria uma Alemanha renascida e a enfrentar a humilhação sofrida e imposta pelos inimigos. Impedido de o conseguir através da política, enquanto estava atrás das grades, o alemão escreveu os seus principais ideais que queria ver impostos no país. O objetivo era tornar a Alemanha num novo tipo de Estado, soberano, com uma ideologia e uma raça ariana universal.
A partir daqui o antisemitismo ganha destaque nas páginas. E o principal alvo está bem identificado desde o início. Os judeus. Hitler escreve já em “Mein Kampf” que estes representam um risco para a Alemanha elaborando a tese do “Perigo Judeu”. A vertente anticomunista, que marcou igualmente toda atuação nazi durante os anos de poder, começa também a marcar o seu pensamento.
Publicado pela editora Eher Verlag, o seus documentos deram conta, em 1945, que em 1925 foram vendidos 9.743 exemplares caindo para cerca de 6.900 no ano seguinte e para os 3.015 em 1928. Mas 5 anos depois Hitler chegava ao poder. Em 1933, e depois de anos de crescimento da popularidade tanto do livro como do Partido Nazi, os exemplares vendidos chegaram a 1 milhão, sendo que, em 1940, subiram para os 4 milhões.
No entanto, durante o período de poderio nazi, era quase uma obrigatoriedade silenciosa possuir o “Mein Kampf”. Passou a ser comum e socialmente quase obrigatório oferecer a obra como presente a recém-nascidos ou como presente de casamento. Todos os estudantes que terminavam os seus estudos também o recebiam como guia essencial para a vida adulta.